O Projeto de Lei nº 5516/2019, que foi aprovado com alterações pelo Senado Federal em 10 de junho de 2021 e será novamente apreciado na Câmara dos Deputados, propõe a criação de mais uma modalidade de sociedade anônima, que é a sociedade anônima de futebol (SAF).
Atualmente os clubes são constituídos na modalidade de associação sem fins lucrativos e não possuem, juridicamente, um viés econômico. Entretanto, na prática, é claro que essas são instituições responsáveis por uma alta parcela de circulação de riqueza no país. Importante destacar que não possuir fins lucrativos não significa que tais instituições não são lucrativas, já que às associações é vedada a distribuição de lucros aos seus associados.
Nesse sentido, a SAF é uma estrutura societária específica para os clubes, devendo ter como objeto social a prática de atividades vinculadas ao futebol, como (i) o fomento e o desenvolvimento de atividades relacionadas com a prática do futebol, feminino e masculino; (ii) a formação de atleta profissional, nas modalidades feminino e masculino, e a obtenção de receitas decorrentes da transação dos seus direitos desportivos; (iii) a exploração dos direitos de propriedade intelectual de sua titularidade; (iv) a exploração de direitos de propriedade intelectual de terceiros, relacionados ao futebol; (v) a exploração econômica de ativos, inclusive imobiliários, sobre os quais detenha direitos; (vi) quaisquer outras atividades conexas ao futebol e ao patrimônio da SAF, incluindo organização de espetáculos esportivos, sociais ou culturais; e (vii) a participação em outra sociedade, como sócio ou acionista, cujo objeto seja uma ou mais atividades mencionadas acima.
As SAF poderão ser constituídas mediante transformação do clube ou da pessoa jurídica original, pela cisão do departamento de futebol do clube ou da pessoa jurídica original ou, ainda, pela iniciativa de pessoa natural, jurídica ou de fundo de investimentos. Também será possível a criação de uma SAF como subsidiária, para prática de atividades relacionadas ao futebol.
O Projeto de Lei também traz a exigência de instituição de estrutura de governança e de responsabilização de seus gestores, o que certamente será um enorme atrativo para investimentos e captação de recursos.
Note que é vedada a participação do acionista controlador em mais de uma SAF, bem como há obrigatoriedade de constituição obrigatória de um conselho de administração e do conselho fiscal com funcionamento permanente.
As SAFs que tiverem receita bruta anual de até R$ 78 milhões poderão realizar todas as publicações obrigatórias por lei apenas de forma eletrônica, devendo manter o documento publicado disponível em seus sítios eletrônicos por 10 (dez) anos. Além disso, deverá manter disponível, também, as informações sobre sua composição acionária, com a indicação do nome, da quantidade de ações e o percentual detido por cada acionista e, quando pessoa jurídica, os seus beneficiários finais, o seu estatuto social e atas de assembleias gerais, a composição e biografia dos membros do conselho de administração, conselho fiscal e diretoria e o relatório da administração sobre os negócios sociais. A inobservância desta obrigação acarretará na responsabilidade pessoal dos administradores da SAF.
Outro ponto de atenção do Projeto de Lei é a previsão de que as SAFs poderão realizar captação de recurso através da emissão de debêntures nomeadas como “debentures-fut”, não podendo este valor mobiliário ter remuneração por taxa de juros inferior ao rendimento anualizado da caderneta de poupança, bem como poderá ser instituída com remuneração varável, devendo ter prazo igual ou superior a 2 (dois) anos, com pagamento periódico de rendimentos.
Dentre as opções de quitação das obrigações propostas para as SAFs, o Projeto de Lei possibilita o pagamento através da recuperação judicial ou extrajudicial, ou ainda, mediante o Regime Centralizado de Execuções. Através dele a SAF poderá concentrar no juízo centralizados as execuções, as suas receitas e os valores arrecadados para a distribuição desses valores aos credores em concurso.
Por fim, o Projeto de Lei também institui um regime tributário diferenciado para a SAF, denominado “Re-Fut”. Este regime é facultativo e institui uma arrecadação única de 5% (cinco por cento) sobre a receita mensal apurada pelo regime de caixa para os primeiros 5 anos após a sua constituição.
Em um contexto de alto endividamento dos clubes de futebol existentes, inclusive com o pedido de recuperação judicial, e da administração exercida de forma amadora pelos seus Diretores, podemos concluir que o Projeto de Lei busca reestruturar o setor, criar uma base de governança e remuneração aos exercentes dos cargos de administração, além de viabilizar a sociedade empresária com viés futebolístico e, ainda, incentivar a captação de recursos para o setor.