Ana Pompeu

Marco Aurélio, decano do Supremo Tribunal Federal (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/stf">STF</a>) até a última segunda-feira (12/7), quando se aposentou, é conhecido por posições firmes que manteve em alguns tópicos, durante a trajetória na Corte. Um novo integrante no tribunal sempre altera, de alguma forma, a dinâmica da composição. Uma das formas de observar esse movimento é pelos votos que o sucessor -- possivelmente o advogado-geral da União, André Mendonça, cujo nome já foi enviado ao Senado pelo presidente -- dará nos casos que herdar. O novo ministro terá em seu acervo casos com temas diversos como: perda de direitos políticos por improbidade, bloqueio de cidadão no instagram pessoal do presidente, além de casos tributários de impacto.
O decano costumava ser o ministro mais resistente à ampliação do plenário virtual. Apesar de ressaltar a sobrecarga de trabalho, defendia que o jurisdicionado poderia ser prejudicado em caso de perda de qualidade dos julgamentos, pela ausência de debate. A pandemia acelerou a ampliação do ambiente virtual. Ele próprio passou a pautar vários de seus casos para julgamento remoto, antes que saísse da Corte. 
<a href="https://www.jota.info/produtos/poder?utm_source=Banner%20site&amp;utm_medium=Artigos&amp;utm_campaign=CTA_Poder_materias"><img class="size-medium wp-image-292717 aligncenter" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/01/jota-pro-poder.jpg" alt="" width="688" height="688" /></a>Em outubro do ano passado, ao negar um pedido de destaque de um advogado, quando o processo é retirado do virtual e reiniciado no presencial, o ministro desabafou. "Ante o acúmulo de processos, no Pleno, aguardando pauta dirigida, cheguei a ter cerca de 150 liberados. Este o foi em 29 de setembro último. O quadro levou-me a dizer, na bancada, que já sabia o título do livro a publicar em julho de 2021, após a aposentadoria compulsória: Os votos que não proferi!", afirmou. 
Ele ressaltou, ainda, que foi "a pandemia, o isolamento, a não realização de sessões presenciais" que o fez acionar o sistema virtual. Mas as sessões por videoconferência têm a mesma questão da falta de tempo. "O tempo não é otimizado. Aprecia-se, por sessão, pequena quantidade de processos, na maioria das vezes, se tanto, dois. A jurisdição não pode ficar paralisada. O meio ágil de implementá-la, em Colegiado, hoje, é o eletrônico."
Apesar da mudança de posição em relação ao ambiente virtual, por força das circunstâncias, o ministro acabou por sofrer revezes. Além de casos que não tramitaram rápido o suficiente para serem concluídos antes da saída dele, ainda houve aqueles em que o voto já dado pode ser desconsiderado, porque tiveram destaque de colegas para levar os casos ao presencial — ou videoconferência — o que não acontecia antes da ampliação de competência do plenário virtual. 
Isso não fez com que o decano decidisse pouco. Foram 265.225 decisões nos 31 anos e 21 dias na Corte. O gabinete do ministro tem um acervo de 1.550 processos, que serão herdados pelo sucessor dele. Do total, 76,6%, ou 1.187, são originários e 23,4% são recursos. 
Se divididos por ramo do direito, os processos de Direito Administrativo e Público somam 467 do acervo, os criminais são 447, os Tributários são 220, os de Direito Processual Civil e do Trabalho, 187 e os Trabalhistas, 119. Há, ainda, aqueles categorizados pelo STF como "questões de alta complexidade e grande repercussão", que são 25. Além de alguns de Direito Internacional, Militar, do Consumidor. 
A pauta da 1ª Turma, da qual fazia parte, era quase sempre repleta de habeas corpus de relatoria dele. Os habeas corpus ainda são o segundo grupo com maior número no acervo deixado pelo ministro. São 263, no total. As reclamações são 353. Segundo o gabinete do ministro, não fica nenhum recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida. 
