Bruno Moura

Em seu primeiro acordo de leniência no âmbito da Lava Jato, a empreiteira OAS forneceu documentos e detalhes sobre a operação de um cartel que atuou de janeiro de 2007 a agosto de 2008 na divisão entre empreiteiras dos quatro lotes de obras rodoviárias do Arco Metropolitano – um empreendimento de 70,9 quilômetros, que percorre mais de sessenta sítios arqueológicos na região metropolitana do Rio de Janeiro.
Trata-se do nono acordo de leniência assinado pela Superintendência-Geral como parte do trabalho conjunto com investigadores da Lava Jato. Segundo o Cade, as informações prestadas pela OAS indicam a prática de “acordos de fixação de preços, condições, vantagens e abstenções de participação em licitação”, “acordos de divisão de mercado entre concorrentes” e “compartilhamento de informações comercial e concorrencialmente sensíveis”.
De posse do material, recebido no fim do mês passado (26/6), a SG abriu um inquérito administrativo (IA 08700.0033226/2017-33) para investigar a conduta das empresas apontadas como participantes do cartel.
O núcleo do cartel foi operado, de acordo com o <a href="http://jota.us8.list-manage.com/track/click?u=4911ce1e520f5bf26dd891c79&amp;id=b055c995ea&amp;e=6308d019ca" target="_blank" rel="noopener noreferrer">Histórico de Conduta</a> fornecido pela OAS, por um grupo de oito empreiteiras, chamado G8. Quatro líderes: Carioca Chistiani Nielsen Engenharia S/A; Construtora Delta S/A; Construtora Norberto Odebrecht S/A; Construtora OAS S/A; e outras quatro “empresas espelho”: , Construtora Andrade Gutierrez S/A; Construções e Comércio Camargo Corrêa S/A; Oriente Construção Civil; e Construtora Queiroz Galvão S/A.
O projeto do Arco do Rio, que ainda possui obras em execução, dividiu-se em 4 lotes, num valor estimado de R$ 802.662.000,00, perpassando os eixos rodoviários BR-101/RJ sul, BR-116/RJ sul, BR-040/RJ, BR-116/RJ norte e BR-101/RJ norte.
Segundo os signatários do acordo, como são denominados os colaboradores, a conduta cartelística pode ser classificada em 3 etapas. A primeira vai de janeiro de 2007 a junho de 2007, em que os primeiros contatos e a formação do cartel entre as principais empresas, ocorreu.
Na segunda etapa, que durou de junho de 2007 a março de 2008, reuniram-se as empresas e representante do governo do Rio de Janeiro para definir como seria o edital de Pré-Qualificação.
De janeiro a agosto de 2008 ,a terceira etapa, foi feita a  a divisão dos lotes entre as empresas, apresentação das propostas e acordos entre os integrantes do G8 e as demais participantes do conluio, segundo o histórico da conduta.
Primeiros contatos
Em janeiro de 2007, segundo relatado no histórico da conduta, representantes da OAS tomaram conhecimento por meio de matéria jornalística, dos planos do governo federal de efetivar as obras do Arco do Rio. Em fevereiro do mesmo ano, o secretário Estadual do Governo do Rio de Janeiro à época, Wilson Carlos, convidou representantes do alto escalão da Carioca Engenharia, Odebrecht, Delta e OAS para reunião no Palácio da Guanabara, sede oficial do governo fluminense.
Segundo os relatos dos signatários reproduzidos pela SG, Wilson Carlos prometeu “que essas empresas teriam participação na elaboração dos Projetos Básico e Executivo, a fim de que fossem estipulados critérios técnicos que servissem, para inabilitar empresas que não fossem 'de confiança' do Governo”.
Wilson Carlos teria dito para as 4 companhias procurarem as Andrade Gutíerrez, Camargo Corrêa, Oriente e Queiroz Galvão e formarem consórcio para as obras. OAS, Odebrecht, Carioca e Delta seriam as líderes das obras, enquanto Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa, Oriente e Queiroz Galvão fariam papel de empresas “espelho”.
Entre fevereiro e março de 2007 as 8 empresas formaram o chamado G8.
Além das empresas citadas, segundo os signatários, as companhias Concremat Engenharia e Tecnologia S.A. e a Tecnosolo Engenharia S.A, empresas projetistas no edital, foram procuradas pelas líderes do consórcio.
Como Concremat e Tecnosolo participariam como consultoras da elaboração dos projetos Básico e Executivo das obras do Arco, era necessário articular com as duas os pré-requisitos que estariam no edital. No histórico relatado, a OAS afirmou à SG que pagou parte das despesas para os projetistas, como sondagens e elaborações de projetos de artes especiais. Wilson Carlos também teria indicado que as empresas procurassem o DER/RJ, responsável pela fiscalização das obras do Arco.
Em 2 de abril de 2007, as 8 empresas reuniram-se e dividiram a participação no consórcio. As quatro líderes receberiam 60% dos valores, enquanto as demais embolsariam os 40% restantes.
Em junho de 2007, as 8 principais empresas reuniram-se para decidir as duplas de empreiteiras que se juntariam nos consórcios. Após diversas brigas e desentendimentos, seja por porte das empresas, questões empresariais e ameaças de atrapalhar os negócios, definiu-se que:
Odebrecht/Andrade Gutierrez; Carioca/Queiroz Galvão; OAS/Camargo Corrêa; Delta/Oriente, formariam as duplas. O sorteio em que se definiria quem ficaria com qual lote só seria realizado perto do lançamento do edital, para que as empresas tivessem tempo de estudar a obra.
Em setembro de 2007, 6 das 8 empresas participaram presencialmente de reunião no Palácio da Guanabara com Wilson Carlos.
Na pauta, “às cláusulas sugeridas pelo G8 no sentido de inabilitar empresas não alinhadas com o cartel.” e aumento do valor do orçamento da obra, previsto em R$ 800 milhões.
Dados apresentados pelas concessionárias ao governo, mostravam que o custo da obra seria de R$ 1,3 bilhão, chegando a R$ 1 bilhão após manutenção dos preços unitários. Contudo, o governo não aceitou aumentar o valor da obra, permanecendo na casa dos R$ 800 milhões.
O calendário do edital da Concorrência Nacional n° 004/2007/SEOBRAS/DN, lançou sua primeira etapa em 18.11.2007, 11 meses após o início das práticas anticompetitivas, com o edital de Pré-Qualificação, já viciado pelas concorrentes. O edital definiu os valores dos 4 lotes da seguinte maneira:
Para que as empresas Delta/Oriente, menores em tamanho e em condições que as demais concorrentes, pudessem concorrer aos lotes, o edital produzido não pode ser tão restritivo quanto se desejava. Desta forma, em 30 de janeiro de 2008, quando o resultado da fase pré-qualificadora saiu, 25 empresas, em 12 consórcios e 1 empresa sozinha, foram tecnicamente habilitadas.
No histórico da conduta, relata-se que as signatárias atribuíram a grande quantidade de empresas habilitadas a 3 fatores:
“ (i) o fato de o Consórcio Delta/Oriente ter menor atestação, o que inviabilizava um Edital de Pré-Qualificação ainda mais restritivo, a despeito do interesse das empresas do G8;
(ii) existência de centenas de empresas aptas a realizarem obras rodoviárias, em virtude do modelo rodoviário adotado na década de 1950, que fazia com que o Brasil sempre tenha licitado diversas obras para implantação de rodovias; e
(iii) pelo fato de que as oito empresas optaram por conversar com as empresas não alinhadas com o cartel apenas em um momento posterior a fase de pré-qualificação”
Após o resultado, algumas empresas adentraram com recurso afirmando que o edital era direcionado e algumas das exigências feitas restringia, o caráter competitivo da licitação.
O próprio G8, então, “acabou por fazer um estudo das atestações das empresas com o fim de estudar as atestações das empresas no sentido de verificar se os seus recursos poderiam ser julgados procedentes”.
Todas as empresas que entraram com recurso desistiram. Segundo o histórico da conduta, “ essas desistências, segundo os Signatários, podem ter sido motivadas pelo ajuste feito entre as integrantes do G8 e essas empresas inabilitadas, em conjunto com o trabalho de Wilson Carlos (Secretário do Estado do Rio de Janeiro”.
Em março de 2008 as empresa se reuniram na sede da Carioca Engenharia, no bairro carioca de São Cristóvão, para sortear qual consórcio ficaria com que lote. O sorteio se deu com a retirada, pelo representante de cada empresa líder, de 1 em 4 pedaços de papel, cada um com um número entre 1 a 4, respectivo aos lotes da concorrência.
Lote 1 – Odebrecht/Andrade Gutierrez
Lote 2 – Carioca/Queiroz Galvão
Lote 3 – OAS/Camargo Corrêa
Lote 4 – Delta/Oriente
Deste momento em diante, as empresas passaram a contatar as demais empresas habilitadas para negociar a desistência de cada uma.
“Definiu-se que o G8 não faria reuniões com as empresas não alinhadas de forma individual, mas sempre em grupos, compostos de duas ou três empresas”.
No dia 03 de abril de 2008 o G8 se reuniu para discutir as compensações pedidas pelas empresas não alinhadas.
No final, o resultado do edital saiu conforme combinado pelas empresas. A diferença entre as propostas girou em torno de R$ 1 milhão, valor irrisório em editais na casa dos R$ 200 milhões.
O relatório ainda indica que “segundo os Signatários, os valores que seriam distribuídos às oito empresas são idênticos, pois essas entenderam que seria mais produtivo que todas fossem contempladas com um mesmo "quinhão", visto que os lotes eram muito semelhantes. Além disso, uma divisão não igualitária poderia gerar instabilidade no cartel. Nesse sentido, optou-se por dividir, igualitariamente os valores que seriam recebidos pelas empresas para evitar maiores discussões sobre a divisão dos lotes, ainda que os custos a serem incorridos fossem diferentes. Nesse sentido, ficou decidido que, durante a obra, seria possível que as empresas realizassem obras no trecho das outras com o objetivo de equalizar os custos incorridos pelas empresas. ”
As obras do Arco Metropolitano do Rio de Janeiro ainda não foram finalizadas, e os consórcios permanecem os mesmos que foram definidos antes do edital de lançamento da pré-qualificação.

Palácio_Guanabara_em_Laranjeiras

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JOTA

Relato da OAS marca 9º acordo de leniência firmado pela Cade no âmbito da operação

Cartel da Lava Jato discutia obra no Palácio da Guanabara

Relato da OAS marca 9º acordo de leniência firmado pela Cade no âmbito da operação