Opinião e Análise

Bruno Feitosa

Isadora Cohen

Em momentos conturbados dizer o óbvio pode ser necessário: um país que flerta com o desenvolvimento deve priorizar investimentos em infraestrutura, e há fundamentos constitucionais para isso.
Para 2021, não são poucas as pautas que buscam o desenvolvimento de projetos de infraestrutura – tanto no Executivo (claro), quanto no Legislativo – e até o Judiciário tem atentado a essa agenda. Como exemplo temos o a nova Lei do Gás, o novo marco regulatório das ferrovias, o regulamento das debentures da infraestrutura, a lei de incentivo a cabotagem, a instituição do Free Flow nas concessões rodoviárias; sem falar na nova Lei de Licitações e o projeto de desestatização da Eletrobrás.
<a href="https://www.jota.info/produtos/tributos?utm_source=Banner%20site&amp;utm_medium=Artigos&amp;utm_campaign=CTA_Tributos_materias" rel="attachment wp-att-291213"><img class="size-medium wp-image-291213 aligncenter" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/01/jota-pro-tributos-v2.jpg" alt="" width="300" height="300" /></a>
Contudo, se mais uma vez as ações do Estado não forem executadas em um movimento conjunto e direcionado, fatalmente estas serão, assim como tantas outras, inciativas frustradas. Em outras palavras: é preciso haver coesão nas políticas públicas. A materialização dos objetivos pretendidos por qualquer projeto de infraestrutura apenas será alcançada se houver harmonia entre a política financeira, social e regulatória (e o alinhamento das agendas dos Poderes).
De forma metafórica, o Estado deve ser concebido como um sistema de vasos comunicantes: o gargalo em qualquer destes dutos - pelos quais correm as políticas públicas - afetam a agenda de priorizações dos projetos de infraestrutura.  A edição de novas leis, mas em conjunto com uma agenda de destravar bons projetos e apoiar os esforços que devam ser conduzidos pelo Estado no desenvolvimento da infraestrutura.
E se tem uma coisa que contribui para a agenda de desenvolvimento da infraestrutura, é a atenção com aquilo que gera conforto e segurança ao investidor privado para apostar no projeto e investir seu capital na agenda de desenvolvimento. E as incoerências do modelo tributário brasileiro representam um entrave à atração do capital privado.
Reformas pontuais não serão capazes de tornar o país fértil ao investimento privado, nacional ou estrangeiro. Sob a perspectiva tributária,  antes de se propor pautas reformistas, avaliemos as causas que resultam em uma estrutura fiscal caótica, que mais parece um emaranhado de normas desconexas e, por vezes ilógicas, formando uma grande colcha de retalhos jurídica.
<blockquote class="jota-article__eye">Não é preciso muito esforço para se admitir que a política tributária nacional (não apenas a carga, mas a complexidade de interpretação das normas e o custo relacionado à apuração de tributos no Brasil) é um dos, se não o principal, fator de repulsa ao investimento e, consequentemente, do retardo no desenvolvimento econômico e social do país.</blockquote>
Novamente é preciso dizer o óbvio: a infraestrutura é o mais elementar dos insumos para qualquer segmento econômico. E além, é talvez o fio condutor da materialização de políticas que se prestam à equalização das diferenças sociais e erradicação da pobreza. Sem investimentos em infraestrutura não há avanços, sejam eles econômicos ou sociais.
A efetivação de políticas públicas voltadas para a infraestrutura, seja por meio de prestação centralizada ou descentralizada<a href="applewebdata://81040BD1-FCA3-43F5-ABF5-FD695AD7186D#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a>, apenas serão alcançadas quando tais políticas forem pensadas e implementadas em todas as suas variáveis, inclusive fiscais, e não apenas em seus aspectos regulatórios. Precisamos repensar e realinhar os objetivos do sistema tributário aplicável à infraestrutura, em especial em função dos princípios da extrafiscalidade<a href="applewebdata://81040BD1-FCA3-43F5-ABF5-FD695AD7186D#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a>.
