Em abril, o Supremo Tribunal Federal (STF) continuará a julgar uma série de ações que tratam do desmatamento da Amazônia. O mês terá, no plenário, pautas relevantes sobre diferentes temas, como a ação penal contra o deputado federal bolsonarista Daniel Silveira (União-RJ) e a prevalência do negociado sobre o legislado na esfera trabalhista.
São cinco sessões plenárias previstas para o mês, três das quais há processos pautados. As duas últimas são reservadas para os casos remanescentes de outras datas.
A segunda semana do mês de abril o STF não terá sessões devido à Semana Santa, entre os dias 10 e 16. Já 21 de abril é feriado de Tiradentes — em Brasília, é também o aniversário da cidade e ponto facultativo local.
Apesar de o presidente da Corte, ministro Luiz Fux, divulgar uma pauta antecipada do semestre antes do início dos trabalhos, a depender da conjuntura, de avaliações internas e de processos cuja análise se alonga ou que se apresentam urgentes, ela é revista, como foi o caso da pauta de abril.
Da pauta verde, incluída de última hora na pauta de abril, seis ações são relatadas pela ministra Cármen Lúcia e uma delas está sob responsabilidade da ministra Rosa Weber. Cármen Lúcia deu início à leitura do voto na última quinta-feira (31/3) — depois de as sustentações orais serem feitas na sessão de quarta (30/3), mas chegou apenas à metade. Fux chegou a dizer que o voto da colega é “bíblico”, se referindo ao tamanho do material preparado.
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A ministra aceitou o argumento dos partidos na ADPF 760 e na ADO 54 de que existe um estado de coisas inconstitucional em matéria ambiental no Brasil e que há redução da fiscalização, abandono do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia (PPCDAm) sem a substituição por plano comprovadamente eficiente e eficaz, ausência de cumprimento dos recursos orçamentários, bem como enfraquecimento do quadro normativo ambiental pelas normas infraconstitucionais.
Na segunda metade do mês, a Corte julga a ação penal contra o deputado bolsonarista Daniel Silveira, réu por ameaças ao STF e aos ministros e, ainda, casos trabalhistas de impacto importante tanto para empregadores como para a garantia dos direitos trabalhistas de trabalhadores mas, também, para a própria Justiça do Trabalho. Confira abaixo a pauta do plenário do STF em abril:
6 de abril
Pauta verde
ADPF 760
Seis partidos e 10 organizações da sociedade civil ajuizaram no Supremo uma ação preparada ao longo de quatro anos para pleitear a retomada do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia (PPCDAM). O plano, criado em 2004, continua em vigor, segundo a legislação. Mas, de acordo com os responsáveis pela ação, a administração federal estimula desmates e queimadas por meio de um conjunto de ações e omissões que, na prática, paralisaram o PPCDAM.
A ação, relatada pela ministra Cármen Lúcia, exige, por exemplo, que o desmatamento na Amazônia seja reduzido ao patamar de 3.925 km² até 2021, o que já deveria ter ocorrido em 2020, segundo a Política Nacional sobre Mudança do Clima (Lei n.º 12.187/2009). A meta significa uma redução de cerca de 60% em relação à taxa oficial de desmatamento de 2019-2018 apurada pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), que foi de 10,1 mil km2 .
A ação inclui questionamentos contra o Ministério do Meio Ambiente e órgãos federais como Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e Fundação Nacional do Índio (Funai).
ADO 54
A Rede Sustentabilidade aponta a omissão inconstitucional do presidente da República Jair Bolsonaro (PL) e do então ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles em coibir o avanço do desmatamento na Amazônia. Na ação, o partido pede a concessão de medida cautelar para que as autoridades que promovam ações concretas no sentido de impedir o avanço do desmatamento na região.
Para a Rede, também cabe ao chefe do Executivo e da pasta do Meio Ambiente conscientizar a população sobre o tema. Mas, ao contrário, ambos vinham, “em todas as suas declarações”, fazendo “pouco caso do meio ambiente ou do desmatamento extensivo da Amazônia”. Assim, eles evitavam adotar qualquer tipo de ação no sentido de proteger a floresta Amazônica e, quando confrontados com os alertas, alegavam que a sistemática dos alertas é que deveria ser mudada.
