Opinião e Análise

André Guimarães

Ane Alencar

Desde o começo deste ano foram registrados mais de 324 mil focos de calor no Brasil, indica a plataforma BDQueimadas, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Um foco de calor, vale lembrar, é um ponto no mapa com temperatura alta o suficiente para destacá-lo do entorno. Normalmente, pode representar queimadas e incêndios
A fumaça que encobriu São Paulo em agosto levantou ainda mais olhares para o país que já ardia em chamas. O estado teve mais de 2.600 mil focos de calor entre os dias 22 e 24 e, somente no dia 23, chegou a ultrapassar os registros destes focos na Amazônia brasileira. Segundo uma análise do IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), <a href="https://ipam.org.br/focos-de-calor-sp/">mais de 80% dos focos em São Paulo ocorreram em áreas agropecuárias</a>.
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Os ventos do Sudeste deixaram Brasília esfumaçada na semana seguinte. Porém, se a má qualidade do ar na capital federal esteve ligada ao episódio paulista, ou ao fogo ateado no Cerrado do Planalto Central, na Amazônia, é consequência de desafios vivenciados em atividades agropecuárias. Práticas estas fortemente afetadas pela seca extrema e as mudanças climáticas, como nos mostram os baixíssimos níveis dos rios amazônicos.
O fogo costuma ser usado para preparar ou reformar novas áreas, ou já convertidas, para agricultura ou pastagem, visando o próximo ciclo de produção. Sem técnica e preparo, a queima pode escapar e virar um incêndio. Há também o uso do fogo como a última etapa do processo de desmatamento: depois de derrubada da camada mais densa da vegetação nativa, a ignição terminaria de “limpar” a área. Já o fogo criminoso, independente da origem, tem como finalidade única a destruição.
Mesmo com a queda no desmatamento, a Amazônia brasileira viu um aumento de 36% nos incêndios florestais em 2023 em relação a 2022, mostra uma <a href="https://ipam.org.br/bibliotecas/amazonia-em-chamas-no-12-entendendo-a-relacao-entre-o-fogo-e-desmatamento-em-2023/">nota técnica</a> publicada pelo IPAM em junho deste ano.
Os incêndios tornaram-se tão presentes na maior floresta tropical do mundo que convencionou-se chamar de “temporada do fogo” a estação seca na porção centro-sul da Amazônia, quando as chuvas dão brecha para o acúmulo de material orgânico inflamável no solo queimar. Nos últimos sete anos, por exemplo, 81% dos focos de calor na Amazônia ocorreram nesta “temporada”, entre os meses de agosto e novembro.
Só que ninguém quer respirar partículas de floresta queimada, nem do Cerrado ou do Pantanal em chamas, para saber que não precisa ser assim. A preparação é vital para evitar o pior cenário. Extremos do clima, a exemplo da seca que agrava o alastramento do fogo, acabam multiplicando perdas como a morte do brigadista do Prevfogo Uellinton Lopes dos Santos, em combate a incêndios florestais em Mato Grosso.
O Brasil deve se preparar não só para promover um futuro saudável para sua população, mas para encarar o presente. A maior parte do território nacional vivencia hoje sua pior seca, de acordo com o Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento de Desastres Naturais). E ao que tudo indica o futuro não será melhor.
A aprovação da Política Nacional do Manejo do Fogo é um exemplo de como o país deve direcionar a redução do uso do fogo. A realidade de cada bioma demanda ações adaptadas: uma floresta tropical não pega fogo sozinha, porém, tampouco uma savana sem chuva e raios, que seriam uma das raras causas de fogo natural no Cerrado.
Para além da política, precisamos de mais fiscalização, de mais informação sobre os riscos do fogo, mais treinamento para a prevenção e o combate. Isso passa por investimentos em pesquisa, no trabalho de campo e na contratação de mais profissionais brigadistas com condições de trabalho o ano todo. A educação da população é também outro imperativo para lidarmos com as novas ameaças advindas de um planeta em emergência climática.
Os pelotões e brigadistas combatendo o fogo deveriam estar de prontidão para fazer isso em casos de exceção, mas essa demanda parece estar virando a regra. A prevenção e o controle do fogo por quem coloca são fatores preponderantes para que não precise haver combate. Em um cenário inflamável como o atual, riscar o fósforo requer muita responsabilidade e um senso de coletivo muito importante. Afinal, uma queimada fora do lugar ou um fogo não controlado podem ter efeitos cascata inimagináveis.
Estamos diante de mais um alerta para nos prepararmos para as mudanças climáticas e ainda somando danos a cada novo fato, da seca do rio Negro, no Amazonas, às enchentes no Rio Grande do Sul.
A boa notícia é que temos as condições de enfrentar as mazelas do clima e do fogo com legislação, com qualidade técnica das equipes do Prevfogo, do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), dos Corpos de Bombeiros, das polícias ambientais, da Defesa Civil, entre tantos outros ativos. Nossa capacidade de processamento de imagens de satélite também deve ser aproveitada em sistemas de monitoramento, ajudando a tornar a prevenção e o combate mais efetivos.
O questionamento permanece, porém: com todos os alertas de perigo, por que ainda não estamos cuidando de nossa casa, da natureza e do meio ambiente, como deveríamos? Com a resposta, os eleitores e as eleitoras que escolherão os novos líderes municipais.

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JOTA

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