<h3>Os casos que ficam para o novo ministro</h3>
Dos casos que serão de responsabilidade do ministro que ocupar a vaga de Marco Aurélio, alguns se destacam. O sucessor dará continuidade à tramitação do caso que decidirá sobre a constitucionalidade da previsão de perda de direitos políticos na Lei de Improbidade Administrativa, por exemplo. Desde o ano passado, com os incêndios florestais recordes na Amazônia e no Pantanal, partidos pediram que o STF imponha a criação de um plano de prevenção. 
Para evitar perder o trabalho já feito, o <a href="https://www.jota.info/stf/do-supremo/marco-aurelio-pede-a-fux-para-manter-votos-ja-dados-por-ele-no-plenario-virtual-07072021" target="_blank" rel="noopener noreferrer">decano fez um pedido ao presidente da Corte, Luiz Fux</a>, para que os votos já dados por ele em casos destacados do plenário virtual não sejam desconsiderados depois de sua aposentadoria. Com a proximidade da aposentadoria, o decano apresentou voto e pautou casos importantes para o julgamento virtual.
Caso Fux não atenda o pedido do decano, seriam desconsiderados os votos de Marco Aurélio a favor da edição de lei para taxar grandes fortunas, contra o monopólio dos serviços postais pelos Correios, impondo a obrigatoriedade de a Ordem dos Advogados do Brasil (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/oab" target="_blank" rel="noopener noreferrer">OAB</a>) prestar contas ao Tribunal de Contas da União (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/tcu" target="_blank" rel="noopener noreferrer">TCU</a>) e determinando que o presidente Jair Bolsonaro deve desbloquear um advogado no Instagram.
Confira os principais casos do acervo de Marco Aurélio ao sucessor: 
<h3>Grandes fortunas</h3>
Se o plenário do STF se alinhasse ao ministro <a href="https://www.jota.info/stf/do-supremo/marco-aurelio-aposentadoria-votos-17062021" target="_blank" rel="noopener noreferrer">Marco Aurélio</a>, seria declarada a omissão do Congresso Nacional em criar imposto sobre grandes fortunas. O plenário julgaria o tema, da ação direta de inconstitucionalidade por omissão (ADO) 55, apresentada pelo PSOL, na última semana de abertura do ambiente virtual do primeiro semestre do ano, a partir do dia 25 de junho. Mas não houve tempo para saber o desfecho.
O decano votou para <a href="https://www.jota.info/tributos-e-empresas/tributario/stf-marco-aurelio-reconhece-omissao-do-congresso-em-taxar-grandes-fortunas-17062021" target="_blank" rel="noopener noreferrer">declarar a omissão do Congresso Nacional em criar o imposto sobre grandes fortunas</a>. Ele afirmou que o imposto seria “capaz de promover a justiça social e moralização das fortunas”, sem fixar prazo para o Congresso suprir a omissão. No mesmo dia, o ministro Gilmar Mendes destacou o tema. Só o relator votou.
Marco Aurélio aponta, no voto, que o Imposto sobre Grandes Fortunas está previsto desde a promulgação da Constituição de 1988, havendo o constituinte conferido à lei complementar a regulamentação. “De todos os tributos ordinários disciplinados no texto constitucional, é o único não implementado”, diz. Ao não fixar prazo, no entanto, o ministro argumenta que não cabe ao Supremo determinar prazo voltado à atuação do Legislativo.
Para o ministro, a grave crise econômica revelada pelo déficit persistente das contas públicas dos entes federados, potencializada em decorrência da pandemia da Covid-19, constitui obstáculo ao cumprimento de objetivos constitucionais, como a erradicação da pobreza e a garantia do desenvolvimento nacional.
Nesse cenário, diz Marco Aurélio, o imposto sobre grandes fortunas é “mecanismo apto ao aumento da arrecadação, estimulando a promoção das metas buscadas pelo constituinte, ao mesmo tempo que diminui os impactos da crise sobre os menos favorecidos”. Por isso, entende que há inconstitucionalidade na conduta omissiva do Congresso Nacional.
Na petição inicial, o PSOL cita pesquisa da organização britânica Urbach Hacker Young International Limited segundo a qual o Brasil cobra 32% a menos de impostos sobre grandes fortunas em comparação aos demais países do G7.