ADO 59
A ministra Rosa Weber é a relatora deste caso. Ajuizada por quatro partidos políticos (PSB, PSOL, PT e Rede), a ação alega a omissão da União em relação à paralisação do Fundo Amazônia e do Fundo Nacional sobre Mudança do Clima (Fundo Clima). Segundo eles, a União está deixando de disponibilizar R$ 1,5 bilhão, já em conta, que legalmente devem ser desempenhados para financiar projetos de preservação na Amazônia Legal.
Aqui, mais uma vez, se quer saber se houve omissão inconstitucional do poder público quanto à implementação das obrigações de proteção da área compreendida como Amazônia Legal. As siglas, em conjunto, alegam que a omissão da União atinge outros entes da Federação, sobretudo os integrantes da Amazônia Legal, que dependem de recursos represados para financiarem projetos que caminhem no sentido do artigo 225, que trata do direito constitucional a um meio ambiente ecologicamente equilibrado.
ADPF 735
Também relatada por Cármen Lúcia, a ADPF 735 se opõe contra o Decreto 10.341/2020 e a Portaria 1.804/2020 do Ministério da Defesa, que teriam retirado a autonomia do Ibama como agente de fiscalização, ao atribuir a coordenação da Operação Verde Brasil 2 ao Ministério da Defesa. Os atos teriam contribuído com um desmonte da política ambiental brasileira, ao promover “verdadeira militarização”, “em flagrante confronto aos ditames constitucionais e usurpando competências dos órgãos de proteção ambiental”.
De acordo com a ação, sem histórico de atuação no combate ao desmatamento ilegal e dos focos de incêndio — por serem funções estranhas ao rol de competências das Forças Armadas —, a Operação Verde Brasil 2 apresenta pouca efetividade, ao passo que, os número relativos à destruição da Amazônia Legal continuam a aumentar, sinalizando mais um ano de retrocesso na preservação do bioma Amazônia. Além disso, o Partido Verde afirma que criou-se uma hierarquia desconhecida no ordenamento jurídico brasileiro, que dá autoridade às Forças Armadas para proibir atos de poder de polícia ambiental.
ADPF 651
Nesta ação, a Rede Sustentabilidade se coloca contra o Decreto 10.224/2020, que, ao regulamentar a lei que institui o Fundo Nacional do Meio Ambiente (Lei 7.797/1989), exclui a participação da sociedade civil do seu conselho deliberativo, o que retira da instância a sua razão de ser. Segundo a Rede, a mudança afeta diretamente o princípio da participação popular direta na elaboração de políticas públicas de proteção ao meio ambiente, previsto no texto constitucional. O partido argumenta ainda que o decreto, ao fazer isso, reduz o âmbito de proteção normativa do direito ao meio ambiente, ofendendo o princípio da vedação do retrocesso institucional.
O partido explica que o conselho deliberativo do FNMA era composto de 17 representantes, sendo nove de organizações governamentais e oito da sociedade civil, o que garantia o controle social na execução de recursos públicos destinados a projetos socioambientais em todo o território nacional. A alteração promovida pelo decreto eliminou completamente do órgão a participação de representantes da sociedade civil que atuam na área ambiental, resultando em disparidade representativa em relação aos demais setores sociais representados.
Aponta, por fim, ofensa a norma internacional, visto que “no âmbito da RIO-92, o Brasil assinou uma série de documentos internacionais em que se obrigava a respeitar uma série de princípios de proteção ambiental e desenvolvimento sustentável, reconhecendo o direito ao meio ambiente saudável como um direito humano e a importância da participação popular na definição de diretrizes e políticas ambientais”.
O presidente da República defendeu que a reestruturação dos órgãos administrativos constitui ato de natureza política e que não se pode presumir que a reorganização administrativa, pura e simplesmente considerada, cause prejuízo às missões conferidas ao Estado brasileiro pelo texto da Constituição Federal”. Entende que a “composição do Conselho Deliberativo do FNMA jamais se escoraram em lei formal, mas tão-somente em atos infralegais”.
ADI 6.148
O procurador-geral sustenta que a Resolução Conama 491/2018 não regulamenta de forma minimamente eficaz e adequada os padrões de qualidade do ar, deixando desprotegidos os direitos fundamentais à informação ambiental, ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, à saúde e, consequentemente, à vida.
