Opinião e Análise

Tainara Carozzi de Carvalho

As mudanças climáticas são um dos maiores desafios enfrentados pela humanidade no século 21, sendo amplamente notável o aumento de eventos climáticos extremos, como ondas de calor e chuvas torrenciais. Nesse processo, as comunidades mais vulneráveis que dependem majoritariamente dos recursos naturais para sobreviver são as mais atingidas pelas mudanças e são as que menos contribuem para a alteração climática<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a>.
Diante desse cenário de sobrevivência coletiva, globalmente estão acontecendo movimentos para frear os impactos ambientais em todos os setores da sociedade, e na minha opinião, nós, na condição de profissionais da advocacia, temos também responsabilidade de enfrentar esse problema. Nesse sentido, colabora a recomendação do Conselho Federal da OAB divulgada no último dia 27 de abril, direcionada às seccionais e subseções da Ordem, à categoria profissional e escritórios de todo país, com uma série de sugestões de combate aos efeitos das mudanças climáticas.
A recomendação possui base cientifica e legal sobre o avanço das mudanças climáticas fazendo referência ao Acordo de Paris<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a> para redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE) e ao relatório publicado em março pelo Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC)<a href="#_ftn3" name="_ftnref3">[3]</a>, que informou que as mudanças futuras são inevitáveis ​​e/ou irreversíveis, mas podem ser limitadas pela redução profunda, rápida e sustentada das emissões globais de GEE.
A recomendação está alinhada principalmente ao ODS 13 — Ação Contra a Mudança Global do Clima, da Organização das Nações Unidas (ONU) —, que defende a adoção de medidas para mitigar e se adaptar aos efeitos das mudanças climáticas, ressaltando a importância do meio ambiente ecologicamente equilibrado. A recomendação é mais um indício de que a preocupação com as mudanças climáticas não são um nicho do Direito Ambiental, mas, sim, devem estar refletidas em uma prática de advocacia alinhada com as demandas do nosso tempo.
A manutenção de condições de vida neste planeta assume vital importância tal qual a defesa do Estado democrático de Direito e dos direitos humanos na época da instauração do golpe civil-militar no Brasil. O Conselho Federal da OAB da época, através de seu presidente Povina Cavalcanti, publicou um comunicado saudando o golpe instaurado<a href="#_ftn4" name="_ftnref4">[4]</a>. Pouco tempo depois esse posicionamento foi modificado, em virtude da prisão arbitrária de pessoas advogadas e impedimento da prática profissional.
Com o mesmo interesse, a advocacia precisa defender o meio ambiente, em prol do bem-estar comum, de forma individual ou organizada. Estamos falando da participação técnica qualificada em defesa do meio ambiente em fóruns municipais, estaduais e federais. E nesse ponto, há a possibilidade de fortalecer cada vez mais os grupos já existentes na OAB nesse tema e, propor efetivamente novos regulamentos de proteção ambiental.
O crescimento das estratégias Enviromental, Social and Governance (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/ESG">ESG</a>) nas empresas e/ou escritórios não é suficiente para termos uma advocacia realmente conectada com o meio ambiente. É necessário que a advocacia assuma o papel de alertar às partes que representam sobre os riscos e responsabilidades legais que podem advir de ações ou omissões que contribuam negativamente para a crise climática, empregando esforços para fomentar realmente a sustentabilidade.
Outras medidas não contempladas na recomendação, mas que podem ser adotadas por profissionais da advocacia que têm interesse em atuar no combate aos efeitos das mudanças climáticas, são a promoção de debates e eventos sobre as melhores práticas para uma advocacia que considere a crise climática como fator chave de atuação.
Além disso, as pessoas advogadas podem trabalhar em estreita colaboração com organizações ambientais e governamentais para desenvolver políticas e regulamentos mais rigorosos para proteger o meio ambiente, desempenhando um papel crucial na promoção da transição para uma economia de baixo carbono. Defendendo políticas públicas que incentivam o uso de fontes renováveis ​​de energia, a redução das emissões de gases de efeito estufa e a implementação de medidas de adaptação para lidar com os impactos das mudanças climáticas. As pessoas advogadas têm a capacidade de influenciar as decisões políticas e de ajudar a moldar a legislação para garantir que nossos sistemas jurídicos sejam compatíveis com a necessidade de proteger o meio ambiente.