O STF já negou ação similar em 2018, mas por uma questão processual, sem análise de mérito. Naquele caso (ADO 31), de relatoria do ministro Alexandre de Moraes, o entendimento do plenário foi o de que o governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), não tinha legitimidade para propor a ação.
<h3>Monopólio dos Correios </h3>
Na ADPF 70, que trata do monopólio dos serviços postais, o destaque foi feito pelo ministro Nunes Marques. O tema também está em debate no Congresso. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), incluiu a proposta que quebra o monopólio dos Correios na pauta desta quarta do plenário da Casa — mas ainda não há consenso sobre o tema. Neste caso, Marco Aurélio diz que é “necessária a reestruturação” do setor de logística postal, para “priorizar investimentos nas evoluções tecnológicas”, votando, assim, para <a href="https://www.jota.info/stf/do-supremo/stf-marco-aurelio-vota-para-derrubar-monopolio-dos-correios-04122020" target="_blank" rel="noopener noreferrer">declarar inconstitucional o monopólio dos Correios nos serviços postais no Brasil</a>.
<h3>Contas da OAB</h3>
Outro tema importante, a obrigatoriedade de a OAB prestar contas ao TCU é julgada no recurso extraordinário (RE) 1.182.189, e o relator, o ministro <a href="https://www.jota.info/stf/do-supremo/marco-aurelio-votara-para-que-oab-seja-submetida-a-fiscalizacao-do-tcu-29092020" target="_blank" rel="noopener noreferrer">Marco Aurélio Mello, votou no sentido de que a OAB deve se submeter à fiscalização do TCU</a>. Já o ministro Edson Fachin apresentou divergência, entendendo que a OAB não pode ser obrigada a prestar contas ao TCU nem a qualquer outra entidade externa. O julgamento foi suspenso por pedido de destaque do ministro Ricardo Lewandowski em outubro de 2020 e aguarda pauta nas sessões por videoconferência.
Para o decano, "o Tribunal de Contas fiscaliza não apenas órgãos e entidades federais, ou seja, pertencentes à estrutura do Poder Público, mas também particulares, justificada a atuação, no tocante a esses últimos, quando em jogo 'bens e valores públicos'. Basta a natureza de 'coisa pública' dos recursos para 
estar configurada a sujeição ao controle”.
Marco Aurélio entende a Ordem como uma autarquia, "tendo em vista as atribuições corporativas, e, como o são os conselhos de fiscalização. A atividade desenvolvida não se volta à satisfação apenas da categoria. Daí o dever de prestar contas”.
<h3>O Instagram do presidente </h3>
Para o ministro Marco Aurélio Mello, também, <a href="https://www.jota.info/stf/do-supremo/stf-marco-aurelio-vota-para-que-bolsonaro-desbloqueie-advogado-no-instagram-13112020" target="_blank" rel="noopener noreferrer">não cabe ao presidente da República, Jair Bolsonaro, “avocar o papel de censor de declarações em mídia social”</a> ao bloquear perfis de usuários. O ministro votou pelo provimento de um mandado de segurança, para determinar que Bolsonaro desbloqueie o perfil de um advogado no Instagram. O tema começou a ser julgado em plenário virtual em novembro do ano passado, no âmbito do MS 37.132.
Era é a primeira vez que o plenário do STF julgava se o presidente da República pode ou não bloquear usuários nas redes sociais, bem como qual é o caráter dos perfis de Bolsonaro nas redes sociais: se é pessoal ou se é um meio de comunicação oficial. Nunes Marques interrompeu o julgamento.
<h3>Queimadas</h3>
PT e Rede Sustentabilidade pediram à Corte que determine ao governo federal a apresentação de um plano de prevenção e combate aos incêndios no Pantanal e na Amazônia. A fim de instruir o processo, o ministro requisitou informações às partes. No pedido, o partido defende que deve ser reconhecido o “estado de coisas inconstitucional” da gestão ambiental brasileira, decorrente de condutas comissivas e omissivas do Poder Público no tratamento da questão, sobretudo nos dois biomas, em ofensa ao direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, à proteção constitucional à vida, à saúde e à integridade física.
