Opinião e Análise

Comunidade Legal Operations Brasil

Com a chegada do final do ano, é normal que todos façam reflexões sobre os principais desafios enfrentados e conquistas atingidas. No que tange ao movimento de inovação no Direito, podemos dizer que houve uma grande intensificação do segmento. O profissional quer se reinventar e entregar resultados de uma forma eficiente, ágil e inovadora.
No Brasil, observa-se que houve a ascensão das legaltechs<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a>. Os Departamentos Jurídicos e os escritórios de advocacia passaram a buscar cada vez mais soluções voltadas para automação e otimização de tarefas, sempre com o objetivo de reduzir atividades mecânicas e possibilitar o foco na análise de dados e no acompanhamento da estratégia.
Com a política de vacinação contra a covid-19 e o retorno dos eventos presenciais de forma gradual, foram criadas grandes expectativas para o reencontro do mercado e atualização sobre todas as novas soluções disruptivas e inovadoras. Imbuídos com esse espírito, um grupo de advogados e empreendedores de diferentes segmentos resolveram se reunir e criar uma Comunidade dedicada a assuntos referentes à gestão, inovação e eficiência no âmbito do mercado jurídico brasileiro. Assim, tendo como fonte de inspiração o CLOC (“Corporate Legal Operations Consortium”), nasceu a CLOB (“Comunidade Legal Operations Brasil”).
O objetivo da CLOB é fomentar o mercado jurídico nacional para auxiliar, não exaustivamente:
<ul>
<li>no entendimento do que é Legal Operations (“Legal Ops”) no Brasil;</li>
<li>na definição das habilidades e competências necessárias que o profissional deve ter e/ou se especializar para conseguir seguir carreira na área de Legal Ops;</li>
<li>na construção de visão, para escritórios e empresas, no sentido do que almejar para alcançar uma estrutura administrativa mais madura;</li>
<li>em temas correlatos de operações e estratégia para provocar o ecossistema jurídico e corporativo e, a partir disso, ser possível repensar o papel do jurídico em organizações.</li>
</ul>
Esse é o exemplo de um movimento visando a unificação do sistema com a integração de diferentes atores, quais sejam, legaltechs, Departamentos Jurídicos, escritórios e consultorias. Sob este mesmo liame, foram promovidos em outubro e novembro de 2022 dois grandes eventos de inovação jurídica, quais sejam: a Fenalaw e a AB2L Lawtech Experience.
A Fenalaw é a maior feira congresso da América Latina<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a>, reunindo profissionais de diversos segmentos com foco em unir o ecossistema, disponibilizar conteúdos sobre as principais novidades de todas as áreas do Direito, bem como divulgar todas as soluções existentes no mercado. Pela primeira vez, o evento disponibilizou um auditório exclusivo dedicado a temas atinentes ao segmento de Legal Operations. Reforçando a importância do surgimento da CLOB, os painéis do auditório foram promovidos pela Comunidade e contaram com a presença de profissionais de alto destaque.
Foram debatidos inúmeros temas, tais como: evolução da área de Legal Operations no Brasil, a comparação entre o mercado brasileiro e o norte-americano, a intensificação do data analytics como ferramenta para alavancar o segmento, a estruturação da área de Legal Operations no âmbito dos escritórios, o gerenciamento de projetos jurídicos, o uso do visual law e da automação de contratos, a utilização de dados jurídicos para análises financeiras e os principais desafios e oportunidades no âmbito da profissão.
