Opinião e Análise

Anna Blume

Marie Luise Heuer

Ainda que de maneira geral as iniciativas <a href="https://www.pactoglobal.org.br/pg/esg">ESG</a> se tornem cada vez mais importantes tanto para consumidores quanto para investidores, é tênue a linha que separa o fortalecimento de cooperações para alcançar metas de sustentabilidade e o cumprimento da lei de concorrência. A Autoridade Federal Alemã de Cartéis (FAC) examinou recentemente três iniciativas setoriais voltadas para ganhos de sustentabilidade. Embora o órgão não tenha publicado decisões detalhadas ou relatórios sobre os casos, ainda é possível tirar algumas orientações de suas conclusões.
Iniciativas de sustentabilidade e lei de concorrência
Ao avaliar iniciativas conjuntas de sustentabilidade de várias empresas sob o direito concorrencial europeu, o ponto principal é saber se elas podem ter efeitos prejudiciais à concorrência nos termos do artigo 101 (1) do TFEU (Treaty on the Functioning of the European Union, em português: Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia). A resposta pode ser negativa se as empresas envolvidas não forem concorrentes ou se a cooperação não tiver efeito direto nos preços dos produtos, mas na melhora da produção e no manejo de recursos, tornando a atividade mais sustentável.
Mesmo que uma cooperação venha a restringir a concorrência, ela ainda pode ser permitida nos termos do artigo 101 (3) do TFEU, desde que seus efeitos pró-competitivos acabem eventualmente prevalecendo. Acordos sobre padrões de produção, por exemplo, podem levar a economias de escala e ao lançamento de produtos inovadores e mais sustentáveis, o que eventualmente aumentará a capacidade de escolha do consumidor. O teste principal é analisar se os acordos de cooperação eventualmente promoverão um progresso técnico ou econômico, e se os consumidores receberão uma justa parte justa deste benefício.
A abordagem casuística da FAC
Além da Autoridade de Concorrência Holandesa e da Autoridade de Concorrência e Mercados Britânica, que têm se despontado como líderes na Europa para emitir orientações detalhadas sobre acordos de sustentabilidade e oportunidades dentro da lei de concorrência, a FAC parece esperar pela Comissão Europeia no que diz respeito a efetivas reformas sobre o tema da sustentabilidade. A <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/europa">Europa</a> está atualmente revisando suas diretrizes horizontais que tratam de colaboração entre competidores. No setor agrícola, a estrutura legal para avaliar iniciativas de implementação de padrões de sustentabilidade foi alterada em dezembro de 2021 com a entrada em vigor do artigo 210a do Regulamento que estabelece uma organização comum de mercado de produtos agrícolas. Por enquanto, a FAC parece preferir abordar o tema caso a caso.
Salário mínimo na indústria da banana
Ao analisar um compromisso voluntário do setor varejista de alimentos para promover o salário mínimo no setor da banana, a FAC não teve nenhuma ressalva no que se refere à concorrência. A essência desta cooperação é chegar a um acordo sobre padrões e objetivos estratégicos comuns voluntários ao longo da cadeia de fornecimento de banana, a fim de introduzir coletivamente práticas de compras responsáveis e desenvolver processos para monitorar salários transparentes. A FAC constatou que não houve troca de informações sobre preços de compra, outros eventuais custos, volume de produção ou margens de rentabilidade.
Bem-estar animal
Outro projeto de sustentabilidade que foi recentemente reexaminada pela FAC é a iniciativa de bem-estar animal ("Iniciativa Tierwohl"), uma cooperação entre os setores agrícola, pecuário e varejista alimentício com o objetivo de recompensar os proprietários de animais por melhoras nas condições de vida dos animais, em particular o espaço em estábulos. A iniciativa é patrocinada principalmente pelos quatro maiores grupos varejistas alemães de alimentos e está sob escrutínio da FAC desde 2014.
Anteriormente, a agência havia solicitado a introdução de um processo de rotulagem, especificamente um sistema de identificação no setor de carne suína de forma a permitir uma maior transparência para os consumidores, e anunciou que permitiria a continuidade do acordo apenas por um período transitório até 2020. Uma vez que a Iniciativa Tierwohl está planejando incluir em seu escopo a engorda de gado, a FAC exige que a iniciativa desenvolva seu modelo de financiamento.
Sob o modelo existente, é necessário que se pague um prêmio padrão para o bem-estar de aves e suínos, o que para a FAC é um ponto crítico da estrutura. A Autoridade se manifestou positivamente apenas em caráter transitório e como primeira fase a ser melhor desenvolvida, frente ao pioneirismo da iniciativa. Sem apresentar contornos maiores, a FAC sugere ser mais apropriado que se defina um modelo de compensação dos custos relativos ao bem-estar animal. De qualquer forma, os elementos de competição devem ser introduzidos gradualmente, os critérios de bem-estar animal terão que ser refletidos na estrutura do modelo de financiamento e o conceito da iniciativa precisa ser melhor desenvolvido até 2024, início da próxima fase do projeto.
Setor leiteiro
No caso mais recente, a FAC mostrou os limites possíveis de uma cooperação sob a lei antitruste. O projeto de política agrícola "Agrardialog Milch" contatou a FAC e apresentou um conceito de financiamento em favor dos produtores de leite cru. De acordo com o projeto, os preços do leite cru não cobrem seus custos. O modelo da Agrardialog propõe estabilizar retroativamente o "preço do leite cru" acordado contratualmente através do pagamento de sobretaxas. A FAC entendeu que o modelo apresentado resultaria em um aumento generalizado do preço do leite em toda a indústria. A crítica é de que a verdadeira intenção por trás deste projeto era o aumento da renda, o que não pode por si só justificar uma isenção das regras de concorrência. A iniciativa não havia apresentado em contrapartida nenhum critério de sustentabilidade para a produção de leite cru. A FAC em sua manifestação deixou claro que "a cooperação é possível - acordos ilegais de fixação de preços não são", rejeitando o projeto pelo menos até que a Agrardialog apresente um conceito de sustentabilidade.
Futuros desenvolvimentos?
Estes três exemplos mostram que a FAC considera o direito concorrencial como uma ferramenta eficaz e suficiente para abordar os objetivos de sustentabilidade. Isto está em linha com suas avaliações anteriores sobre os rótulos de sustentabilidade Fairtrade e Grüner Knopf, a respeito de uma cooperação para reduzir o sal/açúcar/gordura e sobre uma iniciativa de redução de resíduos plásticos. De acordo com o presidente da FAC, Andreas Mundt, "o direito concorrencial não é um empecilho para cooperações que visem alcançar objetivos de sustentabilidade - pelo contrário. Uma concorrência efetiva é parte da solução, pois a sustentabilidade requer inovação, que por sua vez só surge em um ambiente competitivo. (...). Entretanto, tais cooperações só são permitidas se genuinamente melhorarem a sustentabilidade. Elas não devem visar apenas a aumentar os ganhos de algumas poucas empresas".
Os casos analisados também mostram a importância de um diálogo com a autoridade de controle, ao invés de implementar iniciativas sem conhecer o ponto de vista do regulador. De toda forma, resta esperar por novidades regulatórias a serem apresentadas pelo novo governo Alemão, já que conforme o acordo de coalizão entre o SPD (Partido Social Democrata), o Partido Verde e o FDP (Partido Liberal Democrático), as metas de sustentabilidade são fundamentais.

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JOTA

Novas orientações da Autoridade Federal Alemã de Cartéis (FAC)

A concorrência e as metas de sustentabilidade

Novas orientações da Autoridade Federal Alemã de Cartéis (FAC) buscando alcançar metas de sustentabilidade