
O ministro Alexandre de Moraes votou, nesta quarta-feira (20/4), para que o deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ), perca o mandato, tenha os direitos políticos suspensos, e seja condenado em regime fechado em 8 anos e 9 meses pelos crimes de ameaça às instituições, à democracia e aos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) nas redes sociais. No entanto, o relator absolveu o parlamentar em relação ao crime de incitação de animosidade entre as Forças Armadas e as instituições civis ou a sociedade. Moraes ainda determinou o pagamento de uma multa estimada em R$ 192,5 mil acrescida de correções.
Em seu voto, Moraes refutou o argumento de que a ação penal viola a liberdade de expressão, o devido processo legal e de que as críticas foram sátiras e não são contrárias ao Estado democrático ou contra os ministros. “Não vejo nada de jocoso nas manifestações”, afirmou, completando: “A liberdade de expressão prevista na Constituição deve ser exercida com responsabilidade, não como escudo protetivo para atividades ilícitos, para discurso de ódio”.
O relator ainda afirmou que o parlamentar tem usado o seu mandato para descumprir as medidas judiciais: “O réu usou o mandato de parlamentar como escudo protetivo. Ele usou o parlamento como esconderijo”, afirmou Moraes, alegando ainda que Silveira “tratou a justiça comum como nada” ao desrespeitar as medidas cautelares.
Para ele, a conduta de Silveira é desajustada com o seu papel de deputado, uma vez que só existe Parlamento livre em Estado democrático de direito. Portanto, ele deveria zelar pelo Estado de direito e harmonia de poderes.
Para Moraes, não se pode acolher a tese de que o parlamentar é totalmente livre em face da imunidade parlamentar: “Este mesmo plenário (28/4/2021) recebeu, por unanimidade, a denúncia da PGR contra o deputado, considerando que havia mesmo indícios de autoria e materialidade necessários para seu recebimento”.
O revisor da ação, ministro Nunes Marques, absolveu o parlamentar de todas as acusações feitas pela PGR. Na visão do ministro, embora a linguagem do deputado seja imprópria e sem o devido decoro, ele não vê crime na conduta. “O que se vê são bravatas que, de tão absurdas, jamais serão concretizadas”, afirmou.
Ainda no início da sessão, o presidente do STF, Luiz Fux, afastou o pedido da defesa do parlamentar que solicitou a suspeição de 9 dos 11 ministros, dizendo que apenas Nunes Marques e André Mendonça – indicados pelo presidente Jair Bolsonaro – estariam aptos para julgar o parlamentar de forma imparcial.
PGR pede condenação de Silveira
A vice-procuradora da República, Lindôra Araújo, em sustentação oral, pediu a condenação do réu nos crimes de emprego de violência ou grave ameaça de abolição do Estado democrático de direito e por usar a violência ou grave ameaça contra autoridade.
“Atacar as instituições do Estado é pôr em xeque a subsistência do regime constitucional e a segurança geral dos cidadãos”, afirmou. “O presente processo penal de conhecimento não constitui juízo de exceção, e a própria imunidade parlamentar não é exceção aos deveres e valores do Estado de Direito. A vida do Estado é a vida de suas instituições”, complementou.
Durante a sustentação oral, ela disse ser “inconcebível num Estado Democrático de Direito que alguém instigue que, nos dizeres do réu: “o povo entre dentro do STF, agarre o Alexandre de Moraes pelo colarinho dele e sacuda a cabeça de ovo dele e o jogue dentro de uma lixeira”. Neste momento, ela e o próprio Moraes riram da frase.
Defesa falou em liberdade de expressão
Paulo Faria, advogado de defesa, argumentou em sustentação oral que as frases de Daniel Silveira estão dentro da liberdade de expressão de um parlamentar. Além disso, questionou o fato de que os próprios ofendidos são os julgadores e que não há possibilidade de recursos.
Segundo ele, as falas são jocosas e expressões populares. “Surra com gato morto é jargão popular, não é desejo. Não teve surra. Nem ironia pode mais desferir?”, perguntou, completando: “O parlamentar disse: ‘Coloquei as forças armadas para intervir no STF?’ Foi uma pergunta, não uma afirmação, ele não convocou as Forças Armadas. Foi uma pergunta e foi respondendo de acordo com o que foi perguntado por seus eleitores”.
Faria ainda disse que a defesa foi cerceada, assim como o devido processo legal: “Não está ocorrendo respeito à defesa. Tudo que pede é indeferido. Tudo que a PGR pede é deferido”.
O advogado afirmou ainda que Daniel Silveira não está conseguindo cumprir seu mandato parlamentar porque não pode comparecer a eventos e só pode transitar entre o Rio de Janeiro, seu local de origem, e Brasília, onde está o Congresso.
A defesa do deputado destacou, mais uma vez, que o mandato parlamentar é exercido 24 horas por dia. E que “as redes sociais são uma extensão do mandato”. Faria afirmou que o deputado teve os seus direitos constitucionais suprimidos. A seu ver, a Câmara teria de deliberar até sobre a manutenção das tornozeleiras que o parlamentar continua a usar obrigatoriamente.
Chegando ao final, o advogado procurou responder aos argumentos do Ministério Público. Afirmou que esta ação penal é um “marco negativo” do sistema penal no Brasil. Pode ter havido calúnia ou difamação, mas nunca um “crime de ameaça”. Disse que a LSN era um “lixo” do regime militar, e que não existe mais e que o Estado está punindo por opinião um parlamentar.
Clima de tumulto e animosidade
Em clima de tumulto e animosidade, os ministros do Supremo começaram o julgamento com 1h30 de atraso, por causa da resistência do advogado do deputado, Paulo César Rodrigues de Faria, em fazer o teste de Covid-19, uma vez que ele não apresentou o comprovante de vacinação. A exigência está na resolução 764/2022 da Corte. O Supremo chegou a oferecer que a sustentação oral fosse feita por videoconferência, mas o advogado se negou. Por fim, o advogado aceitou fazer o teste e a sessão atrasou porque foi necessária a espera do resultado.
O presidente do STF, Luiz Fux, determinou que a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) seja oficiada para investigar a conduta do advogado. No início da sessão, Fux disse que houve atraso “por recalcitrância indevida do advogado da parte”. De acordo com o advogado, ele machucou as narinas em janeiro e, por isso, não queria fazer o teste.
Logo no início da tarde, o próprio deputado Daniel Silveira, réu da ação penal, em companhia do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-RJ) foram impedidos de assistir presencialmente à sessão de julgamento. A entrada no plenário não foi permitida por conta da resolução do Supremo que permite apenas a advogados, ministros, procuradores e colaboradores a presença em plenário. Os parlamentares foram convidados para acompanhar a sessão no salão Branco, no STF, mas eles preferiram assistir na Câmara dos Deputados.