A ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), negou o pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR) para arquivar o inquérito que investiga se o presidente Jair Bolsonaro (PL) cometeu crime de prevaricação no caso da compra das vacinas Covaxin.
A investigação foi aberta para verificar se Bolsonaro não tomou as medidas necessárias ao ser avisado pelo deputado Luís Miranda (DEM-DF) de que haveria negociatas na compra das vacinas.
A Polícia Federal confirmou que houve o encontro entre o presidente da República, o deputado federal Luis Miranda e o servidor público Luis Ricardo, no Palácio da Alvorada, em 20 de março de 2021, mesmo não constando na agenda oficial do presidente.
Porém, a PF entendeu que o conhecimento da denúncia por parte do presidente não é suficiente para caracterizar o crime de prevaricação, porque não existe um “dever funcional” do presidente da República para agir neste caso. Depois, foi a vez de a PGR requerer o arquivamento da investigação.
O que Rosa Weber escreveu sobre a conduta de Bolsonaro no caso Covaxin
A ministra Rosa Weber discordou. Para ela, “ao ser diretamente notificado sobre a prática de crimes funcionais (consumados ou em andamento) nas dependências da administração federal direta, ao Presidente da República não assiste a prerrogativa da inércia nem o direito à letargia, senão o poder-dever de acionar os mecanismos de controle interno legalmente previstos, a fim de buscar interromper a ação criminosa – ou, se já consumada, refrear a propagação de seus efeitos –, de um lado, e de “tornar efetiva a responsabilidade dos seus subordinados”, de
outro”.
Para a ministra, “o Presidente da República também é súdito das leis e, situando-se no vértice da hierarquia administrativa, não pode se furtar ao dever tanto de extirpar do sistema jurídico aqueles atos infralegais que se põem em antítese com as leis da República (FRANCISCO, José Carlos. Op. Cit., p. 1.296) quanto de repreender, no plano disciplinar, os agentes do executivo transgressores do ordenamento jurídico”.
“Esses são, portanto, os atos de ofício reclamados, no contexto acima descrito, do Chefe de Governo. Retardá-los ou omiti-los, injustificadamente, ‘para satisfazer interesse ou sentimento pessoal’, constitui, sim, conduta apta a preencher o suporte fático da cláusula de incriminação prevista no art. 319 do CP”, escreveu a ministra.
Na decisão, Weber afirmou que no Brasil “o Ministério Público é o senhor exclusivo da decisão sobre a existência, ou não, de justa causa para a instauração da persecutio criminis in judicio”, mas entendeu que “o modelo acusatório não outorga ao Ministério Público a função de intérprete definitivo das leis penais do país, tampouco subtrai do magistrado, em sede processual penal, o regular exercício da prática hermenêutica”.
Mesmo no domínio penal, afirma Rosa Weber, “compete ao Judiciário em geral e a esta Suprema Corte em particular a última palavra sobre o conteúdo normativo dos preceitos primários de incriminação, máxime quando em pauta, como no caso, discussão sobre o significado e o alcance de cláusulas constitucionais”.
Por fim, a ministra afirmou que sua decisão não ofende a prerrogativa de independência funcional do Ministério Público, “uma vez que, longe de compelir o Parquet a agir em tal ou qual direção, o presente decisum limita-se a refutar o pretendido julgamento antecipado do mérito da causa penal”.
A decisão foi tomada no INQ 4.875. Leia a íntegra.