Legal Operations parte do pressuposto de que sempre é possível promover uma melhor entrega. Para tanto, é necessário buscar a melhoria contínua com a adoção dos processos, pessoas e recursos adequados. Para se chegar a tal patamar, devem ser reunidas inúmeras competências, tais como, finanças, projetos, gestão, tecnologia, dados, planejamento, treinamento e desenvolvimento. Observa-se, portanto, a necessidade de estruturação de times de diferentes formações, com foco na multidisciplinaridade e em profissionais que sejam multitarefas. O profissional de Legal Ops, além do conhecimento jurídico, precisa entender do negócio, estando sempre atento às soluções existentes no mercado. Este é o segmento que, de fato, mostra a necessidade de integração e boa entrega de múltiplas frentes.
Conforme destacado pelo ilustríssimo Ministro Luiz Fux no painel de abertura da AB2L Lawtech Experience<a href="#_ftn3" name="_ftnref3">[3]</a>, o princípio da eficiência consiste no máximo de resultado com o menor esforço possível. A referida definição muito se associa às concepções de Legal Operations trazidas por Jennifer McCarron<a href="#_ftn4" name="_ftnref4">[4]</a> e Mary O'Carroll<a href="#_ftn5" name="_ftnref5">[5]</a> no evento. Vale destacar que ambas são grandes referências no mercado de Legal Ops, sendo integrantes do board do CLOC. Ademais, nenhuma das duas são advogadas e, ainda assim, conseguiram assumir posições de grande destaque, o que reforça a relevância da multidisciplinaridade.
Para elas, Legal Ops parte da premissa de que sempre é possível conduzir uma melhor entrega. Uma perspectiva de se analisar a área é a necessidade de se ter os melhores recursos, pessoas e tecnologia e, a partir disso, ser capaz de produzir informações e dados que tornem a operação mais efetiva. Para tanto, na maior parte das vezes, não é necessário implementar um novo processo com alto grau de complexidade. Muito pelo contrário, muitas vezes, pequenas mudanças geram um grande benefício na prática.
Em seu painel, Mary O'Carroll destacou que a melhor gestão da mudança é a ausência da necessidade de gestão. Se a mudança de determinado processo a partir da adoção de uma nova ferramenta, por exemplo, gerar um grande trabalho para o time, será extremamente penosa a implementação. Por outro lado, se o time observar uma melhoria efetiva de processo com a implementação da nova ferramenta, este vai mudar naturalmente.
A mudança do fluxo de trabalho até então existente deve ser mais intuitivo e promover maior celeridade do que antes. Em suma, com a utilização da ferramenta adequada, as pessoas e os processos mudam naturalmente. Tais percepções reforçam a importância da integração de múltiplas frentes e o trabalho em equipe. Cada ator do ecossistema possui um papel de relevância e todos devem ter uma visão de estratégia de negócio dentro do jurídico.
Vale frisar que Jennifer McCarron ressaltou a importância dos ALSPs (alternatives legal service providers). De acordo com a Gartner, empresa que atua nos segmentos de pesquisa, consultoria e promoção de eventos no mercado de inovação, os ALSPs são prestadores de serviços diferentes dos escritórios, ou sendo escritórios, provedores que se propõem a entregar serviços de suporte jurídico a um custo mais baixo do que o mercado tradicional. Os ALSPs são capazes de fornecer advogados qualificados para projetos específicos ou equipes estruturadas para projetos maiores, conseguindo lidar com um alto volume de trabalho. Isso só é possível com o auxílio da tecnologia<a href="#_ftn6" name="_ftnref6">[6]</a>. Apesar do referido termo não ser tão utilizado no Brasil, as legaltechs são ALSPs na prática, de modo que defendemos uma atenção especial da Ordem dos Advogados do Brasil para o tema, observando a melhoria contínua do mercado e o não sucateamento da classe.
