Iuri Dantas

Vetada pela autoridade antitruste há mais de uma década por preocupações sobre o eventual impacto anticompetitivo na oferta e preço de chocolates e coberturas ao consumidor, a fusão Nestlé-Garoto recebeu uma avaliação técnica aparentemente positiva do Departamento de Estudos Econômicos do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).
Aparentemente, porque parte dos dados em que o DEE se baseou permanecem restritos ao Cade na versão pública divulgada nesta quarta-feira (1º/6).
É preciso, ainda, fazer a ressalva de que a nota técnica do DEE divulgada pelo Cade mostra que os técnicos estudaram profundamente tanto a divisão de mercado quanto os hábitos de consumidores, a localização das lojas, a capacidade de produção e os investimentos das empresas e suas concorrentes para chegar às conclusões. Tanto estas avaliações quanto  algumas conclusões ainda não estão disponíveis ao público.
No documento, os técnicos levam em conta profundas alterações no mercado desde que por 5 votos a 1 os conselheiros do Cade vetaram a operação em 2004. Meses depois, a autoridade antitruste também recusou uma proposta formulada pelas empresas para que a fusão se consumasse e, desde então, a operação está sob análise do Judiciário.
No estudo, dois fatores foram fundamentais nos últimos anos para modificar os efeitos de uma fusão entre as duas empresas: o incremento da classe C e a chegada ao mercado de novas marcas.
"O mercado brasileiro de chocolates atual apresenta significativas diferenças em relação ao que se observou em 2004. O consumo aparente de chocolates dobrou no país em um período positivo para a economia brasileira que gerou aumento da renda e ampliação do mercado consumidor, notadamente a expansão da 'classe C'", anotam os técnicos. "Com essa expansão, o Brasil passou de quinto maior consumidor para terceiro maior mercado consumidor de chocolates no mundo."
Efeitos da fusão em um novo mercado
De acordo com a versão pública da nota técnica do DEE do Cade, os efeitos de uma fusão Nestle-Garoto no mercado de chocolates, que gerou preocupações em 2004 deverão ser bem diferentes se a operação for agora aprovada pelo tribunal administrativo.
Ao analisar o negócio há mais de uma década, os conselheiros avaliavam que a união das duas marcas resultaria no domínio de 58,4% do faturamento do "chamado mercado de chocolates sob todas as formas".
No que é possível ver do estudo finalizado em 2016, os técnicos do Cade apontam que as duas marcas continuariam respondendo pelo topo do mercado, mas sem o mesmo poder para ditar preços ao consumidor, por exemplo
"No mercado de chocolates sob todas as formas, as maiores empresas Nestlé, Garoto e Mondelez mantêm sua liderança, contudo se observam indícios de que seu poder de mercado já não se mostra tão intenso quanto se observou em 2004", diz trecho da nota técnica.
Esse fator, aliado ao desenvolvimento de novas marcas premium, como "Cacau Show, Chocolates Brasil Cacau e Kopenhagen" com mais de 2.000 lojas no país, permitiu aos técnicos "avaliar que a proposta das requerentes [Nestlé-Garoto] produz uma redução sensível na participação das requerentes no mercado de chocolates sob todas as formas".
No caso do setor de coberturas, a nota técnica afirma que o DEE "não verificou que há um potencial anticompetitivo da operação como em 2004". Na ocasião, os dados mostravam um faturamento conjunto das duas empresas equivalente a 88,5% da oferta do mercado de cobertura de chocolate.
Nova proposta para solucionar o litígio judicial
No fim do ano passado, Nestle e Garoto apresentaram uma nova proposta ao Cade, considerada mais palatável em uma primeira análise da procuradoria-federal especializada junto ao conselho. Com base na sugestão, que agora está sob estudo do conselheiro Alexandre Cordeiro, o Cade pediu à Justiça a suspensão do processo por 180 dias para reexaminar a operação.
A autoridade da concorrência tende a determinar mudanças que atinjam os mercados de chocolates e coberturas, além de negociar detalhadamente o destino da fábrica histórica de chocolates da Garoto em Vila Velha (ES).
A proposta apresentada pela Nestlé-Garoto permanece sob sigilo, enquanto é negociada por Cordeiro e as empresas. Ao final de sua avaliação e se concordar que os impactos nos diversos mercados envolvidos, o conselheiro apresentará seu voto ao Plenário, que tem a palavra final.
<a style="color: #ff6600;" href="https://www.jota.info/com-nova-proposta-cade-volta-julgar-nestle-garoto-12-anos-depois-de-reprovar-operacao">+JOTA: Com nova proposta, Cade volta a julgar Nestlé-Garoto 12 anos depois</a>
<a style="color: #ff6600;" href="http://sei.cade.gov.br/sei/institucional/pesquisa/documento_consulta_externa.php?PLf-ii_9AbTC63EeA2EMkoPHocRUmc23TiunBY2WpLmL7QZQrq_xPlKlHW5OyE8utt07cSmjSurNNenNQ0Qf9A,,">+JOTA: Leia a versão pública da nota técnica do Departamento de Estudos Econômicos do Cade</a>

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