O Supremo Tribunal Federal (STF) começou a enviar, às instâncias inferiores, casos em que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) figura como parte, em razão da perda do foro privilegiado que gozava pelo exercício do mandato. A ministra Cármen Lúcia despachou, para a alçada do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em Brasília, oito queixas-crimes que estavam sob sua responsabilidade, declinando a competência do STF para julgá-las, tendo em conta que Bolsonaro não ocupa mais o cargo de presidente da República. Os ministros Edson Fachin e Luiz Fux enviaram duas ações para o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT).
Na prática, as ações serão distribuídas a juízes de primeira e segunda instâncias. Isso não significa, necessariamente, que elas andarão mais rápido ou devagar, mas o ex-presidente fica mais vulnerável, uma vez que os processos ficarão mais capilarizados entre diversos juízes que podem proferir sentenças variadas. Michel Temer, por exemplo, foi preso pouco mais de dois meses depois de deixar o Planalto, em 2019, por determinação do juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal do Rio, em uma operação conexa à Lava Jato.
A maioria das ações contra Bolsonaro que a ministra Cármen Lúcia enviou ao TRF1 diz respeito a declarações dele nas comemorações do 7 de Setembro de 2021, em que ele fez um discurso contra as instituições brasileiras como o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e o STF. Na época, Bolsonaro disse: “Ou o chefe desse Poder enquadra o seu ou esse Poder vai sofrer aquilo que não queremos”.
Já Edson Fachin encaminhou ao TJDFT uma queixa-crime em que o senador Randolfe Rodrigues acusa Jair Bolsonaro de difamação por publicação em redes sociais, em julho de 2021, que teria atribuído ao senador a negociação de vacinas Covaxin sem licitação, na pandemia da Covid-19. Luiz Fux enviou para o tribunal do DF a queixa-crime apresentada pela ex-presidente da República Dilma Rousseff em que ela alega que Bolsonaro teria ofendido sua honra ao publicar vídeo no Twitter depreciando os trabalhos da Comissão da Verdade.
O movimento iniciado por Cármen Lúcia, Fux e Fachin, no entanto, não será, necessariamente, seguido por outros colegas da Suprema Corte que também detêm processos nos quais Bolsonaro é parte. Um deles é Alexandre de Moraes, nas mãos de quem estão casos de maior gravidade, cujas consequências para o ex-presidente, em um cenário de maior gravidade, podem ir da perda dos direitos políticos à pena de prisão.
Estão com Moraes, por exemplo, pelo menos seis inquéritos, entre eles os que tratam dos atos antidemocráticos de 8 de janeiro, do vazamento de dados de investigação sigilosa da Polícia Federal, de interferência política na PF, de difusão de fake news e de declarações dadas durante a pandemia da Covid-19. Questionado sobre declinar ou não da competência para julgar os casos, Moraes limitou-se a dizer que está analisando.
A decisão de Cármen Lúcia, Fachin e Fux sinaliza que, por enquanto, somente as ações de menor potencial ofensivo referentes a Bolsonaro devem seguir para as instâncias inferiores. Os casos mais graves, como os inquéritos das fake news e dos atos antidemocráticos, abrigados por dispositivos legais que permitem a manutenção com membros da Corte, devem seguir tramitando no STF.