As ações foram apresentadas ao tribunal em setembro do ano passado. Não tramitaram muito. Diante da relevância da matéria e do risco da causa, o relator decidiu submetê-las diretamente ao pleno, e pediu informações às autoridades e incluiu os estados brasileiros no feito. As ADPFs 743 e 746 aguardam, então, parecer do PGR, Augusto Aras.
Há 10 dias, ADPF 857 foi distribuída por prevenção ao decano, ainda que ele não estivesse mais recebendo processos pela proximidade da aposentadoria. Com o período de seca no meio do ano, PSOL, PSB, PT e Rede Sustentabilidade argumentam que há risco iminente de ampliação de grave dano ambiental no país, em razão das grandes queimadas nessa época do ano.
<h3>Perda de direitos políticos por improbidade</h3>
A ADI 6.678 questiona a constitucionalidade da sanção de suspensão de direitos políticos prevista na Lei de Improbidade Administrativa (Lei n. 8.426/1992) para todo e qualquer ato de improbidade, a critério do magistrado. Também nesta ação, apresentada pelo PSB, o relator decidiu levar a discussão ao plenário. A ação foi distribuída ao ministro Marco Aurélio por prevenção, pois relatou a ADI 4.295, julgada improcedente pelo plenário, em 2010. Nesta, o PTN alegava que todo o texto da lei seria inconstitucional por vício formal.
O partido pretende que a suspensão dos direitos políticos se restrinja aos atos dolosos e que seja excluída a expressão “suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos”. Segundo argumenta, a previsão é desproporcional por tratar de forma semelhante casos em que houve a intenção de cometer o ato de improbidade e aqueles em que, por alguma razão, tenha havido mero atraso numa prestação de contas, por exemplo. Para o partido, a perda dos direitos políticos é "sanção excepcionalíssima", somente autorizada nos casos de atos dolosos de improbidade administrativa que configurem lesão ao erário e enriquecimento ilícito.
<h3>Precatórios</h3>
As ADIs 6.804 e 6.805, recentemente ajuizadas pela OAB, questionam preceitos da Emenda Constitucional (EC) 109/2021, envolvendo prorrogação do prazo para pagamento de precatório e linha de crédito para pagamento. De acordo com a EC 109/2021, os entes da federação têm até 31 de dezembro de 2029 para pagar os débitos, atualmente estimados em mais de R$ 100 bilhões, conforme a OAB.
A entidade sustenta que o artigo 2º do texto, ao alterar a redação do parágrafo 4º do artigo 101 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), revogou linha de crédito especial concedida pela União aos entes devedores e que o STF já se manifestou sobre a inconstitucionalidade da moratória na quitação dos débitos judiciais da Fazenda Pública.
Segundo a OAB, a situação dos entes da federação “beira o insustentável”, diante do tamanho da dívida e das sucessivas postergações que vêm ocorrendo há mais de 30 anos, “a partir de um círculo vicioso e em flagrante prejuízo aos credores públicos”. Na avaliação da Ordem, a medida "não resolve o problema, mas o intensifica, tendo em vista que os juros de mora ampliam cada vez mais a dívida".
Marco Aurélio acionou o artigo 12 da Lei das ADIs e remeteu as ações ao julgamento definitivo pelo plenário.
<h3>Atividade militar</h3>
Já a ação que pede a definição de atividade militar foi destacada do plenário virtual pelo ministro Luís Roberto Barroso. Ela entrou na previsão para o próximo semestre da pauta montada por Fux. Foi incluída na pauta de 6 de outubro a retomada do julgamento da ADI 5.032, que questiona a inserção, na competência da Justiça Militar, do julgamento de crimes cometidos no exercício das atribuições subsidiárias das Forças Armadas em operações para garantia da lei e da ordem (GLO) e de combate ao crime. A análise havia sido suspensa por pedido de vista do ministro Luís Roberto Barroso.

marco aure

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JOTA

Ministro deixou a Corte na segunda e pediu a Fux para não descartar votos de casos destacados do plenário virtual

Os casos deixados de herança por Marco Aurélio ao sucessor

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