A advocacia pode ainda desempenhar um papel fundamental na educação e conscientização sobre as mudanças climáticas, fornecendo informações sobre os efeitos das mudanças climáticas e as medidas que podem ser tomadas para mitigá-las. Isso pode ajudar a construir uma base de apoio mais ampla para a ação climática e aumentar a conscientização sobre a importância do meio ambiente.
Em relação às sociedades de advogados percebe-se, na recomendação, um estímulo para uma atuação mais responsável, para além das relações com as partes que representa, envolvendo a adoção de políticas internas mais sustentáveis, a inclusão e promoção da agenda climática em suas atividades cotidianas, em treinamentos de pessoal, bem como a recomendação de rastrear o progresso obtido a partir da implementação de medidas para reduzir a emissão de carbono, a cada cinco anos a contar de 2030, com o objetivo de conseguir a total neutralidade de emissão de carbono em 2050.
Todas as recomendações desse ponto são interessantes para repensar as práticas adotadas pelos escritórios, no entanto, é importante destacar a recomendação para que sejam revisitadas as práticas e relacionamentos com clientes e fornecedores, de modo a promover a transição para uma advocacia de baixo carbono. O que encontra estreita proximidade com as boas práticas que escritórios do país já têm adotado para promover ambientes mais sustentáveis e demonstrar um diferencial de mercado para seus clientes, atendendo aos princípios ESG e os relacionados ao atingimento dos ODS da ONU.
Pessoas advogadas também podem aconselhar seus clientes sobre como implementar práticas sustentáveis de negócios. Isso pode incluir aconselhamento sobre como reduzir as emissões de gases de efeito estufa, minimizar o impacto ambiental e adotar práticas comerciais mais atraentes. As sociedades de advogados podem ainda ajudar a identificar oportunidades de investimento e negócios em tecnologias verdes, como fontes de energia renováveis. A assessoria em questões regulatórias e de compliance ambiental são imperiosas para a contribuição no combate às mudanças climáticas, assegurando que as empresas estejam em conformidade com leis ambientais, regulamentos e normas internacionais.
Em um mundo cada vez mais globalizado e complexo, onde as mudanças climáticas são um dos maiores desafios enfrentados pela humanidade, uma recomendação sobre o papel da advocacia no combate a elas é importante para aumentar a conscientização sobre a questão, fornecer orientações sobre melhores práticas, incentivar a adoção de ações mais rigorosas e estimular uma atuação mais responsável da advocacia e da OAB em relação ao meio ambiente.
A advocacia é uma ferramenta valiosa para enfrentar os desafios das mudanças climáticas, e ter uma orientação do conselho profissional da categoria de por onde começar e quais são os caminhos possíveis dentro da profissão reforça a importância da nossa contribuição para o futuro do planeta. É hora de as pessoas advogadas reconhecerem a si mesmas como potentes lideranças na luta contra as mudanças climáticas e garantir que nossos sistemas jurídicos sejam corresponsáveis pela mudança.
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<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> Para saber mais, acesse o relatório completo do IPCC, que está disponível em https://www.ipcc.ch/report/sixth-assessment-report-cycle/
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> Em 2016, o Brasil assumiu no Acordo de Paris o compromisso de reduzir as emissões de gases de efeito estufa (GEE) e conter o aquecimento global até 2030.
<a href="#_ftnref3" name="_ftn3">[3]</a> O relatório completo está disponível em <a href="https://www.ipcc.ch/report/sixth-assessment-report-cycle/">https://www.ipcc.ch/report/sixth-assessment-report-cycle/</a>
<a href="#_ftnref4" name="_ftn4">[4]</a> Mais informações sobre a atuação da OAB durante o período em: https://www.oab.org.br/historiaoab/estado_excecao.htm

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JOTA

Recomendação do Conselho Federal da OAB traz série de sugestões

O papel da advocacia em relação às mudanças climáticas

É hora de as pessoas advogadas se reconhecerem como potentes lideranças na luta contra as mudanças climáticas