Os ministérios de Minas e Energia (MME) e da Economia (ME) divulgaram nesta quinta-feira (3/2) uma nota de esclarecimento sobre a questionamento levantado pelo gabinete do ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Vital do Rêgo, que estaria identificando suposto erro no cálculo do valor da outorga a ser paga pela Eletrobras, no âmbito de seu processo de privatização. A preocupação de Vital do Rêgo é que a definição da outorga não estaria considerando eventuais ganhos decorrentes da chamada “potência” (energia multiplicado pelo tempo – entenda mais abaixo).
“Cabe esclarecer que não existe no Brasil um mercado de potência em que os agentes geradores vendam esse ‘serviço’ e aufiram receitas por isso. Diferentemente de outros países, no arcabouço legal e regulatório do setor elétrico brasileiro não há essa previsão, não havendo, portanto, referências técnicas para sua consideração nas premissas, em especial considerando que a inserção de um mercado de potência alterará também os preços de energia hoje aplicáveis”, diz a nota. (Leia a íntegra da nota)
A visão das duas Pastas, segundo o JOTA apurou, é compartilhada pela área técnica do TCU e pelo ministro Aroldo Cedraz, relator do processo e que abordou o tema em seu relatório.
“Ressalta-se que o valor do Custo Marginal de Expansão (CME-Potência) não é parâmetro que deva ser considerado para valorar a outorga a ser cobrada pelos novos contratos das usinas, tanto do ponto de vista prático quanto considerando o racional que fundamenta a metodologia do cálculo do valor da outorga, aplicada há diversos leilões de privatização desde 2015, sempre sob os auspícios do Tribunal de Contas da União (TCU)”, completa a nota dos ministérios.
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Segundo o documento, remunerar a prestação do serviço de potência, “é dotada de inconsistência técnica, haja vista que inexiste respaldo na legislação setorial para seu uso, bem como referências no mercado de energia elétrica adequadas para sua utilização” e que levaria a superestimação do valor da outorga. “Cumpre informar, ainda, que tanto o MME quanto o ME desconhecem os cálculos que podem ter fundamentado os valores anunciados por alguns veículos de imprensa e que não localizaram, tampouco, nos autos do processo, a informação acerca do montante divulgado”, completa o texto.
Discussão não inviabiliza privatização
A discussão sobre o suposto “erro” identificado pelo gabinete de Vital do Rego não inviabiliza a privatização, embora o vazamento para o jornal “Valor Econômico” dessa discussão seja um indício de que o relator pode acabar gerando algum atraso adicional no processo.
Na última quarta-feira (2/2), houve uma reunião entre interlocutores do governo e o ministro, cujo objetivo foi mostrar que não existe erro no cálculo da outorga e que as premissas têm respaldo inclusive da própria área técnica do TCU, e que isso não deveria ser motivo para o tema ficar parado. Para o governo, o ideal é que o plenário da Corte de Contas libere esse processo até 21 de fevereiro, antes da assembleia de acionistas, prevista para o dia seguinte.
Uma fonte envolvida com o tema explica que o tópico levantado por Vital, que pediu vistas da matéria em dezembro e tem até março para devolver o assunto ao plenário da Corte, foi abordado no relatório do ministro Aroldo Cedraz apresentado em dezembro.
Nesse documento, Cedraz alinhou sua posição à da área técnica do órgão e também à do governo, dizendo que não cabe incorporar na outorga a precificação de um pagamento por “potência”, que hoje não existe no mercado brasileiro e para o qual também não há regulação prevista.
A “potência”, grosso modo, é uma relação entre quantidade de energia multiplicado pelo tempo e é um ativo que valoriza as hidrelétricas, que têm maior capacidade de fornecer energia em determinados períodos de tempo por trabalharem com reservatórios.
Mas o mercado hoje no Brasil só vende a quantidade de energia, precificando a potência dentro do preço médio do fornecimento. Segundo uma fonte, embora o caminho que já está no desenho do governo e que foi aprovado por Cedraz seja o mais correto, uma alternativa seria acrescentar uma cláusula que revisite esse tema no futuro, quando e se esse mercado de “potência” estiver funcionando. A alternativa é rejeitada pelo governo e fontes acrescentam que fazer isso também implicaria revistar o preço da energia, uma vez que a questão da “potência” já está incorporada nas contas do preço médio.
Pessoas envolvidas na discussão seguem acreditando que a privatização vai andar no TCU porque a maioria dos ministros tem dado indicações favoráveis. Há uma articulação e pressão para que Vital do Rego dê prosseguimento ao projeto, que politicamente já foi amplamente discutido no Congresso, onde foi aprovado. É preciso deixar claro que o governo pode seguir com a privatização mesmo se o TCU demorar a se posicionar, a questão porém é dar mais segurança jurídica ao processo.