É exatamente sob a perspectiva da extrafiscalidade dos tributos que o Estado deve pensar as medidas fiscais que serão adotadas no período pós-pandemia – em que, aliás, a infraestrutura ganha contornos ainda mais relevantes.
A proposição ganha maior ênfase diante do texto da PEC nº 186/2019, apelidada de “PEC Emergencial”, que em contrapartida à autorização dos gastos emergenciais, determina que o Congresso apresente um plano de revisão das renúncias fiscais. De forma pragmática, a ideia é que, em até oito anos, sejam reduzidos os gastos tributários ao limite de 2% do PIB<a href="applewebdata://81040BD1-FCA3-43F5-ABF5-FD695AD7186D#_ftn3" name="_ftnref3">[3]</a>.
O setor de infraestrutura goza de alguns tratamentos fiscais especiais. Diante do texto da PEC Emergencial poderão ser extintos. Como exemplo podemos citar programas como o Reidi, Reporto, Repetro entre outros.
Contudo, não nos parece que a revogação desses programas se revela uma medida adequada. Como estabelecido até aqui, políticas fiscais adequadas nada mais representam do que instrumentos que materializam preceitos constitucionais, sobretudo quando estamos diante de políticas voltadas ao setor de infraestrutura, o mais elementar dos insumos necessários a qualquer processo produtivo e aos avanços sociais, repise-se.
Se hoje o cenário ainda não é dos mais férteis para a proliferação de investimentos, podemos vivenciar momentos ainda mais áridos no pós-pandemia o que, potencialmente, afetará as políticas de desenvolvimento à infraestrutura.
Não se nega o arroxo fiscal nem se discute a necessidade da adoção de medidas enérgicas para equalizar as contas públicas. Contudo, a solução mais adequada e razoável não é o aumento da carga tributária, na medida em que tal medida poderia induzir a um retrocesso nos investimentos necessários ao Brasil.
<hr />
O episódio 54 do podcast Sem Precedentes discute o julgamento da 2ª Turma do STF, que decidiu que Moro foi parcial em suas decisões no caso do tríplex do Guarujá contra Lula. Ouça:
https://www.youtube.com/watch?v=Xm3qid_RRA4
<hr />
<a href="applewebdata://81040BD1-FCA3-43F5-ABF5-FD695AD7186D#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> “‘The time when public sector was the only channel for infrastructure expansion has long gone’. Ao constatar tal realidade, Luc E. Leruth bem reconhece que, à exceção das funções essenciais do Estado, a provisão de serviços de interesse públicos pode ser propiciada pelo setor privado. Multiplicam-se, assim, as formas de participação da iniciativa privada na prestação de serviços públicos ou de interesse público. O termo delegação apresenta uma plurivocidade de significados, podendo representar a delegação de poderes, a delegação administrativa, entre outros. O termo é aqui empregado para identificar a transferência do exercício de um serviço público a outrem, seja outra pessoa jurídica criada pelo Estado, seja um particular. Trata-se, em verdade, de descentralização, transferindo-se o exercício da função para um sujeito distinto e autônomo. MELO, Suzana Soares. Tributação dos serviços de infraestrutura: uma análise estrutural-funcionalista da utilização de mecanismos tributários como instrumentos para o desenvolvimento. Disponível em: &lt; <a href="https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2133/tde-23032017-090848/pt-br.php">https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2133/tde-23032017-090848/pt-br.php</a> &gt;; consulta em 02.11.2020.
