Hyndara Freitas

<table style="border-collapse: collapse; width: 100%;" border="1">
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<td style="width: 100%;">A reportagem foi atualizada às 20h07 de 19 de agosto de 2020 para inclusão da nota do escritório Dias de Souza, que defende a Usina Matary</td>
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O Supremo Tribunal Federal (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/stf">STF</a>) decidiu que não cabe indenização pela União a produtores do setor sucroalcooleiro por eventuais prejuízos causados pela fixação de preços de produtos entre 1986 e 1997. As empresas alegavam que os preços foram fixados em valores inferiores ao custo de produção. A maioria dos ministros entendeu que é preciso a comprovação do prejuízo econômico por meio de perícia técnica em cada caso específico.
Foi fixada a seguinte tese de repercussão geral, que deverá ser observada por todas as instâncias do Judiciário: “É imprescindível para o reconhecimento da responsabilidade civil do Estado em decorrência da fixação de preços no setor sucroalcooleiro a comprovação de efetivo prejuízo econômico, mediante perícia técnica em cada caso concreto”.
<a href="http://conteudo.jota.info/jota-pro-tributos" target="_blank" rel="noopener noreferrer"><img class="aligncenter wp-image-259015 size-full" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2020/07/cta-jota-pro-tributos.jpeg" alt="" width="1080" height="1080" /></a>
O tema foi discutido no Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 884325, no qual a Usina Matary S.A. questionava acórdão do do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que negou a responsabilidade da União pelos alegados prejuízos entre abril de 1986 e janeiro de 1997 e decidiu que não caberia indenização à usina. O pedido da empresa já havia sido negado na primeira instância e no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1).
A empresa alegou que, no período, os preços dos produtos produzidos pelo setor foram estabelecidos pelo Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA) em valores inferiores aos custos médios de produção, o que resultou em danos patrimoniais aos produtores da área. Argumentava que esses danos seriam indenizáveis pela União com base na responsabilidade civil objetiva do Estado. A usina defendeu que a indenização deve ser correspondente à diferença entre os preços fixados pelo IAA e aquele apurado tecnicamente pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) à época, multiplicada pela qualidade de derivados de cana comercializados pela autora.
A Advocacia-Geral da União (AGU) calculou que o caso, caso houvesse decisão contrária à União, haveria um impacto econômico de pelo menos R$ 72 bilhões aos cofres públicos.
O ministro relator, Edson Fachin, citou os artigos 170, 173 e 174 da Constituição, que preveem a intervenção do Estado na regulação do setor econômico, e explicou que “a mera limitação do lucro não consubstancia dano injusto e, como tal, não dá direito a indenização”. “Na linha de alguns precedentes desta Corte e também nos termos em que lançada a petição do recurso extraordinário, poder-se-ia questionar se a indenização não teria lugar em virtude da atuação ilegal do Estado, por adotar um critério de preços diferente do que aquele estabelecido na lei. Não há dúvidas que a ilicitude tem a potencialidade de dar margem à indenização. No entanto, o dano é elemento indispensável à responsabilização do agente. Admitir-se o cabimento da responsabilidade da União sem que haja dano seria equiparar a responsabilidade civil ao crime de mera conduta, o que não se coaduna com própria definição do instituto”, <a href="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2020/08/4087493.pdf">diz Fachin em seu voto.</a>
Para Fachin, a responsabilidade civil do Estado ocorre sempre que preenchidos os seguintes requisitos: a) dano; b) ação administrativa; c) nexo causal entre o dano e ação administrativa. “É irrelevante, para a aplicação do instituto, a dúvida sobre a licitude da ação, bastando que ela cause o dano. A atuação do Estado sobre o domínio econômico por meio de normas de direção pode, potencialmente, atingir a lucratividade dos agentes econômicos. A política de fixação de preços constitui, em si mesma, uma limitação de lucros, razão pela qual a indenizabilidade de eventual dano atinge somente o efetivo prejuízo econômico, apurado por meio de perícia técnica”, destacou o relator. Assim, votou por negar o recurso da Usina Matary.
Fachin foi acompanhado pelos ministros Alexandre de Moraes, Rosa Weber, Gilmar Mendes e Cármen Lúcia.
Já o ministro Ricardo Lewandowski abriu a divergência. Em sua visão, há precedentes no STF que reconhecem o empecilho ao livre exercício da atividade econômica na fixação de preços, pela União, aos produtos do setor sucroalcooleiro. “Assim, embora a intervenção no domínio econômico seja uma possibilidade consagrada na Constituição Federal, o exercício dessa prerrogativa estatal deve respeitar os princípios e fundamentos da ordem econômica, de modo a não malferir a livre iniciativa e, por consequência, o Estado Democrático de Direito”, diz Lewandowski em seu voto.
Lewandowski foi acompanhado pelos ministros Luiz Fux, Marco Aurélio Mello e Luís Roberto Barroso. O ministro Dias Toffoli não participou do julgamento pois se declarou impedido. Já o ministro Celso de Mello não juntou voto.
O escritório Dias de Souza, que defende a Usina Matary, enviou a seguinte nota à redação:
"O STF reafirmou o direito das empresas do setor sucroalcooleiro à indenização pelos danos decorrentes do controle de preços nas décadas de 1980 e 1990. Por 5 votos a 4 (sem os votos dos Ministros Celso de Mello, que se ausentou do julgamento virtual, e Dias Toffoli, que se declarou impedido), entendeu-se que a indenização deverá considerar o prejuízo econômico decorrente da comparação entre o preço fixado oficialmente pela União e os custos individuais de cada empresa, somados à margem de lucro e retorno de capital. A decisão não interfere nos casos já decididos com determinação de cálculo da indenização de acordo com os custos médios regionais apurados pela FGV à época e o novo critério poderá resultar, em alguns casos, em valores até mesmo superiores aos devidos pelo critério anterior.
<ol>
<li>O STF não negou o direito às indenizações do setor sucroalcooleiro. O STF reafirmou a jurisprudência que reconhece o direito à indenização em função da fixação de preços defasados. </li>
</ol>
Está dito no acórdão repetitivo do STJ – ora mantido pelo STF – o seguinte:
A União Federal é responsável por prejuízos decorrentes da fixação de preços pelo governo federal para o setor sucroalcooleiro, (...) uma vez que teriam sido estabelecidos pelo Instituto do Açúcar e Álcool - IAA, em descompasso do levantamento de custos de produção apurados pela Fundação Getúlio Vargas – FGV. (Ementa–REsp 1.347136/DF, Min. Eliana Calmon, DJ 07/03/2014).
O mesmo consta do voto do Ministro Fachin, Relator do caso no STF:
“como já se afirmou neste voto, a Corte, desde o precedente firmado no RE 422.941 (...) reconhece que esta conduta, se causar prejuízo, é indenizável”.
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<ol start="2">
<li>O que o STF fez foi mudar a forma de apuração/quantificação dos prejuízos. </li>
</ol>
Antes a jurisprudência do STF – formada desde 2005 – admitia indenizar o chamado “dano econômico” (diferença entre o preço fixado pelo Governo e o que decorreria das apurações técnicas da FGV, por ele contratada para esse fim). As provas periciais apuraram os danos de cada Usina a partir disso. Há quarenta julgados nesse sentido do STF.
A União discordava desse critério, pretendendo apenas a indenização do chamado “prejuízo contábil”, consistente na mera diferença entre o preço fixado e custo contábil de cada empresa.
O STF adotou neste julgamento um terceiro critério, o do “prejuízo econômico” que consiste na diferença, a menor, entre o preço fixado pela União e o que resulte da soma do “preço de custo” (contábil de cada empresa), “acrescido de um retorno mínimo, compatível com as necessidades de reinvestimento e de lucratividade próprias do setor privado” (voto do Ministro Fachin).
Essa decisão do STF alcança os casos com ações de conhecimento em curso em que ainda se discute o direito à indenização. Nestes casos, deverá ser reconhecido o direito das empresas de serem indenizadas, porém delas será exigida uma prova pericial que quantifique o “prejuízo econômico” a partir do exame desses três itens: custo contábil + lucro + retorno para reinvestimento.
A decisão pode até prejudicar as empresas que não possuem mais a documentação de 30-35 anos atrás. Por outro lado, pode gerar indenizações com valores inclusive superiores àquelas que seriam devidas pelo critério que havia sido aceito pelo STF desde 2005. Isso, por si só, demonstra a fragilidade do número apontado pela União como tendo sido “salvo” do Tesouro. Trata-se de mera especulação do Governo, desprovida de qualquer fundamento técnico.
<ol start="3">
<li>A decisão do STF NÃO altera o passado, ou seja, os casos já transitados em julgado.</li>
</ol>
O acórdão do STJ fixou uma tese específica para os casos transitados em julgado, no sentido de que devessem seguir a forma de apuração prevista em cada título:
“os Embargos de Declaração devem ser acolhidos, para, sanando a obscuridade apontada, esclarecer que, nos casos em que já há sentença transitada em julgado, no processo de conhecimento, a forma de apuração do valor devido deve observar o respectivo título executivo”. (Item VI da ementa dos EDs-REsp 1.347.136, Rel. Min. Assusete Magalhães, DJe 02/02/2015)
Apenas a Usina Matary ingressou com o recurso extraordinário ao STF para questionar o critério de apuração das indenizações a partir dos custos individuais das empresas (ao invés dos médios regionais da FGV).
A União NÃO ingressou com recurso ao STF para questionar a tese repetitiva fixada em seu desfavor para os casos transitados em julgado e nem mesmo a fixação de seu dever – geral – de indenizar as empresas.
Portanto, o decidido para os casos transitados em julgado não é afetado pelo julgamento do STF. Há decisão definitiva do STJ a esse respeito. Mesmo se não houvesse, seria inadmissível reabrir a coisa julgada material – que é uma garantia individual assegurada pela Constituição – em função de julgamento superveniente do STF em sentido diverso. Há inúmeros precedentes tanto do STJ quanto do STF nesse sentido. Trata-se de uma questão de segurança jurídica.
Hamilton Dias de Souza
Daniel Szelbracikowski
Advocacia Dias de Souza"

MT-Canadeacucar-MatoGrosso-3-850×565

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JOTA

Impacto do julgamento aos cofres públicos seria de R$ 72 bilhões caso a indenização fosse concedida

STF: União não deve indenizar setor sucroalcooleiro por tabelamento de preços

Plenário fixou que indenização da União só é devida em caso de demonstração de prejuízo em cada caso, por meio de perícia técnica