Luiz Fernando Gomes Esteves

A presidência da ministra <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/rosa-weber">Rosa Weber</a> se aproxima do fim. Além de ter conduzido os ministros para importantes reformas regimentais, que reforçaram a colegialidade do Supremo Tribunal Federal (STF), o período certamente ficará marcado pela coragem da ministra em enfrentar temas politicamente sensíveis, que há muito aguardavam julgamento.
O calendário de julgamentos da semana exemplifica muito bem a situação. Em dois dias o tribunal pretendia concluir os julgamentos sobre a criação do juiz de garantias, a descriminalização das drogas, a pauta verde e a regularização fundiária de terras pertencentes a quilombos. Esses não são os únicos casos que o tribunal pretende resolver nas próximas semanas, já que há a expectativa de <a href="https://www.jota.info/stf/do-supremo/rosa-weber-libera-acao-sobre-descriminalizacao-do-aborto-para-julgamento-12092023">que a corte também defina a constitucionalidade do aborto</a> e do marco temporal.
A conta não é difícil. Com duas sessões de julgamento semanais, simplesmente não haverá tempo para a conclusão dos julgamentos de todos os casos. Tradicionalmente, o plenário se reúne apenas nas tardes de quartas e quintas. Mas nem sempre foi assim. Em circunstâncias excepcionais, o STF se organizou para deliberar em outros dias e horários.
Para lidar com o julgamento do mensalão, diversas sessões extraordinárias foram designadas a cada semana. Antes disso, na presidência da ministra Ellen Gracie, foram designadas sessões extraordinárias para lidar com a grande quantidade de processos que chegavam ao tribunal. Mais recentemente, nas presidências de Lewandowski e Cármen Lúcia, não era incomum que sessões fossem designadas para as manhãs de quartas e quintas.
A ampliação do plenário virtual diminuiu o peso da justificativa para a convocação de tais sessões. Com boa parte dos casos sendo julgados naquela arena, e com um tribunal cada vez mais célere no trato de seu acervo, é mais difícil argumentar que os ministros devem se reunir fora dos horários tradicionais. Mas a justificativa não deixou de existir. Os plenários presencial e virtual não são iguais. Se fossem, nenhuma das reuniões presenciais teriam razão de ser, já que o ambiente virtual é inegavelmente mais célere no julgamento de casos.
Os casos acima mencionados têm em comum um forte componente político, que os tornam inviáveis para a solução apressada oferecida pelo plenário virtual. São casos que exigem a deliberação comum, em tempo real e com carga reforçada de publicidade. Um tipo de deliberação que demanda tempo. Tempo que, infelizmente, o plenário presencial não tem, ao menos se mantiver a rotina dos últimos meses.
A alternativa, para viabilizar o julgamento do maior número de casos no próximo mês, é a convocação de sessões extraordinárias. Além de possibilitar o julgamento de mais casos, as sessões extraordinárias poderiam trazer pelo menos dois outros benefícios.
Em primeiro lugar, viabilizariam a participação da ministra Rosa Weber em julgamentos importantes em processos para os quais o seu voto já está preparado. Não existem dúvidas de que a ministra, que se aposentará no final do próximo mês, está preparada para participar do julgamento de todos os casos mencionados. Como presidente, é ela quem define a pauta do plenário presencial do STF. Caso não se sentisse pronta para o julgamento de algum dos casos, ela simplesmente não os designaria para as próximas sessões. Em um caso específico, a ministra fez uma cobrança pública ao ministro André Mendonça, após pedido de vista, manifestando o desejo de votar antes de sua aposentadoria.
A participação da ministra seria indispensável sobretudo na discussão sobre aborto. Além de relatora do caso, a ministra é uma das duas mulheres na composição atual do tribunal. Com a incerteza sobre a nomeação de uma mulher para ocupar o lugar da ministra, há o risco de a relatoria do caso ser distribuída para um homem, ou que a opinião sobre o caso seja um elemento decisivo para a escolha da próxima ministra.
O outro benefício diz respeito ao comportamento dos ministros. Na semana passada, o ministro Dias Toffoli ocupou quase duas sessões com apenas um voto no julgamento da constitucionalidade da criação do juiz de garantias. No mesmo julgamento, o ministro recém-empossado, Cristiano Zanin, disse ter um voto de cerca de 90 páginas. Essa circunstância não é nova, e não seria de todo estranho que um ministro tentasse mostrar serviço nos primeiros meses no tribunal.
Nesse ritmo, porém, os ministros podem utilizar seus votos estrategicamente para evitar o julgamento de casos futuros. Por exemplo, para evitar a discussão sobre aborto, outro ministro também pode ocupar uma ou duas sessões com um voto no julgamento da constitucionalidade do juiz de garantias. Essa estratégia funcionaria como um pedido de vistas com sinal trocado. Ao invés do uso individual de um poder individual para interromper o julgamento atual, os ministros desejam alongar o julgamento atual para evitar o julgamento imediato de casos futuros. Com mais sessões de julgamento, o risco desses verdadeiros filibusters judiciais seria diluído.
Alguém poderia dizer que nada disso justificaria ocupar o tempo dos ministros com novas sessões extraordinárias. Todavia, o custo para a convocação de tais sessões é muito baixo. As sessões ocorreriam em dias úteis, em horários razoáveis, e não representariam nenhuma inovação na história do tribunal, que já adotou a prática em diversos outros momentos, para o julgamento de casos muito ou pouco salientes.
Em 2020, por exemplo, <a href="https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=445507&amp;ori=1">o então presidente Toffoli convocou sessão extraordinária para a manhã de uma quarta-feira</a> com o objetivo de viabilizar o julgamento que definiria a constitucionalidade da abertura do inquérito das fake news. Em outra, em 2017, <a href="https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=361212">uma das ações julgadas na manhã do dia 8 de novembro</a> dizia respeito à composição de uma Câmara Municipal no interior de São Paulo. É difícil encontrar alguma característica comum nos dois casos que justificasse a designação de uma sessão extraordinária para o julgamento, mas que não justificasse nos casos que hoje ocupam a ordem do dia do tribunal.
O legado da ministra Rosa Weber não será definido pelos acontecimentos das próximas seis semanas. Como dito, ela conduziu o STF em alterações institucionais relevantíssimas, além de ter guiado o tribunal com seriedade e responsabilidade em um dos períodos mais conturbados da história recente da corte, o que, por si só, é suficiente para que sua presidência se destaque como uma das mais importantes da história do Supremo. Mas sua marca também é importante no julgamento de casos que há muito aguardam respostas do tribunal, e o curto tempo até sua aposentadoria não pode servir de pretexto para que ela seja impedida de participar da deliberação dos casos importantes, sobretudo se esse é o seu desejo manifesto, e se o tribunal pode convocar sessões extraordinárias para tanto.

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JOTA

Marca da ministra Rosa Weber, que se aposenta em breve, é importante no julgamento de casos que há muito aguardam respostas

Por que não designar mais sessões extraordinárias no STF?

Marca da ministra Rosa Weber, que se aposenta em breve, é importante no julgamento de casos que há muito aguardam respostas do STF