
A vacina contra Covid-19 pode ter efeitos que vão além de reduzir a forma grave da doença. Dados inéditos de um estudo feito pela Fundação Oswaldo Cruz de Minas Gerais indicam que o imunizante diminuiu pela metade o risco de desenvolver a Covid longa. No grupo de não vacinados, com 650 pessoas, 50% apresentaram sintomas tardios da doença.
“Já entre aqueles que tomaram duas doses de imunizantes, os casos identificados de Covid longa foram de 25% em um ano de monitoramento”, afirma a pesquisadora Rafaella Fortini, coordenadora do estudo. O grupo de vacinados tem 3.000 pessoas. “Nem todos tiveram Covid. E dos que tiveram, notamos que a frequência de sintomas tardios foi menor.”
Diante do recente aumento de casos de infecção, a constatação do estudo da Fiocruz reforça a importância de garantir que a população complete o esquema vacinal.
Os efeitos tardios da Covid preocupam sociedades médicas e autoridades sanitárias por diversos motivos. O risco de desenvolver sintomas tardios existe para todos que tiveram a doença, independentemente da gravidade. “Mesmo pessoas que tiveram a forma assintomática podem apresentar os sintomas de forma tardia”, diz Rafaella.
A lista dos problemas é extensa. No grupo analisado pela Fiocruz, foram 23. E quanto mais os estudos avançam, mais formas de sintomas ou sequelas são identificadas. Entre os mais descritos estão fadiga, tosse persistente, dores de cabeça, enxaquecas, problemas de olfato. Mas há também trombose, insônia, ansiedade, depressão, transtornos cognitivos e perda de memória, dificuldades motoras e descontrole da hipertensão arterial. “Alguns pacientes, por exemplo, que tinham a doença controlada, depois da Covid passaram a ter muito mais dificuldade em manter os níveis de pressão arterial em níveis considerados adequados”, conta.
Os dados até agora reunidos indicam que pessoas que já apresentavam alguns problemas de saúde como hipertensão, diabete, cardiopatias, doença renal crônica, tabagismo ou alcoolismo têm mais risco de ter sequelas. Mas os casos são identificados em todas as faixas etárias. “Há ainda muito o que se pesquisar sobre esse tema. Precisamos entender como a doença se instala, por que algumas pessoas têm sequelas, mesmo em casos leves”, afirma a professora.
Os sintomas, em alguns casos, surgem três meses depois da infecção aguda.
Não existe ainda uma análise sobre o impacto da Covid longa aos sistemas de saúde. Mas não há dúvida de que eles são relevantes, sobretudo quando se leva em conta que serviços já estão demandados por doenças crônicas agravadas ao longo dos dois anos da pandemia. É mais um fator a pressionar a sociedade que já está adoecida.
Há ainda muitas perguntas sem resposta sobre a Covid longa. Rafaella, no entanto, está convicta da necessidade de treinar profissionais de saúde para identificar e tratar pessoas com sequelas tardias da infecção. “É importante ampliar o atendimento. Profissionais precisam estar treinados para ouvir as queixas de pacientes, fazer a relação com infecção e dar o encaminhamento necessário”, assegura.
O Ministério da Saúde repassou para o Fundo Nacional de Saúde, aos Fundos Municipais e Distrito Federal R$ 160 milhões para tratamentos de pacientes que sofrem problemas relacionados com a Covid-19. Em nota, a pasta informou que foram registrados entre outubro de 2021 e abril deste ano 8.570 atendimentos hospitalares e 23 mil na atenção primária. Foi preparado também um manual para avaliação e tratamento de condições pós-Covid e um curso de reabilitação para pacientes.
“São medidas importantes, que precisam ser reforçadas. O setor público precisa estar organizado, e profissionais preparados para fazer o rápido diagnóstico e o direcionamento para melhor atendimento. Não é algo pouco importante. As sequelas podem ser muito sérias”, diz Rafaella.
E mais um motivo, completa, para que medidas sejam adotadas a fim de evitar a infecção e a reinfecção. “São inúmeras as razões para fazer com que completemos o esquema vacinal e para que mantenhamos medidas de proteção.”
Um outro dado que chama a atenção do estudo coordenado por Rafaella é o risco à saúde, mesmo em casos em que a Covid é considerada leve. Dos 59% de pacientes que tiveram infecção leve e manifestaram Covid longa, 25% tiveram problemas cognitivos e falhas de memória. “Precisamos ficar atentos. E vacinados.”
A pesquisa foi feita a partir de dados coletados de pacientes atendidos em dois hospitais de referência de Belo Horizonte, profissionais e funcionários dos hospitais