Luiz Orlando Carneiro

Por unanimidade, a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal negou, nesta terça-feira (6/8), a extradição do empresário turco Ali Sipahi – naturalizado brasileiro em 2016, residente em São Paulo desde 2007 – procurado e acusado pelo Governo da Turquia de integrar o movimento Hizmet, considerado terrorista pelo presidente daquele país, Fecep Erdogan, que está no poder desde 2003.
O voto-condutor foi o do ministro-relator Edson Fachin, que considerou haver “fundados motivos para negar a extradição”, basicamente porque – além de “falta de configuração de crime político” - há “no mínimo, uma justificada dúvida de que o extraditando venha a ser submetido a um tribunal independente”. O ministro citou que pode ser considerado fato notório a instabilidade política e até mesmo demissões de juízes bem como prisões de opositores do governo.
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Nesta linha, Edson Fachin citou relatório do Parlamento Europeu (2018) sobre a situação dos poderes judiciário e legislativo na Turquia, além de decisão recente da Corte Suprema da Inglaterra, que rejeitou pedido de extradição de supostos terroristas turcos, por “não se poder ter certeza de julgamento com garantias constitucionais num quadro de instabilidade como o existente atualmente na Turquia”. (<a href="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2019/08/dcc12abd14ddf74005205040bae9726b.pdf">Leia a íntegra do voto de Fachin</a>)
Os ministros Ricardo Lewandowski e Gilmar Neves acompanharam o voto do relator, dando também ênfase especial à necessidade de se negar pedido de extradição sempre que não houver garantia de submissão do extraditando às garantias do Estado de direito.
Segundo Gilmar Mendes, "não há garantias de julgamento imparcial". "Destaque-se a prevalência dos direitos humanos constitui um dos princípios fundamentais da República Federativa do Brasil. (...) Seguindo essa linha de raciocínio, a lei 13.445 de 2017 proíbe a concessão de extradição quando o requerido estiver respondendo no Estado requerente perante um tribunal ou juízo de exceção. Além disso, as hipóteses legalmente previstas que proíbem a extradição podem ser expandidas pela jurisprudência  para atender ao respeito a outros direitos humanos", disse o ministro.
Decano do Supremo, o ministro Celso de Mello afirmou que o repúdio ao terrorismo representa um compromisso ético-jurídico.
Em junho, o ministro-relator Fachin acolhera pedido da defesa, e revogado as medidas cautelares de monitoração eletrônica e de recolhimento domiciliar noturno e nos dias de folga de Ali, que é sócio de três restaurantes na capital paulista.
O parecer da Procuradoria-Geral da República já tinha sido contra a concessão da extradição, no sentido de que o nacional turco integraria organização não reconhecida como terrorista.
Para o Ministério Público, “o afastamento de juízes e promotores, o registro de prisões arbitrárias e outros acontecimentos noticiados demonstram a possibilidade concreta de que o estrangeiro venha a ser submetido a um juízo de exceção no Estado requerente”. Quanto à Hizmet, o parecer a qualificou como organização que “dissemina ideais legítimos em mais de 170 países, não se qualificando, assim, como organização terrorista sob o olhar da comunidade internacional”.
Autoridades turcas apontam que ele depositou dinheiro em uma conta de um banco que seria da organização. O empresário diz que depositou R$ 1 mil em uma conta própria para pagar despesas de cartão de crédito. O pedido de prisão preventiva para fins de extradição, chegou ao Supremo em março.
Pela lei, é permitido extraditar um cidadão naturalizado, desde que ele seja acusado de crime comum cometido antes da naturalização.
Em nota pública a comunidade Hizmet no Brasil afirmou que todos estavam  “muito preocupados com pedido de extradição de um amigo empresário da nossa comunidade, enviado pelo Governo da Turquia ao Brasil”.  O presidente Erdogan, diz o grupo, “é um político que utiliza todos os recursos do Estado para combater os valores fundamentais da democracia e não tolera quem discorda dele. Demonstra uma liderança ditatorial que prende, chamando de terroristas, os juízes, procuradores, professores, jornalistas, mulheres, crianças e dezenas de milhares de pessoas inocentes, só porque pensam diferente dele”.
“O indeferimento da extradição foi um sinal claro e inconteste de resistência e rechaço a qualquer governo, em qualquer canto do planeta, que queira flertar ou firmar compromisso com o autoritarismo, com a erosão de instituições democráticas, com a restrição da liberdade de opinião e com a violação de direitos humanos", diz Beto Vasconcelos, que atuou no caso como advogado da Conectas Direitos Humanos, admitida como amicus curiae no processo.

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JOTA

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