Opinião e Análise

Isadora Cohen

Felipe Gurman Schwartz

Matheus Cadedo

Não é segredo que uma boa regulação, quando coordenada e debatida de forma transparente com os agentes e usuários de um mercado, pode convergir em diversos benefícios setoriais, seja para os prestadores de serviços, seja para os consumidores.
Um bom exemplo disso é a implantação do sistema free-flow em rodovias concedidas à iniciativa privada, permitindo a cobrança de pedágio eletronicamente, sem a necessidade de barreiras físicas e pagamentos manuais.
Embora tenha tido início incipiente no país – a partir da permissão de tags de cobrança eletrônica, como “via fácil” e “sem parar” (que não constituem um free-flow integral) –, o sistema vem ganhando força com estímulos regulatórios e contratuais.
A regulação do tema no Brasil começou em São Paulo, com um embrião chamado “Ponto-a-Ponto”. Depois evoluiu na concessão da rodovia do Centro-Oeste Paulista, realizada em 2017, atualmente administrada pelo Grupo Intervias.
O contrato previu a viabilidade de se implementarem sistemas de cobrança eletrônicos e permitiu o estabelecimento de um “sistema operacional de arrecadação automático com controle e contagem eletromecânico dos veículos”. Previu, ainda, como dever da concessionária a “permanente atualização e crescente automação<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a>” do sistema de cobrança.
Ainda, a concessionária pode implantar sistema operacional de arrecadação baseado no conceito de free-flow e na cobrança de tarifas quilométricas, ou seja, que reflitam a distância percorrida pelos usuários.
Nesse caso, ao usuário é assegurada uma tarifa “teto” e, à concessionária, é estimulada a implantação da tecnologia necessária para substituição das cabines físicas de pedágios. Ao fim da equação, o usuário sai ganhando: usando menos a estrutura da rodovia, também acaba pagando menos.
A concessionária também não fica atrás, pois, além de conseguir dimensionar melhor suas receitas em decorrência de uma política tarifária mais equilibrada, passa a gastar menos com a manutenção de uma estrutura relativamente ineficiente, como as cabines físicas de pedágio.
A regulamentação, por sua vez, trouxe indução de comportamento do usuário, já que “a cobrança pelo Sistema de Cobrança Eletrônica (AVI) deverá considerar um desconto mínimo de 05% (cinco por cento) em relação aos valores praticados no Sistema Operacional de Cobrança Manual”. Ou seja: quem adere ao “free-flow”, paga uma tarifa menor.
E há razão para esse desconto.
Sistemas de cobrança automática geram ganhos tanto em termos de custos operacionais de uma concessionária, quanto em benefícios e maior satisfação aos usuários da infraestrutura concedida.
Olha que interessante: um estudo da Universidade Federal de Itajubá<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a>, evidenciou que um motorista pode ficar, em média, 6 minutos parado, esperando o pagamento de um único pedágio (considerando uma fila de 10 carros). Dependendo do destino, o somatório do tempo desperdiçado pode chegar a mais de meia hora, considerando um trecho de extensão média.
O “tempo perdido” pode ser ainda maior se considerarmos os trechos de grande extensão feitos por caminhoneiros e trabalhadores do setor de frete rodoviário.
Do lado do parceiro privado, a administração de filas custa caro, além de impor uma série de desafios operacionais e, possivelmente, penalizações contratuais.
Para o usuário, o tempo de demora pode gerar um comportamento adverso, incentivando-o a optar por rotas de fuga ou atalhos.
Se o usuário evita os trechos de pedágio com maior trânsito, a concessionária enfrenta uma queda na arrecadação tarifária.
Para além disso, existe toda a questão dos gastos com a construção, operação e manutenção de cabines físicas e terminais para a cobrança de pedágio. Há, inclusive, a necessidade de alargar as faixas de asfalto nas áreas de pedágio o que gera, potencialmente, a necessidade de mais desapropriações.
Em resumo, para a concessionária, é proporcionalmente mais caro manter um sistema de cobrança físico do que um eletrônico.
Esses benefícios já são perceptíveis. De acordo com levantamento da ABCR, divulgado em 2021<a href="#_ftn3" name="_ftnref3">[3]</a>, o pagamento de pedágio com base na identificação por tag em cancelas automáticas equivale, em média, a 57,6% de todos os registros nas praças de cobrança físicas<a href="#_ftn4" name="_ftnref4">[4]</a>.
Não por outro motivo, novos projetos já começaram a prever o free-flow como principal sistema de cobrança tarifária. É o caso do novo Rodoanel de Belo Horizonte e da recente licitação da concessão da Rodovia Presidente Dutra.
São essas boas iniciativas que demonstram como bons contratos podem induzir comportamentos, a partir de uma série de incentivos gerados tanto para os concessionários, quanto para os usuários dos serviços concedidos.
Mesmo para aqueles projetos que não tem o sistema free-flow como exigência contratual obrigatória, há possíveis caminhos alternativos para a atualização da cobrança pedagiária.
Contratos mais “abertos”, que permitem e incentivam novas experiências, podem ser essenciais para o aprimoramento de setores e mercados, sobretudo no campo da infraestrutura pública. Como ilustrado na prática, os bons contratos são aqueles que alinham incentivos e que fazem sentido para todas as partes envolvidas, em especial ao usuário e à concessionária.
Afinal, como diz a sabedoria popular, diante de velhas soluções, por que não tentar mudar? Experiências boas, não faltam!
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<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> Previsões dispostas no anexo 04 do contrato.
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> O estudo pode ser acessado em: <a href="https://www.researchgate.net/publication/312212527_Dimensionamento_de_uma_praca_de_pedagio_no_Brasil_estudo_de_caso_em_um_feriado_prolongado">(PDF) Dimensionamento de uma praça de pedágio no Brasil: estudo de caso em um feriado prolongado (researchgate.net)</a>. Disponível em 18 de maio de 2023. Conforme o estudo, um motorista, em um pedágio sem filas, gasta cerca de 37 segundos para pagar a tarifa e ser liberado na cancela. Considerando uma fila de 10 carros (estimativa conservadora em dias de maior trânsito), esse valor é incrementado, consequentemente, para cerca de 6 minutas
<a href="#_ftnref3" name="_ftn3">[3]</a>O estudo foi debatido no Senado Federal. Veja-se mais em: <a href="https://www12.senado.leg.br/noticias/infomaterias/2021/05/nova-lei-deve-abrir-caminho-para-automatizacao-total-dos-pedagios">Nova lei deve abrir caminho para automatização total dos pedágios — Senado Notícias</a>. Acesso em 28 de junho de 2023.
<a href="#_ftnref4" name="_ftn4">[4]</a>Trata-se da cobrança eletrônica em pedágios físicos (em algumas de suas faixas). Ou seja, não se trata de um sistema free-flow integral.

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JOTA

Como a boa regulação rodoviária tem gerado benefícios na cobrança dos pedágios

Diante de velhas soluções, por que não tentar mudar?

Boa regulação rodoviária tem gerado benefícios na cobrança dos pedágios, sendo um bom exemplo a implantação do sistema free-flow