Observa-se, por fim, que a terceirização de certos tipos de trabalhos de departamentos e escritórios se tornará uma tendência cada vez maior, tendo em vista que é muito mais custoso manter uma grande estrutura internamente. A perspectiva para os próximos anos é que haja uma intensificação do crescimento das legaltechs, inclusive, com operações de fusões e aquisições. De acordo com dados da Gartner, a previsão é que até 2025, os Departamentos Jurídicos tripliquem os seus gastos em tecnologia jurídica<a href="#_ftn7" name="_ftnref7">[7]</a>. Portanto, se 2022 foi promissor, 2023 poderá significar muito mais para a área de Legal Operations no Brasil.
Assinam este artigo em nome da CLOB:
Aline Rodrigues e Steinwascher - Head of Legal do Will Bank 
Ana Beatriz Mandina da Graça Couto - COO do Sem Processo 
Christiano Pires Guerra Xavier - CEO da Future Law Studio e Co-Founder da Future Law 
Fabiana Kiwsy Rego Prado Velasco - Gerente Jurídica - Legal Operations da Amil 
Felipe Oliveira de Castro Rodriguez Alvarez - CEO da Enlighten 
Gabriela Bratkowski Pereira - Legal Manager das Lojas Renner S.A. 
Guilherme Severo Porcher - Chief Legal Operations Officer das Lojas Renner S.A. 
Guilherme Tocci - Global Legal Ops Manager da Gympass 
Leon Katsuo Malva Hatori - Senior Product Manager do Quinto Andar 
Meiriely Cortes Doro - Legal Operations Manager do Will Bank 
Paulo Silva - Senior Legal Operations Manager da Deloitte 
Vanessa Fortunato Zaccaria - Legal Operations Manager da Suzano 
Victor Cabral Fonseca - Senior Associate e Head of ThinkFuture do TozziniFreire Advogados
_____________________________________________________
<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> Na prática, os termos legaltechs e lawtechs são usados como sinônimos no Brasil.
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> A Fenalaw, maior e principal Feira Congresso para o mercado jurídico da América Latina, completa 20 anos de sucesso em 2023. Disponível em: &lt; <a href="https://www.fenalaw.com.br/o-evento/">https://www.fenalaw.com.br/o-evento/</a>&gt;.
<a href="#_ftnref3" name="_ftn3">[3]</a> Em 29.11.2022, a AB2L (“Associação Brasileira de Lawtechs e Legaltechs”), promoveu em São Paulo a AB2L Lawtech Experience, reunindo referências do mercado de inovação no segmento jurídico. O evento contou com palestras de grandes nomes, como: Ministro Luiz Fux, Ronaldo Lemos, Jennifer McCarron e Mary O'Carroll.
<a href="#_ftnref4" name="_ftn4">[4]</a> Atualmente, Jennifer McCarron é Diretora de Legal Operations e Tecnologia da Netflix. Antes disso, atuou como head de Tecnologia Jurídica do Spotify.
<a href="#_ftnref5" name="_ftn5">[5]</a> Atualmente, Mary O'Carroll é CCO – Chief Community Officer – da Ironclad. Ela atuou por mais de 13 anos como Diretora de Operações, Tecnologia e Estratégia do Google.
<a href="#_ftnref6" name="_ftn6">[6]</a> GARTNER. Alternative Legal Service Providers (ALSPs) Reviews and Ratings. Disponível em: &lt; https://www.gartner.com/reviews/market/alternative-legal-service-providers-alsps&gt;.
<a href="#_ftnref7" name="_ftn7">[7]</a> ZHUKOVINA, Kateryna. Legal Tech Overview: Best Legal Tech Companies and Trends. Disponível em: &lt;<a href="https://ascendixtech.com/legal-tech-overview-best-legal-tech-companies/">https://ascendixtech.com/legal-tech-overview-best-legal-tech-companies/</a>&gt;.

andrew-neel-cckf4TsHAuw-unsplash

https://images.jota.info/wp-content/uploads/2021/09/copy-of-jota-logo-high-cmyk.jpeg

JOTA

As principais tendências e perspectivas do mercado de inovação jurídica

A intensificação do movimento de Legal Operations: um panorama do ano de 2022

Legal Operations, que visa uma melhor entrega, foi uma das principais tendências e perspectivas do mercado de inovação jurídica no ano.