Hyndara Freitas

Nos primeiros minutos desta sexta-feira (4/11), o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), divulgou seu voto para determinar que a reeleição dos presidentes do Senado e da Câmara é uma questão interna corporis, a ser resolvida pelas próprias Casas por meio do regimento interno. O ministro Dias Toffoli, minutos depois, incluiu seu voto no plenário virtual, no mesmo sentido de Gilmar Mendes.
Nunes Marques, entretanto, divergiu parcialmente menos de meia hora depois, também na madrugada desta sexta-feira. Seu voto também foi incluído no plenário virtual logo depois de divulgadas as posições de Gilmar Mende se Toffoli. Ele votou, em resumo, para que seja liberada a reeleição apenas de Davi Alcolumbre, atual presidente do Senado, enquanto Rodrigo Maia ficaria impedido de se reeleger.
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Pelo voto de Gilmar Mendes, ficam liberadas as reeleições de Rodrigo Maia  e de Davi Alcolumbre para a Câmara e para o Senado, respectivamente.
O ministro afirma, em seu voto, que não pode haver mais de uma recondução para o cargo de presidente das Casas. Entretanto, isso vale apenas para a próxima legislatura. Assim, Maia pode se reeleger para a presidência da Câmara, cargo que ocupa desde julho de 2016. O ministro entendeu que a interpretação do regimento interno cabe às Casas Legislativas, e pode ser feito tanto por questão de ordem ou qualquer outro meio de interpretação. <a href="https://www.jota.info/stf/do-supremo/gilmar-mendes-reeleicao-no-senado-e-camara-e-questao-politica-04122020/attachment/5153026-1" rel="attachment wp-att-285724">Leia a íntegra do voto do relator</a>.
Gilmar Mendes relembra, em seu voto, que a Constituição foi mudada para permitir a reeleição para a Presidência da República. “Hoje, diferentemente, nosso sistema constitucional não mais é avesso à reeleição , e a permanência de Presidente da República, Governadores e Prefeitos pode ocorrer pelo prazo contínuo de até 8 anos. Não vou tão longe ao ponto de igualar cargo na Mesa de Casa do Congresso Nacional ao de Presidente da República e, muito menos, de sugerir a imediata extensão analógica da EC n. 16/1997 à seara das posições de direção das Casas Legislativas”, diz o ministro em seu voto.
“Se assim o fizesse, deveria concluir que, após tal Emenda, 8 anos seria a permanência máxima de mandatos sucessivos em cargo da Mesa do Congresso Nacional. Tal marco temporal, contudo, não me parece imprescindível à liberdade de conformação institucional do Congresso Nacional. Considerado o teor do art. 57, § 4º, CF/88, o redimensionamento que a EC n. 16/1997 implicou no princípio republicano serve ao equacionamento da questão constitucional que ora enfrentamos ao fornecer o critério objetivo de 1 única reeleição/recondução sucessiva para o mesmo cargo da Mesa”, afirma Gilmar.
<h3>Reeleição na Câmara e no Senado</h3>
O tema é julgado no plenário virtual a partir da meia noite desta sexta-feira (4/12), no âmbito da ação direta de inconstitucionalidade (ADI) 6524, ajuizada pelo PTB,  que pede que seja declarada inconstitucional a reeleição de presidentes das Casas Legislativas. Gilmar Mendes é o relator. Os ministros têm uma semana para proferir seus votos, mas a qualquer momento um ministro pode pedir vista (mais tempo para analisar) ou destaque (remeter o processo para julgamento presencial).
Nunes Marques, <a href="https://www.jota.info/stf/do-supremo/gilmar-mendes-reeleicao-no-senado-e-camara-e-questao-politica-04122020/attachment/5236555-1" rel="attachment wp-att-285726">em seu voto</a>, nega a argumentação de Gilmar Mendes de aplicar esse entendimento apenas para futuras legislaturas, o que, na prática, veda a reeleição para aqueles que já se ocuparam o cargo de presidente do Senado ou da Câmara mais de uma vez. Assim, libera apenas a reeleição de Davi Alcolumbre, mas não de Maia, que já ocupa o cargo desde 2017.
O julgamento da ADI, que interfere diretamente na sucessão das mesas do Congresso, deve ser concluído apenas na próxima semana em plenário virtual. Cas algum ministro peça vista ou destaque do tema para o plenário físico, o julgamento seria concluído apenas no próximo ano. Ministros consultados pelo JOTA afirmam que a tendência hoje no tribunal é deixar para a política a solução desta disputa.
