Opinião e Análise

Cássio Casagrande

O maravilhoso mundo das “Big Techs” nem sempre é tão maravilhoso assim, ao menos para os seus trabalhadores. Alguns dos “iluminados” líderes empresariais da quarta revolução industrial parecem ter algo em comum com os grandes capitães de indústria de outrora: eles odeiam os sindicatos, e acham que os trabalhadores não precisam se auto-organizar, pois todos os direitos trabalhistas lhes serão concedidos graças à sua benevolência, mercê ou magnanimidade.
Vejamos esse tuíte que Elon Musk, o controverso líder da Tesla, mandou para os empregados da empresa em 2017, quando eles iniciaram uma campanha de sindicalização: “Não há nada que impeça os trabalhadores da fábrica de automóveis Tesla de se sindicalizar. Eles poderiam fazer isso amanhã se assim o desejassem. Mas por que pagar taxas para o sindicato e abrir mão de ações da empresa a troco de nada? Nosso histórico de segurança no trabalho é duas vezes melhor do que quando os trabalhadores eram representados pela United Auto Workers, e todos já dispõe de plano de saúde.”
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Nos EUA, para que os trabalhadores sejam representados pelo sindicato e o empregador seja obrigado a negociar um acordo coletivo, a entidade sindical deve convocar uma eleição no estabelecimento empresarial e obter adesão de mais de 50% dos empregados. Nessas “campanhas sindicais” os empregadores podem apresentar seu ponto de vista para os empregados quanto à representação sindical, mas não raro essas manifestações acabam desbordando para a intimidação e a ameaça.
Foi o que ocorreu na Tesla, em 2017; não apenas os trabalhadores receberam pressão da empresa através do Twitter, mas um de seus líderes que encabeçava o movimento em prol da sindicalização foi despedido, em medida claramente retaliatória:  Richard Ortiz, um empregado que havia sido um dos principais articuladores da campanha trabalhista “Futuro Justo para Tesla”. A alegação da empresa, um tanto estapafúrdia, era de que Ortiz havia quebrado as regras de confidencialidade da Tesla ao passar para a imprensa detalhes sobre as condições ruins de trabalho em uma de suas fábricas.
<blockquote class="jota-article__eye">Agora, em 2021, a National Labor Relations Board (órgão federal que exerce jurisdição administrativa em matéria de direito coletivo do trabalho) entendeu que o tuíte de Musk configurava ato antissindical, uma vez que ele claramente condicionava a possibilidade de os empregados receberem ações da empresa (stock options) a um voto contrário à sindicalização em uma de suas unidades.</blockquote>
Além disso, a decisão da NLRB reconheceu como abusiva a despedida de Richard Ortiz e determinou que ele seja reintegrado ao emprego no prazo de catorze dias, bem como receba indenização pelo período que permaneceu sem receber salários da empresa.
Em outro trecho do julgamento, a NLRB estipulou uma obrigação de fazer para a Tesla, estabelecendo que a empresa deve reformar o seu acordo de confidencialidade, de modo que o mesmo não seja utilizado para inibir a liberdade de comunicação dos trabalhadores a respeito de condições de trabalho, direito que é plenamente assegurado na National Labor Relations Act, de 1935, editado durante o governo de Franklin Delano Roosevelt.
O julgamento da conduta antissindical praticada pela Tesla é relevante não apenas por se tratar de uma decisão do governo americano contra uma das gigantes de tecnologia mais emblemáticas do século XXI. Ele torna visível ao público como a quarta revolução industrial contém o mesmo ingrediente de submissão da classe trabalhadora presente nas revoluções industriais anteriores: o “despotismo fabril”, agora sob novas formas, “aggiornato” pelas próprias tecnologias que embalam essa nova etapa de desenvolvimento do capitalismo.
Igualmente importante, trata-se do primeiro julgamento de destaque da NLRB sob a administração Joe Biden, que no início de seu mandato tomou a corajosa (e controvertida) decisão de remover integrantes do órgão que haviam sido designados pelo ex-presidente Donald Trump e que vinham adotando postura abertamente pro-business e anti-labor.
A remoção dos dirigentes da NLRB nomeados por Trump está sendo questionada por Republicanos na Justiça Federal, pois não é muito claro no direito americano se o ato presidencial poderia ser praticado sem a aquiescência do Senado, já que a medida foi inédita. De qualquer forma, os acontecimentos recentes deixam claro que a atual gestão Democrata está honrando, muito além das expectativas, os compromissos assumidos durante as eleições com os trabalhadores americanos.
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O episódio 55 do podcast Sem Precedentes discute a crise militar e seu impacto no Supremo Tribunal Federal. Ouça:
https://youtu.be/WAU2xWiR5DQ
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Elon Musk

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JOTA

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