Ana Pompeu

O Supremo Tribunal Federal (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/stf" target="_blank" rel="noopener noreferrer">STF</a>) considerou, nesta quinta-feira (17/12), constitucional a vacinação compulsória. O colegiado reforçou, mais uma vez, que a obrigatoriedade não pressupõem forçar, mas depende do consentimento do cidadão. Contudo, os entes federados podem definir medidas restritivas para incentivar a vacinação. 
As vacinas devem ter registro em órgão de vigilância sanitária, mas não necessariamente na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A depender do caso, excepcionalmente, os entes podem importar materiais, medicamentos, equipamentos ou vacinas registrados em agências de vigilância sanitária dos Estados Unidos, Japão, Europa ou China. 
Nos votos, os ministros ressaltaram a importância da valorização da ciência, retomaram a história das vacinas como forma de ampliar a proteção da população contra doenças transmissíveis e ampliar a expectativa de vida da humanidade, além de enfatizar que, neste caso, o direito coletivo à saúde pública deve prevalecer sobre entendimentos individuais.
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Três ações discutem se o poder público pode determinar a obrigatoriedade de vacinação e são analisadas pelo Supremo. Duas delas são relatadas pelo ministro Ricardo Lewandowski: um processo tratava da política de imunização para a Covid-19 e um recurso extraordinário questionava o dever de pais de vacinar filhos, mesmo quando possuem convicções filosóficas contrárias à vacinação.
Os relatores foram acompanhados pelos ministros Alexandre de Moraes, Luiz Edson Fachin, Rosa Weber, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes, Marco Aurélio. Já o ministro Nunes Marques, ainda que tenha acompanhado os votos endossados pelo plenário, apresentou uma ressalva para definir que a vacinação será obrigatória depois que a União for consultada por entender que a legislação assim o define.  
Pela tese aprovada pelos ministros: "a vacinação compulsória não significa vacinação forçada, porquanto facultada sempre a recusa do usuário, podendo, contudo, ser implementada por meio de medidas indiretas, as quais compreendem, dentre outras, a restrição ao exercício de certas atividades ou à frequência de determinados lugares, desde que previstas em lei, ou dela decorrentes, e (i) tenham como base evidências científicas e análises estratégicas pertinentes, (ii) venham acompanhadas de ampla informação sobre a eficácia, segurança e contraindicações dos imunizantes, (iii) respeitem a dignidade humana e os direitos fundamentais das pessoas, (iv) atendam aos critérios de razoabilidade e proporcionalidade e (v) sejam as vacinas distribuídas universal e gratuitamente".
Ainda segundo a tese adotada pelo Supremo: "(II) tais medidas, com as limitações acima expostas, podem ser implementadas tanto pela União como pelos Estados, Distrito Federal e Municípios, respeitadas as respectivas esferas de competência".
<h3>Relatores</h3>
O julgamento teve início na sessão desta quarta-feira (16/12). O ministro Ricardo Lewandowski, relator de duas das três ações analisadas em conjunto, votou no sentido de que tanto a União, quanto estados e municípios <a href="https://www.jota.info/stf/do-supremo/vacinacao-obrigatoria-lewandowski-16122020" target="_blank" rel="noopener noreferrer">podem instituir a vacinação compulsória, com a possibilidade de adotar medidas restritivas para incentivar a imunização</a>, desde que essas medidas estejam previstas em lei. O ministro enfatizou, entretanto, que vacinação obrigatória não é forçada.
<blockquote class="jota-article__eye">Para Lewandowski, a obrigação pode ser implementada “por meio de medidas como a restrição ao exercício de certas atividades ou à frequência de determinados lugares, desde que as medidas sejam acompanhadas de ampla informação sobre a eficácia, segurança e contraindicações das vacinas”. </blockquote>
<a href="https://www.jota.info/stf/do-supremo/vacinacao-obrigatoria-lewandowski-16122020/attachment/adi6586-vacina-obrigatoriedade" target="_blank" rel="noopener noreferrer">Leia a íntegra do voto de Lewandowski</a>.
O tema é julgado em três processos. Dois deles se referem à Covid-19. Na ação direta de inconstitucionalidade (ADI) 6.586, o PDT pede que o Supremo determine que os estados têm competência para determinar a obrigatoriedade da vacinação contra a Covid-19. Em sentido oposto, o PTB ajuizou a ADI 6.587, na qual pede que o STF fixe ser inconstitucional a obrigatoriedade da vacina contra o vírus, seja pela União, seja pelos estados.
Em discussão nas duas ações, está o artigo 3°, inciso 3, alínea ‘d’ da Lei 13.979/2020, que prevê medidas para o enfrentamento à pandemia da Covid-19. Essas são as ações relatadas por Lewandowski. 
Já o ministro Luís Roberto Barroso é o relator do recurso extraordinário com repercussão geral que discute se pais podem deixar de vacinar os filhos por “convicções filosóficas, religiosas, morais e existenciais”. Essa era a terceira ação em debate. O processo que chegou à Corte envolve pais adeptos do veganismo, que se recusaram a vacinar o filho por convicções morais. 
"As vacinas historicamente se provaram uma grande invenção da medicina em prol da humanidade", disse o ministro. Ele dividiu o voto em três partes: fez uma recuperação histórica das epidemias na humanidade e o papel da vacinação na erradicação desses males, expôs os interesses em jogo e, por fim, apresentou o resultado da ponderação que fez desses interesses. 
