Opinião e Análise

Claude Soares Ribeiro de Araujo

Levina Aparecida Machado Silva

Roberta de Freitas Chamusca

Vanessa da Silva Santos

O governo lançou no mês passado a Estratégia Nacional de Melhoria Regulatória<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a>, que tem como um de seus objetivos específicos incentivar a inovação, viabilizando um ambiente favorável ao desenvolvimento, atrativo aos investimentos e comprometido com o interesse público. Dentre as ferramentas disponíveis para fomentar a inovação, uma tem despertado crescente interesse dos reguladores: o ambiente regulatório experimental, ou sandbox regulatório<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a>.
O sandbox regulatório não é exatamente novidade. Lançado em 2016 pelo órgão regulador financeiro do Reino Unido (a Financial Conduct Authority), passou em pouco tempo a ser adotado por diversos outros países. No Brasil, a <a href="https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp182.htm">Lei Complementar 182/2021</a> instituiu o marco legal das startups e do empreendedorismo inovador, apresentando o sandbox regulatório como um instrumento a ser utilizado pelos órgãos públicos para fomentar a inovação.
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Os primeiros reguladores brasileiros a adotarem a ferramenta regulatória foram a Susep e o Banco Central, em 2020, seguidos pela CVM, em 2021. Entre as 11 agências reguladoras federais, 5 já instituíram formalmente o sandbox regulatório: a <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/Aneel">Aneel</a>, a <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/antt">ANTT</a>, a <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/Anac">Anac</a>, a <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/ANA">ANA</a> e a <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/Anatel">Anatel</a>.
Outras agências e reguladores também têm acompanhado esse movimento, seja ainda em fase de estudos preliminares, seja com projetos em andamento para a efetiva implantação da ferramenta. O interesse crescente pelo ambiente regulatório experimental pode ser explicado pelos seus potenciais benefícios, que incluem a produção de evidências, a redução de incertezas associadas à implementação de iniciativas inovadoras e a promoção da regulação ágil, adaptável e favorável à inovação<a href="#_ftn3" name="_ftnref3">[3]</a>.
A ANTT, que regula a prestação de serviços de transporte terrestre e a exploração da infraestrutura ferroviária e rodoviária federal, instituiu o sandbox regulatório em 2022. A iniciativa visa potencializar a capacidade de inovação e absorção de tecnologias de forma estruturada, possibilitando a adaptação da regulação às crescentes mudanças no setor de transportes terrestres, ao mesmo tempo, garantindo que essas mudanças ocorram de forma segura para a população.
A regulamentação do sandbox na ANTT seguiu as boas práticas regulatórias, incluindo a realização de benchmarking internacional, a cooperação com outros órgãos setoriais e a condução de processo de participação social. Este último foi fundamental para que a agência definisse o modelo de ambiente experimental a ser adotado, adequado às suas necessidades.
Ao longo do processo, foram realizadas reuniões participativas com o mercado regulado e consulta interna às unidades organizacionais impactadas. Por fim, a minuta de normativo do sandbox foi objeto de audiência pública, juntamente com o relatório de análise de impacto regulatório que fundamentou a proposta.
A ANTT foi a primeira agência reguladora a editar uma norma geral<a href="#_ftn4" name="_ftnref4">[4]</a> que regulamenta os princípios e os requisitos gerais para o desenvolvimento de sandboxes no ambiente regulado. A opção por criar um normativo “guarda-chuva” antes de iniciar os experimentos teve como princípio proporcionar mais segurança e transparência ao processo, beneficiando a própria ANTT, as empresas do setor regulado e potenciais participantes dos projetos de sandbox, assim como a sociedade. Previu-se o uso da ferramenta para todos os setores regulados pela Agência, podendo os experimentos serem propostos pela ANTT ou pelos regulados.
A norma geral traz pontos importantes, tais como: regras para o processo de admissão de participantes (por meio de edital de seleção ou indicação direta de empresa); critérios mínimos de elegibilidade para participação no ambiente regulatório experimental; requisitos para a definição das regras a serem afastadas pela ANTT e delimitação dos segmentos que comporão o ambiente regulatório experimental. São ainda definidos requisitos de monitoramento e comunicação durante a execução dos experimentos, bem como as condições de encerramento da participação no ambiente regulatório experimental e de suspensão ou cancelamento da autorização temporária concedida ao participante do experimento controlado.