<h3>Voto de Gilmar</h3>
O ministro Gilmar Mendes disponibilizou um resumo de seu voto na ação. Leia a íntegra abaixo:
"RESUMO DAS RAZÕES DE DECIDIR – VOTO MGM
As questões jurídicas discutidas na presente ação consistem em saber (i) se a reeleição dos membros das Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal é possível em tese e (ii) se o STF poderia ou não proibir a Câmara dos Deputados e o Senado Federal de reelegerem os membros das respectivas Mesas Diretoras se assim deliberado pelos respectivos órgãos do Poder Legislativo.
Esclarece-se, portanto, que o STF não está a decidir o resultado das próximas eleições às Presidências das Casas Legislativas, matéria que, por óbvio, insere-se na mais absoluta soberania deliberativa dos atores congressuais. O espírito que orienta o presente voto é, como não podia deixar de ser, o de respeito ao princípio da separação de poderes, que constitui pedra angular da República Federativa na Constituição Federal de 1988.
A presente ADI foi ajuizada pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). Na petição inicial, esse partido afirmou que sua pretensão visava velar pelo “teor literal” do artigo 57, § 4º, da Constituição. O PTB requereu então que o STF afastasse “qualquer interpretação” (dos Regimentos Internos da Câmara e do Senado) “que busque ampliar o alcance do dispositivo constitucional em análise”, qual seja o art. 57, § 4º, da Constituição Federal (eDoc. 1, fl. 11).
O presente voto se inicia esclarecendo que, no Direito Comparado, inexiste equivalência entre o princípio republicano e a vedação à relação dos Chefes do Poder Legislativo. Ao contrário, há notável exemplos de 
democracias consolidadas como Estados Unidos, França, Inglaterra e Espanha que desconhecem qualquer limite à recondução dos líderes congressuais.
Além disso, é importante considerar que, ao longo de toda a história republicana brasileira, nosso constitucionalismo destinou ao Poder Legislativo larga autonomia institucional. Foi somente durante os anos de chumbo da Ditadura Militar, com a edição do Ato Institucional n. 16, de 14 de outubro de 1969, que foi imposta a proibição à reeleição dos membros das Mesas das Casas Legislativas. O objetivo do AI nº 16 foi justamente o de obstar o fortalecimento político dos parlamentares que ocupavam as Presidências das Casas e, por conseguinte, aprofundar o processo de enfraquecimento institucional do Congresso Nacional, que se iniciara em 1964. A origem do art. 57, § 4º, da CF espelha os resquícios do autoritarismo que subtraía a independência do Parlamento.
Considerando essa dimensão histórica, o presente voto sustenta que a interpretação do o art. 57, § 4º, da Constituição Federal não deve ser meramente literal. Para que a leitura desse dispositivo esteja em consonância com os princípios constitucional da Separação dos Poderes e da Segurança Jurídica, o Tribunal deve lançar mão de técnica de interpretação conforme à constituição que afaste a produção de resultados extremos inconstitucionais.
A interpretação do art. 57, § 4º requer sua devida harmonização sistemática com o princípio da autonomia organizacional das Casas do Congresso Nacional, do qual já discorremos (artigo 2º, o artigo 51, III e IV, o artigo 52, XII e XIII, todos da Constituição Federal). A formação de Mesa de Casa do Poder Legislativo é matéria cujo o início e o fim não coabitam o fragmento textual final do §4º do art. 57 da Constituição Federal – compreensão, aliás, bem pontuada na manifestação da Advocacia-Geral da União que asseverou: “o texto constitucional não exauriu a disciplina do tema nesse enunciado” (eDoc. 35, fl. 7).
De fato, o campo de incidência material do art. 57, §4º, CF/88 é a organização interna de uma Casa de Leis. Por isso, sua conjugação com o princípio da autonomia organizacional deve sempre perseguir o resultado de garantir às Casas do Congresso Nacional, um espaço de conformação institucional amplo, em direta proporção à elevada exigência de adaptação cobrada das normas de direito constitucional, em especial daquelas direcionadas ao funcionamento de órgão parlamentar.