Segundo Barroso, é impossível exagerar a importância da vacinação como meio de preservação da vida e da saúde da coletividade. “Parece-me fora de dúvida que o direito à vida e à saúde da coletividade, que naturalmente se traduz no direito individual de todos e de cada um, e também o direito prioritário das crianças que a Constituição assegura deve prevalecer sobre a liberdade de consciência e de convicção filosófica”, defendeu. 
Barroso afirmou que esse é um dos únicos casos em que o paternalismo do Estado é aceitável. 
<blockquote class="jota-article__eye">"Não seria razoável em nome de um direito individual frustrar o direito da coletividade, de cada um, individualmente, estar exposto a uma doença que poderia ser evitada", afirmou Barroso.</blockquote>
<a href="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2020/12/voto-mlrb-are-1267879-vacinaccca7acc83o-obrigatoria.pdf">Leia a íntegra do voto de Barroso</a>.
<h3>Votos</h3>
O ministro Alexandre de Moraes, ao acompanhar, abriu o voto com uma fala dura àqueles que se opõem, de saída, à vacinação.  "A preservação da vida, da saúde, seja individual, seja pública, em um país como o Brasil, com quase 200 mil mortos pela Covid-19, não permite ao tratarmos desse tema, e por isso a importância desta Corte defini-lo, não permite demagogia, hipocrisia, ideologias, obscurantismo, disputas político eleitoreiras e principalmente não permite ignorância", disse. 
De acordo com ele, as discussões radicalizadas contra a vacinação são dominadas por hipocrisia, já que as mesmas pessoas não se opõem a tomar a vacina contra a febre amarela para que possam viajar ao exterior, por ser obrigatória para a entrada em alguns países. Passam, da mesma forma, por revista individual e scanners em aeroportos.
"Mas, para combater uma pandemia que já matou milhões de pessoas, esses discursos vêm se aflorando. Tem a ver com a total falta de empatia com essas quase 200 mil famílias que perderam entes queridos em virtude da Covid-19. A proteção de direitos fundamentais não pode, de forma alguma, conviver com tanta falsa ideologia, ignorar os avanços históricos que a produção de vacinas, a ciência trouxe para a vida humana", afirmou Moraes.
Moraes também relembrou os primeiros julgamentos da Corte a respeito das competências dos entes federados em relação à pandemia. "Já tivemos oportunidade de julgarmos inúmeras questões sobre isso e o STF fixou fortemente a ideia de que a gravidade de emergência da pandemia exigia das autoridades brasileiras de todos os níveis de governo, todos os níveis da federação a efetivação concreta de medidas de saúde pública, medidas possíveis e tecnicamente sustentáveis, entre elas, a vacinação, a partir do momento que passar por todos os procedimentos legais."
Em seu voto, o ministro Luiz Edson Fachin respondeu a declarações do presidente Jair Bolsonaro, integrantes e apoiadores do governo de que o STF teria retirado poderes da União de agir no combate ao coronavírus. Ao acompanhar integralmente os dois relatores, Lewandowski e Barroso, ele disse que há um senso de urgência importante no tema. 
"A vacinação à luz do parâmetro da Constituição é sim obrigatória e se dá nos limites das possibilidades da expressão democrática do federalismo. É por isso mesmo que o STF não retirou poderes de quem quer que seja, muito menos do Executivo federal, para enfrentar a pandemia. Não se diga que o Supremo definiu que apenas os estados poderiam agir para enfrentar a emergência sanitária. A obrigação é de todos os entes públicos. Nenhuma autoridade e nenhum servidor público poderá se isentar. A Constituição não autoriza o poder público a cruzar os braços. A matéria e o sentido é de máxima urgência. E o STF também não o fará", destacou Fachin.
Para a ministra Cármen Lúcia, o resumo é que o egoísmo não é compatível com a democracia. "A Constituição não garante liberdade a uma pessoa para ela ser soberanamente egoísta. É dever do Estado, mediante políticas públicas, reduzir riscos de doenças e outros agravos, adotando as medidas necessárias para proteger a todos da contaminação de um vírus perigoso".
A ministra também ressalta que a ciência deve prevalecer sobre opiniões individuais e de autoridades públicas. "Não é possível que alguém imagine que algum Estado possa, tendo a ciência uma atuação exemplar para chegar a uma vacina, condicionar isso ao voluntarismo de quem está no poder" disse.
Na mesma linha, o ministro Gilmar Mendes enfatizou que objeções de consciência não podem se opor ao interesse estatal na área sanitária tendo em vista a imunização da população. "No caso da recusa vacinal, o que está em jogo, em última análise, é a essencialidade do cumprimento da medida para um plano maior de realização de política pública de combate a uma doença infectocontagiosa que põe em risco a vida de todos".
Mendes fez uma retomada histórica das políticas de vacinação no Brasil e conclui que não razões para afirmar uma inconstitucionalidade das medidas legais que impõem a compulsoriedade da vacinação.
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O episódio 47 do podcast Sem Precedentes analisa o julgamento do Supremo Tribunal Federal que decidiu pela inconstitucionalidade da reeleição dos presidentes do Congresso. Ouça:
https://youtu.be/roD5SwCzhLI
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JOTA

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