Atualmente, a ANTT possui dois sandboxes em execução, ambos no âmbito da operação de rodovias federais concedidas, sendo um direcionado ao teste de implantação do Pedágio Eletrônico (Free Flow) e outro à implantação de um modelo de pesagem de veículos de carga na velocidade da via, o chamado HS-WIM (high speed weigh-in-motion). Nesses experimentos, as empresas participantes foram escolhidas diretamente pela ANTT.
Recentemente, a agência realizou Reunião Participativa para receber contribuições acerca da proposta de edital de seleção de participantes para novo sandbox regulatório<a href="#_ftn5" name="_ftnref5">[5]</a>, também no âmbito das rodovias federais concedidas, o que deve contribuir ainda mais para o aprendizado institucional.
Por se tratar de uma ferramenta nova e ainda pouco usada no Brasil, a ANTT faz um acompanhamento próximo dos experimentos em andamento. Isto é feito pela área responsável pelo sandbox, com apoio da Comissão de Sandbox, que inclui representantes da área de melhoria regulatória da agência e das unidades organizacionais com interface na matéria.
Esse modelo de governança possibilita monitorar a implementação dos ambientes regulatórios experimentais, acompanhar os indicadores estabelecidos, gerenciar riscos identificados, além de verificar se o que foi estabelecido no normativo geral do sandbox está funcionando na prática.
Os resultados obtidos até o momento com os experimentos em andamento são muito satisfatórios. Já foi possível constatar, por exemplo, a redução da área de intervenção no território e no meio ambiente com o uso de pórticos eletrônicos em substituição às praças físicas de pedágio e de pesagem.
Dados preliminares também apontam impactos positivos na segurança viária e no tempo de viagem, e na redução da evasão para a fiscalização de peso. Naturalmente, já foram identificados possíveis pontos de melhorias, mas nada que prejudique a continuidade e o sucesso dos projetos, assim como os benefícios que a ferramenta regulatória do sandbox já trouxe para o setor de transportes terrestres.
Apesar dos resultados promissores, vale dizer que o sandbox regulatório não é solução para tudo e envolve trade-offs, incluindo custos relacionados à coleta e análise de dados, monitoramento e comunicação com os atores afetados, entre outros. Além disso, excetuar regras pode implicar em diversos riscos para os envolvidos, em especial para usuários e consumidores. Por fim, é preciso estar preparado para o caso de o resultado do experimento não ser o esperado, sendo recomendável que reguladores e empresas tenham um plano de contingência para o caso de as expectativas não serem concretizadas.
Para aqueles que desejam ingressar nesse universo, recomendamos analisar experiências anteriores e “trocar figurinhas” para entender como o instrumento pode ser aplicado no seu modelo de regulação específico, além de aprender com os erros e acertos de quem já está no caminho.
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<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> <a href="https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/decreto-n-12.150-de-20-de-agosto-de-2024-579551217">Decreto 12.150, de 20 de agosto de 2024</a>.
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> Sandboxes permitem testar, em ambiente controlado, produtos, serviços e processos inovadores. Para isso, regras aplicáveis a determinado setor são temporariamente afastadas. Ver Sandbox Regulatório no Marco Legal das Startups/Tribunal de Contas da União, Rafael Carvalho de Fassio. Brasília: TCU, 2023.
<a href="#_ftnref3" name="_ftn3">[3]</a> <a href="https://www.oecd-ilibrary.org/docserver/f193910c-en.pdf?expires=1725965377&amp;id=id&amp;accname=guest&amp;checksum=E651D1DFC15C9AD53802763E7DB54D26">Regulatory Experimentation: Moving ahead on the Agile Regulatory Governance Agenda</a>. OECD Public Governance Policy Papers, abril de 2024.
<a href="#_ftnref4" name="_ftn4">[4]</a> <a href="https://anttlegis.antt.gov.br/action/ActionDatalegis.php?acao=detalharAto&amp;tipo=RES&amp;numeroAto=00005999&amp;seqAto=000&amp;valorAno=2022&amp;orgao=DG/ANTT/MI&amp;codTipo=&amp;desItem=&amp;desItemFim=&amp;cod_menu=5408&amp;cod_modulo=161&amp;pesquisa=true">Resolução ANTT 5.999, de 3 de novembro de 2022</a>.
<a href="#_ftnref5" name="_ftn5">[5]</a> <a href="https://participantt.antt.gov.br/Site/AudienciaPublica/VisualizarAvisoAudienciaPublica.aspx?CodigoAudiencia=577">Reunião Participativa</a> 12/2024, relativa à proposta de sandbox regulatório para inovação na inspeção de tráfego e descarbonização.

sede antt

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JOTA

Iniciativa visa potencializar a capacidade de inovação e absorção de tecnologias de forma estruturada

Sandbox regulatório: a experiência da ANTT

ANTT foi a primeira a editar uma norma geral que regulamenta os requisitos gerais para o desenvolvimento de sandboxes no ambiente regulado