O Partido Verde (PV) ajuizou nesta segunda-feira (27/2) no Supremo Tribunal Federal (STF) uma ação contra o decreto assinado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) que instituiu o Programa de Apoio ao Desenvolvimento da Mineração Artesanal e em Pequena Escala (decreto 10.966/2022). Na visão do partido, a norma se tornou uma indutora do garimpo em terras indígenas, principalmente na região da Amazônia. O caso será julgado na ADPF 1047.
O decreto diz que a sua finalidade é a de propor políticas públicas e estimular o desenvolvimento da mineração artesanal em pequena escala, com vistas ao desenvolvimento sustentável regional e nacional. Entre os objetivos do programa está o estímulo à formalização da atividade de mineração artesanal e em pequena escala. Entretanto, para o partido, o decreto protege garimpeiros ilegais e dá “aparência de legalidade à extração mineral na região amazônica sem qualquer tipo de controle ou fiscalização, além de submeter a população indígena ao verdadeiro massacre garimpeiro na região amazônica”. Por isso, a legenda entende que é preciso uma liminar suspendendo a norma.
“Veja-se que o diploma impugnado funciona como garante do garimpo ilegal, conferindo legalidade à extração mineral na região amazônica sem qualquer tipo de controle ou fiscalização, além de submeter a população indígena ao verdadeiro massacre garimpeiro na região amazônica, sob o mero argumento de promover o garimpo ‘em pequena escala’”.
De acordo com dados trazidos na petição inicial, a exploração ilegal de ouro e outros metais na Amazônia é um dos principais vetores do desmatamento na região. A taxa de desmatamento ilegal em áreas de extração clandestina de ouro aumentou mais de 90% entre 2017 e 2020, como revela artigo desenvolvido por pesquisadores da Escola Politécnica (Poli) da Universidade de São Paulo (USP) e publicado na revista “Mudança Ambiental Regional”.
O PV traz um levantamento realizado pelo MapBiomas que mostra saltos sucessivos no desmatamento em terras indígenas por atividades de extração ilegal de ouro: em 2016, o desmatamento foi de 58,43 hectares; em 2018 ele já estava em 1.451 hectares; em 2019, a destruição da floresta chegou a 2.975 hectares e, em 2021, o número chegou a 2.409 hectares.
Ainda, de acordo com o documento apresentado no STF, a organização não-governamental Greenpeace Brasil avalia que a usurpação de terras indígenas por posseiros e garimpeiros ilegais é uma questão de saúde pública, porque leva à contaminação das águas dos rios com mercúrio, afetando milhares de pessoas que compõem a população ribeirinha da Amazônia e se alimentam periodicamente de pescados.
Relatoria
Na petição protocolada na Corte, o partido solicita que a ação seja distribuída, por prevenção, à ministra Cármen Lúcia, relatora da ADPF 760. Nesta ação, que discute a execução de programas de proteção da Amazônia pelo governo federal, a ministra já declarou haver um estado de coisas inconstitucional quanto à omissão do Estado brasileiro em relação à função protetiva do meio ambiente ecologicamente equilibrado. O julgamento foi interrompido por um pedido de vista do ministro André Mendonça.
Porém, há chances de a relatoria da nova ação do PV ficar a cargo do ministro André Mendonça, uma vez que ele é relator da ADI 71.07, ação ajuizada pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB) contra decretos editados por Jair Bolsonaro, que preveem medidas de incentivo à atividade mineradora, especialmente na região amazônica. Entre os decretos impugnados está o 10.966/2022, que instituiu o Programa de Apoio ao Desenvolvimento da Mineração Artesanal e em Pequena Escala.
Para o PSB, o decreto é incompatível com o sistema de proteção constitucional ao meio ambiente, na medida em que busca formalizar e incentivar práticas ilegais, que resultam em retrocesso em matéria ambiental. Além disso, o afrouxamento das regras pode impedir a detecção de diversas ilegalidades que envolvem o processo de mineração, como a extração de minérios em terras indígenas, em unidades de conservação ou fora de limites geográficos autorizados.
Na ação do PSB, a Procuradoria-Geral da República (PGR) se manifestou pela improcedência do pedido. No documento anexado nos autos e assinado pelo PGR, Augusto Aras, “não há fragilização da proteção ambiental, pois os atos impugnados não dispensam ou adotam critérios menos rígidos para o licenciamento ambiental e não afastam o controle regulatório da ANM [Agência Nacional de Mineração] e a fiscalização competente dos órgãos federais, estaduais ou municipais, como o Ibama, o ICMBio, a Funai, a Força Nacional de Segurança, Ministérios Públicos, além de outras entidades da sociedade civil”.
A Advocacia-Geral da União (AGU) também se posicionou pela rejeição da ação e do pedido.
Investida contra o garimpo ilegal
O PV também ingressou no STF com a ADI 7.345, que questiona trecho da Lei Federal 12.844/2013 que trata de regras aplicáveis às Distribuidoras de Títulos e Valores Mobiliários (DTVMS) referentes à regularidade da aquisição de ouro produzido em áreas de garimpo.
De acordo com o partido, a lei federal reduz as responsabilidades das DTVMS por irregularidades referentes à origem do ouro da Amazônia, ao possibilitar que as distribuidoras comprem o metal com base no princípio da boa-fé, ou seja, utilizando exclusivamente informações prestadas pelos vendedores.
Para o PV, a medida possibilita o comércio ilegal de ouro na região porque dispensa mecanismos mais rígidos de fiscalização da atividade. Essa ação está sob a relatoria do ministro Gilmar Mendes e foi apensada na ADI 7273, de autoria do PSB.