Gestação de risco

STF nega aborto a mulher grávida de gêmeos siameses sem chances de sobrevivência

Para médicos, o prolongamento da gestação colocaria em risco à saúde da gestante. 2ª Turma formou maioria contra

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Sessão da 2ª turma do STF / Crédito: Nelson Jr./SCO/STF

A 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) negou o pedido de uma mulher gestante de gêmeos siameses para interromper a gravidez. Segundo os médicos, os fetos não têm chances de sobreviver fora do útero e o prolongamento da gestação gera riscos de morte à mulher.

A mulher, que atravessa o sexto mês de gestação, já havia tido seu apelo negado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (TJRS) e pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). O juiz de primeira instância reuniu histórias bem-sucedidas de sobrevivência de gêmeos siamesas para indicar que não existiriam provas definitivas sobre a inviabilidade do feto.

A equipe médica, ligada à Prefeitura de Porto Alegre, constatou que o caso é inviável para separação e sobrevida, pois há tronco único para os fetos, que compartilham vários órgãos nobres. Também apontou para os riscos da continuidade da gestação para a mulher, como chances de uma ruptura uterina e de desenvolver doença hipertensiva ou diabetes gestacional.

Além da Defensoria Pública do Rio Grande do Sul, que representa a mulher no caso, o Ministério Público Federal se posicionou favorável à autorização da interrupção da gestação.

O relator do caso no STF, ministro André Mendonça, negou o pedido liminar e votou contra a autorização no julgamento. Segundo ele, “em homenagem à segurança jurídica”, não seria possível usar para esta e outras situações a prerrogativa fixada pelo STF que permite o abortamento de feto anencefálico – a previsão foi dada na ADPF 54, em 2012.

Entretanto, Mendonça pontuou que a possibilidade de aborto legal quando não há outro meio de salvar a vida da gestante é uma decisão exclusivamente médica. “Nestes casos, prescinde-se de autorização judicial ou até mesmo do consentimento da gestante, por hipótese de estado de necessidade”, diz o ministro.

A questão é que, nesse caso, o risco de morte não seria imediato. “Não cabe ao Poder Judiciário ser previamente consultado sobre a probabilística configuração de um crime”, diz ele. Porém, se a equipe médica concluir que a interrupção é essencial para garantir a vida da gestante, não caberia discussão judicial.

Mendonça foi acompanhado dos votos dos ministros Gilmar Mendes, Nunes Marques e Ricardo Lewandowski para formar maioria, em julgamento encerrado virtualmente nesta terça-feira (11/10). Já Edson Fachin votou de forma divergente.

Fachin criticou os argumentos de ordem processual, como a de que o STF não poderia agir pois a análise não havia sido esgotada nas instâncias inferiores. “Em temas que versam sobre direitos das mulheres, a Corte Interamericana de Direitos Humanos tem exortado o Brasil a não reiterar omissões e silêncios no âmbito do seu sistema de Justiça”, afirma.

Ele também defendeu a aplicação da ADPF 54 ao caso, pois o entendimento não se limitaria a uma condição, mas à inviabilidade da vida extrauterina de modo geral.

“Não cabe ao Supremo Tribunal Federal criar um índex de todas as doenças, situações limítrofes e riscos à saúde de fetos e gestantes, julgando ações abstratas sobre todas elas”, diz. Acima disso estaria a “definição constitucional atinente à laicidade, dignidade humana, autodeterminação e saúde das mulheres”.

Por fim, a perspectiva dele é que também caberia ao Judiciário sinalizar que não haveria criminalização caso ocorra a interrupção diante dos riscos à mulher.

“A preponderância de questões e barreiras processuais, neste cenário, possui carga simbólica, capaz de gerar uma segunda vitimização de quem, pelas próprias circunstâncias, acha-se em profunda vulnerabilidade e sofrimento, afirma Fachin.

O caso é tratado no STF no HC 220431