Carolina Haber

O Supremo <a href="https://jota.info/justica/stf-estado-tem-que-pagar-indenizacao-preso-degradante-16022017" target="_blank">decidiu</a> que o preso tem direito à indenização por danos morais decorrentes da superlotação carcerária. Mas qual seria o parâmetro a ser adotado para a concessão da indenização devida? A Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul, que ingressou com a ação, havia pedido 1 salário mínimo por mês de encarceramento em condições degradantes. Mas o Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul condenou o Estado a pagar apenas R$ 2.000,00 em parcela única 
O ministro Barroso já havia tentado resolver essa questão quando tratou, na ADPF 347, do estado de coisas inconstitucional que assola o sistema prisional brasileiro, em razão do quadro de violação generalizada e sistêmica de direitos fundamentais. Para evitar uma indenização irrisória, incapaz de reparar o dano sofrido e, de outro lado, a quebra do Estado, sugeriu a reparação em dias remidos da pena para cada conjunto de dias submetidos a condições degradantes. No RE 580252, os demais ministros debateram se seria possível criar um novo tipo de remição da pena, não previsto em lei, mas a tese de que a indenização deveria ser em pecúnia venceu.
<a href="http://bit.ly/2o75egP">+JOTA: Leia os livros do Supra sobre os julgamentos do STF em 2015 e 2016</a>
Apesar das divergências, o importante é observar que sobre uma questão houve consenso: o Estado é responsável pela integridade física e psicológica dos presos e deve reparar os danos sofridos pela inobservância desse dever. Mas se, em tese, para o Supremo a responsabilidade do Estado é evidente e decorre dos direitos constitucionais de qualquer ser humano – presos ou não –, na prática, não havia tanta clareza assim. A realidade é que o Estado não toma as medidas necessárias para evitar a situação degradante em que se encontra o sistema prisional brasileiro –  especialmente, a superlotação. 
O Supremo vem enviando sinais claros aos executivos federal e estaduais de que passou o tempo em que o judiciário assistia inerte à violação sistemática de direitos por um sistema penitenciário em colapso. Alguns poderiam argumentar que, observando o papel do judiciário na saúde e na educação, a interferência do Supremo em políticas públicas não é suficiente para que o executivo resolva os problemas da população. Mas, ao mesmo tempo, não é possível desconsiderar o papel provocador que o judiciário teve para que avanços tão significativos fossem obtidos tanto no caminho rumo à universalização da educação quanto na ampliação ao acesso a medicamentos. Um papel similar pode ser esperado para o sistema penitenciário, desde que as medidas tomadas pelo Supremo tenham dentes e obriguem os executivos a mudar suas prioridades. 
Esta mudança de prioridades é fundamental, pois ela representa um passo em direção ao momento em que o Estado assumirá um custo que recai unicamente sobre a sociedade. O custo dos presídios superlotados já existe. Ele recai não apenas sobre os presos e suas famílias, mas também, e sobretudo, sobre a população que sofre os efeitos brutais de um sistema que se transformou em um terreno fértil para o fortalecimento de organizações criminosas.
A decisão do Supremo, num primeiro momento, reconhece a obrigação – prevista na Constituição – de que o Estado indenize seus cidadãos quando violar seus direitos. Mas talvez o efeito mais importante seja o de provocar os executivos a assumir o papel (do qual eles vêm fugindo sem custo aparente – mas com custo real) de transformar o sistema penitenciário em algo compatível com os parâmetros ditados pela Constituição Federal.
Não se pode esquecer, é claro, que o judiciário fez o seu papel de responsabilizar o executivo pelas condições degradantes que trata os presos sob sua custódia, mas que a conta é de todos. Em algum momento o Supremo terá que cobrar do próprio judiciário as medidas que já levantou quando tratou da ADPF 347. É preciso prender menos, com mais qualidade e conceder os benefícios devidos aos presos que já têm o direito de cumprir sua pena fora da prisão. Só então será possível vislumbrar alguma mudança efetiva no sistema prisional e, apenas quando isso ocorrer, o executivo não terá que pagar indenização a todos os presos.

Congresso

https://images.jota.info/wp-content/uploads/2021/09/copy-of-jota-logo-high-cmyk.jpeg

JOTA

Sobre decisão do Supremo que envolve indenização de presos por danos morais

O Executivo deve arcar com os custos do sistema prisional

Sobre decisão do Supremo que envolve indenização de presos por danos morais