O principal argumento da PGR é de que a resolução confere a proteção insuficiente aos direitos à informação, à saúde e ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Apesar de pedir a declaração de inconstitucionalidade do ato, a PGR não requer a nulidade dele, mas que a Corte obrigue o Conama a reformular a norma em até 24 meses, nos moldes apontados.
ADI 6.808
Na ADI 8.808, o PSB questiona alterações feitas, por meio de medida provisória, em lei sobre a Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios (Redesim). Segundo a sigla, a medida prevê a concessão automática, sem análise humana, de alvará de funcionamento e licenças, inclusive ambientais, para empresas enquadradas em atividade de grau de risco médio, além de impossibilitar que os órgãos de licenciamento solicitem informações adicionais.
A Redesim foi instituída por meio da Lei 11.598/2017 para simplificar o processo de abertura ou regularização de empresas. A rede integra órgãos de registro civil, administrações tributárias e órgãos licenciadores do Meio Ambiente, Vigilância Sanitária e Corpo de Bombeiros. Segundo o PSB, empresas consideradas de “baixo risco” são dispensadas da etapa de licenciamento, mas as que expõem seus colaboradores a riscos regulares precisam obter as autorizações por meio de visitas presenciais.
Ao modificar os artigos 6º e 11-A, inciso II, da Lei do Redesim, a Medida Provisória 1.040/2021, além de liberar o licenciamento sem análise humana, impossibilitou que os órgãos licenciadores solicitem informações adicionais às informadas pelo sistema. Com isso, o partido sustenta que empresas ficaram dispensadas de apresentar licenças atividades como transferência de carga de petróleo e derivados em alto-mar, exploração econômica da madeira ou lenha e subprodutos florestais e fabricação de fertilizantes e agroquímicos.
7 de abril
Lei dos Caminhoneiros — ADI 5.322
Outro tema que volta à pauta do STF é a ação da CNTT contra a chamada Lei dos Caminhoneiros. A ADI 5.322 foi apresentada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes Terrestres (CNTTT) para contestar a Lei 13.103/2015, que lhes teria retirado direitos previstos na CLT e no Código de Trânsito Brasileiro (CTB).
Seis anos depois de ter sido ajuizada, a ADI voltou à pauta, no pleno virtual, de 25 de junho a 2 de agosto do ano passado. Alexandre de Moraes, relator do caso, votou dando razão à CNTTT. Porém, o julgamento virtual foi interrompido.
Na ADI 5.322, a CNTTT mira, especialmente, os seguintes pontos da “Lei dos Caminhoneiros”: a redução dos horários de descanso e de “alimentação intrajornada”; a exigência de exames toxicológicos quando da habilitação e renovação da carteira de habilitação (CNH), que seria discriminatória.
A favor dos autores, a PGR se manifestou nos autos no sentido de que a “Lei dos Caminhoneiros” causa “retrocesso social aos direitos desses trabalhadores, prejudica sua saúde física e mental, e cria riscos excessivos para todos os usuários de rodovias”. O MPF apoia ainda o questionamento de a lei ter permitido que motoristas sejam remunerados em função da distância percorrida, do tempo de viagem ou da natureza e da quantidade de produtos transportados. De acordo com o parecer da PGR, “essa norma estimula extensão excessiva da jornada de motoristas profissionais, o que leva à fadiga e eleva o risco de acidentes, para eles próprios e para os demais usuários da rodovia”.
20 de abril
Caso Daniel Silveira — AP 1.044
Nos últimos dias de março, foi definido que em 20 de abril será julgada a ação penal contra o deputado federal bolsonarista Daniel Silveira (União-RJ). O julgamento estava inicialmente agendado para maio. A antecipação ocorreu diante da recusa do parlamentar em cumprir decisão do relator do caso, ministro Alexandre de Moraes, para que ele passe a usar tornozeleira eletrônica. Silveira decidiu, então, não deixar a Câmara dos Deputados, sob o entendimento de que o ambiente é inviolável. Ele chegou a dormir no gabinete.
O deputado se tornou réu no STF em 28 de abril do ano passado, depois de ter sido preso em flagrante, por decisão de Moraes, no âmbito do inquérito dos atos antidemocráticos, por ter divulgado vídeo com ameaças contra a Corte e os integrantes dela. A denúncia foi apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) depois que o plenário manteve, por unanimidade, a prisão do deputado.