<a href="applewebdata://81040BD1-FCA3-43F5-ABF5-FD695AD7186D#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> Nos dizeres de Suzana Soares de Melo, é sob essa ótica que os tributos devem ser pensados sob seu aspecto extrafiscal:  Ao lado de outras necessidades financeiras do Estado, o tributo também pode exercer outras importantes funções econômicas, políticas e sociais, o que tem levado a doutrina a reconhecer a “ambivalência funcional” dos elementos constitutivos dos instrumentos tributários. Assim, ainda que o propósito do legislador pareça, à primeira vista, ser meramente arrecadatório, cumpre o tributo, em maior ou menor grau, uma função extrafiscal. Em outras palavras, os tributos – ou a ausência deles – podem exercer uma função indutora. As normas tributárias indutoras caracterizam-se por instituir gravames ou incentivos fiscais, com vistas a desestimular ou estimular a prática de determinada conduta, representando importante instrumento para a intervenção do Estado no domínio econômico e social. Em última análise, como pontua José Ricardo do Nascimento Varejão, “a ação afirmativa em Direito Tributário reflete a dinâmica do tributo em atendimento a sua função social [...]Nessa senda, os mecanismos tributários, ao lado de objetivar a arrecadação de recursos para o custeio das despesas públicas e promover a adequação dos comportamentos dos jurisdicionados às exigências da legislação tributária, podem contribuir para a promoção de políticas sociais, econômicas, entre outras, à luz dos programas constitucionalmente delineados.
<a href="applewebdata://81040BD1-FCA3-43F5-ABF5-FD695AD7186D#_ftnref3" name="_ftn3">[3]</a> De forma bastante didática Paulo Honório de Castro Júnior[3] estabelece o atual panorama econômico a aponta os possíveis impactos fiscais futuros: O IPEA, na Carta de Conjuntura nº 49, relativa ao 4º trimestre de 2020, informa que a dívida bruta do governo geral correspondeu a 90,8% do PIB, aproximadamente 15% a mais que em dezembro de 2019. O crescimento da dívida líquida também foi expressivo – de 5,5% do PIB para 61,2% –, mas bem menor que o da dívida bruta, devido ao efeito da desvalorização cambial sobre as reservas internacionais do Banco Central2. Nesse relatório, aponta-se um déficit primário em 2020 de R$ 844,6 bilhões. O agravamento da pandemia no ano de 2021 foi recebido com dois fatores de grande preocupação financeira: (i) o fim do auxílio emergencial, criado pela Lei nº 13.982, de 2 de abril de 2020, pelo qual 67,8 milhões de brasileiros foram beneficiados; e (ii) o prazo final do “orçamento de guerra”, que dispensava a obediência aos limites legais dos gastos públicos no enfrentamento da pandemia, inclusive da "regra de ouro".Com isso, tornou-se evidente a necessidade de um reajuste fiscal. Entre outras medidas, a PEC nº 186/2019, apelidada de “PEC Emergencial”, aprovada no Senado em 04.03.2021 e encaminhada à Câmara dos Deputados, pretende reinstituir o auxílio emergencial, para que até R$ 44 bilhões sejam gastos fora dos limites orçamentários, mediante créditos extraordinários. Para tanto, impõe (sem qualquer sanção) que o Executivo federal envie ao Congresso Nacional, até seis meses após a aprovação da PEC, um plano de revisão das renúncias fiscais, acompanhado das respectivas proposições legislativas. A ideia é que, em até oito anos, sejam reduzidos os gastos tributários ao limite de 2% do PIB, admitidas algumas exceções. <a href="https://williamfreire.com.br/wp-content/uploads/2021/03/Memo-WFAA-PEC-emergencial-e-seguranca-juridica-na-revogacao-de-renuncias-fiscais.pdf">https://williamfreire.com.br/wp-content/uploads/2021/03/Memo-WFAA-PEC-emergencial-e-seguranca-juridica-na-revogacao-de-renuncias-fiscais.pdf</a>

declaração MEI

https://images.jota.info/wp-content/uploads/2021/09/copy-of-jota-logo-high-cmyk.jpeg

JOTA

Para 2021, não são poucas as pautas do Executivo e do Legislativo que buscam o desenvolvimento de projetos de infraestrutura

Reflexões sobre regime tributário da infraestrutura

Para 2021, não são poucas as pautas do Executivo e do Legislativo que buscam o desenvolvimento de projetos de infraestrutura