O Parlamento deve gozar de espaço de conformação organizacional à altura dos desafios postos pela complexidade da dinâmica política. Em verdade, determinadas conjunturas e situações de fato podem não apenas reputar desejável, como também exigir que a vedação à recondução para o mesmo cargo da Mesa possa ser objeto de exceção: desde que assim a Casa do Congresso Nacional repute necessário para fins de preservação de sua autonomia constitucional. Ao mesmo tempo, considerando que a proibição de reeleição não constitui preceito constitucional estruturante, não cabe ao Poder Judiciário interferir no alcance da referida norma. Tal entendimento encontra respaldado na vasta jurisprudência do STF que assenta a insidicabilidade de atos normativos interna corporis.
Por outro lado, é republicana a preocupação que se pode levantar contra a perpetuação de agentes políticos em posições centrais de poder de forma indeterminada. Nesse ponto, entendo que a jurisprudência deste STF precisa evoluir para estabelecer limites claros e objetivos ao exercício da Presidência das casas legislativas, sem, todavia, retirar do Poder Legislativo a sua margem de auto-conformação institucional.
Relembra-se que, no plano federal, a jurisprudência atual do STF admite a recondução (ainda que para o mesmo cargo) às Mesas na passagem de uma legislatura para outra ou quando o primeiro mandato se deu de modo suplementar (mandato-tampão). Em relação às Assembleias Legislativas Estaduais, a jurisprudência da Corte é ainda mais permissiva: permite a recondução sucessiva (sem qualquer limite) dos Presidentes das Casas Legislativas dos Estados. 
O presente voto defende que o Tribunal deve urgentemente evoluir nesses entendimentos. No intuito de demarcar limite objetivo à prática parlamentar da reeleição – prática essa que já existe, embora autorizada por situações que beiram o casuísmo – o presente voto propõe solução assentada em parâmetro objetivo de condição de elegibilidade. Fixa-se que, a partir da presente decisão, os membros das Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal só possam concorrer à reeleição uma única vez.
Esse parâmetro valoriza o impacto sistêmico promovido pela inserção do instituto da reeleição em nosso ordenamento constitucional, pela Emenda Constitucional (EC) n. 16/1997. Como se sabe, referida emenda alterou a redação do § 5º do art. 14 da Constituição Federal de 1988, e nessa condição o seu âmbito material de incidência são os cargos de Presidente da República, Governador e Prefeito. Considerado o redimensionamento que a EC n. 16/1997 implicou no princípio republicano, este serve ao equacionamento da questão constitucional que ora enfrentamos ao fornecer o critério objetivo de 1 (uma) única reeleição/recondução sucessiva para o mesmo cargo da Mesa.
Esse novo entendimento tem potencial de modificar a condição de elegibilidade dos membros do Congresso Nacional. Ocorre que as regras que constrangem o exercício ativo dos direitos políticos não podem ser abruptamente modificadas.
Por isso, apresenta-se como adequado e proporcional ao caso, ainda que por inspiração analógica, a aplicação da jurisprudência construída acerca do art. 16 da Constituição Federal, que traz o princípio da anterioridade ou da anualidade em relação à mudança da legislação eleitoral (mais recentemente: ADI 5.398-MC-Ref, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 9.5.2018).
Assim, por todos esses fundamentos, o presente voto:
(1) reconhece a possibilidade de as Casas do Congresso Nacional deliberarem sobre a matéria em apreço (seja por via regimental, por questão de ordem ou mediante qualquer outro meio de fixação de entendimento próprio à atividade 
parlamentar, como usualmente ocorre), desde que observado, em qualquer caso, o limite de uma única reeleição ou recondução sucessiva ao mesmo cargo;
(2) fixa que o limite de uma única reeleição ou recondução deve orientar a formação das Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal a partir da próxima legislatura, resguardando-se, para aquela que se encontra em curso, a possibilidade de reeleição ou recondução, inclusive para o mesmo cargo."

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JOTA

O ministro Nunes Marques divergiu parcialmente. Pelo seu voto, fica liberada a reeleição apenas de Alcolumbre

Gilmar Mendes: reeleição no Senado e Câmara é questão política

O ministro Nunes Marques, do STF, divergiu e em seu voto fica liberada reeleição apenas de Alcolumbre, no Senado e vetada a de Rodrigo Maia, na Câmara