Validade de norma coletiva de trabalho — ARE 1.121.633/ Tema 1046
No mesmo dia, um tema que é considerado um dos mais importantes da seara trabalhista no STF: aquele que discute discute a validade de norma coletiva de trabalho que suprimiu direitos relativos às chamadas horas in itinere, tempo gasto pelo trabalhador em seu deslocamento entre casa e trabalho.
Relatado por Gilmar Mendes, o ARE 1.121.633 é anterior à reforma trabalhista de Michel Temer, mas é tido como central para as alterações da CLT porque tem como pano de fundo o debate sobre se o acordado deve prevalecer sobre o legislado.
Ele trata da supressão do pagamento das horas in itinere – tempo de deslocamento entre a residência do funcionário e seu local de trabalho, quando de difícil acesso – em acordo coletivo, em troca de outros benefícios. A decisão do Supremo neste caso vai impactar diretamente as possibilidades de arranjos e de direitos trabalhistas.
Em julho de 2019, Mendes suspendeu todos os processos em tramitação em instâncias inferiores relacionados à matéria. Atualmente, de acordo com dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), há mais de 64,2 mil processos paralisados – é possível que o número seja ainda maior, já que o órgão compila os dados que recebe dos tribunais. No TST, são 24,8 mil casos. E apenas no TRT3, de Minas Gerais, 14,5 mil.
No STF, o caso foi pautado pela primeira vez em dezembro de 2019, mas não chegou a ser julgado. Entrou e saiu de pauta algumas vezes e chegou a ter julgamento iniciado em plenário virtual, mas a ministra Rosa Weber pediu destaque, e o processo será reiniciado presencialmente. Na ocasião, o relator havia votado no sentido de que os acordos e convenções coletivas devem ser observados, ainda que afastem ou restrinjam direitos trabalhistas, independentemente de compensação destes direitos na negociação coletiva. Pelo voto do ministro, apenas os direitos previstos na Constituição não podem ser negociados.
Acordo coletivo de trabalho — ADPF 381
Também sob relatoria do ministro Gilmar Mendes, outra ação em pauta é a ADPF 381, na qual a Confederação Nacional do Transporte (CNT) questiona decisões do TST e de Tribunais Regionais do Trabalho que declararam inválidos dispositivos de convenções coletivas pactuadas entre transportadoras e motoristas e condenaram os empregadores ao pagamento de horas extras e de horas trabalhadas em dias de descanso antes da vigência da Lei 12.619/2012, que disciplinou os direitos e deveres dos motoristas profissionais.
O relator concedeu medida cautelar para suspender todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre a aplicação do artigo 62, inciso I, da CLT aos motoristas profissionais externos do setor de transporte de cargas, justamente pela similaridade da discussão feita no tema anterior. Antes, ele havia indeferido a ação, por entender que não houve alteração jurisprudencial contrária a princípios constitucionais nem controvérsia judicial relevante sobre a aplicação do preceito fundamental. Diante de recurso da entidade, o ministro reconsiderou a decisão e aplicou o rito abreviado à ação.
ICMS sobre assinatura básica de telefone — RE 912.888
Ainda em 2016, o STF autorizou Estados a cobrar ICMS sobre assinatura mensal de telefonia, fixando a tese de que o ICMS incide sobre a tarifa básica de telefonia mensal cobrada pelas concessionárias de telecomunicações independente da franquia de minutos conferida ao usuário. A verba é exigida pelas teles para manter a linha à disposição do usuário, e não inclui franquia de minutos de ligação. Agora, estão na pauta embargos de declaração apresentados pela Oi e pelo Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e de Serviço Móvel Celular e Pessoal (Sinditelebrasil).
Empresa e entidade tentam, com os recursos, diferenciar a figura da assinatura básica mensal do que atualmente seria praticado pelo mercado e, assim, excluir a assinatura de planos alternativos da incidência do ICMS, por se tratar de serviço acessório.
Em abril de 2018, o relator, ministro Alexandre de Moraes, rejeitou os pedidos, mas o julgamento foi interrompido por vista de Luiz Fux.