Márcio Falcão

Ao determinar nesta segunda-feira (19/3) a execução da pena do ex-vice presidente da Engevix Gerson de Mello Almada na Lava Jato, o juiz Sergio Moro fez uma defesa enfática da prisão após condenação em segunda instância e criticou a possibilidade de o Supremo Tribunal Federal rever o entendimento. (<a href="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2018/03/evento-940-despadec1.pdf">leia a íntegra da decisão)</a>
Segundo o juiz, "a presunção de inocência não deve ser interpretada como um véu de ignorância que impede a apreensão da realidade nem como um manto protetor para criminosos poderosos, quando inexistir dúvida quanto a sua culpa reconhecida nos julgamento".
Para o magistrado, colocar em liberdade condenados por crimes graves sem qualquer avaliação dos casos concretos, das provas, ou seja, sem qualquer referência a justiça substantiva do caso, representa conceder "sem a avaliação da prova, a criminosos condenados tempo para buscar prescrição e impunidade, a 
custa da credibilidade da Justiça e da confiança dos cidadãos de que a lei vale para todos."
Moro disse que haverá retrocesso se o Supremo rever a prisão em segunda instância, atingindo não só a Lava Jato.
"Com todo o respeito ao Egrégio Supremo Tribunal Federal, uma eventual alteração seria desastrosa para os avanços havidos recentemente em prol do fim da impunidade da grande corrupção no Brasil, avanços estes, aliás, talvez iniciados de maneira mais incisiva, com o julgamento pelo plenário do Supremo Tribunal 
Federal da Ação Penal 470 em 2012 [mensalão], e que prosseguiram com investigações e ações penais relevantes, incluindo a presente, nos anos seguintes, conforme reconhecido inclusive internacionalmente."
O magistrado cita que na primeira discussão sobre a questão em 2016 o então ministro Teori Zavascki, morto em acidente aéreo em 2o17, foi relator "sendo, de certa forma, a execução provisória da condenação em segunda instância parte de seu legado jurisprudencial, a fim de reduzir a impunidade de graves condutas de corrupção."
"Parte da responsabilidade pela instauração da corrupção sistêmica e descontrolada no Brasil decorre da inefetividade dos processos criminais por crimes de corrupção e lavagem no Brasil e que o aludido precedente da lavra do eminente Ministro Teori Zavascki buscou corrigir. Que o seu legado seja preservado", completou.
Moro disse que a jurisprudência do STF é fundamental, "pois acaba com o faz de conta das ações penais que nunca terminam, nas quais o trânsito em julgado é somente uma miragem e nas quais a prescrição e impunidade são a realidade."
"A presunção de inocência está relacionada à prova, ela tem que ser clara como a luz do dia para a condenação ("probationes in causa criminali luce meridiana clariores esse debent"), e não a efeitos de 
recursos contra julgamentos, o que é ilustrado pelo fato da execução da pena operar-se a partir da condenação em primeira instância nos dois países que constituem o berço histórico do princípio, Estados Unidos e França. Ou seja, nesses países, sequer se espera a confirmação pela Corte de Apelação".
"Assim, a revisão da atual jurisprudência não só comprometeria novas prisões de condenados poderosos em segunda instância por crimes graves, mas afetaria a efetividade de dezenas de condenações pretéritas por corrupção e lavagem de dinheiro em todo o território nacional."
O TRF4 negou embargos de declaração da defesa de Gerson de Mello Almada contra o acórdão nos infringentes no dia 15 de março, na última quinta-feira. A ordem de prisão foi assinada por Sergio Moro nesta segunda-feira (19). Os infringentes foram negados pelo tribunal no dia 25 de janeiro.
Gerson Almada foi condenado por corrupção ativa, lavagem de dinheiro e pertinência a organização criminosa, a penas de 34 anos e 20 dias de reclusão.

1071385-df_img_9850

https://images.jota.info/wp-content/uploads/2021/09/copy-of-jota-logo-high-cmyk.jpeg

JOTA

Para magistrado, mudança do STF vai abalar credibilidade da Justiça e confiança de que a lei vale para todos

Presunção de inocência não deve ser véu de ignorância, diz Moro ao defender 2ª instância

Para magistrado, mudança do STF vai abalar credibilidade da Justiça e confiança de que a lei vale para todos