Menos de dois meses depois da decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinando que o rol da ANS é taxativo, com algumas exceções, o Congresso se prepara para aprovar um projeto de lei que vai na direção contrária.
A expectativa é que a proposta seja votada no Senado na próxima semana, depois de uma rápida tramitação na Câmara dos Deputados. Até agora, nem mesmo a pausa do recesso parlamentar atrapalhou o ritmo da avaliação do texto, construído a várias mãos por um grupo de trabalho criado pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).
Foram várias as idas e vindas de propostas e a versão discutida nesta quarta-feira (3) e aprovada no plenário da Câmara aparentemente chega a um consenso.
Segundo o texto, cabe à ANS preparar uma lista de procedimentos e terapias que operadoras de saúde são obrigadas a oferecer a seus clientes. O que estiver fora da relação, periodicamente revista pela agência, não tem garantia de cobertura. Mas, a exemplo do que decidiu o STJ, com algumas exceções. É justamente isso o que muda. As condições em que, mesmo não estando na lista, procedimentos, terapias e medicamentos têm de ser ofertados pelos planos a seus clientes.
“É uma proposta mais justa, que traz tranquilidade para as famílias”, afirma a deputada Alice Portugal (PCdoB-BA), que participou do grupo de trabalho que preparou o PL.
O texto prevê que planos são obrigados a oferecer cobertura para procedimentos que não estão no rol desde que exista comprovação da eficácia, baseada em evidências científicas e plano terapêutico. Lista ainda outras duas hipóteses: o procedimento recomendado pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS ou ainda que exista recomendação de no mínimo um órgão de avaliação de tecnologia em saúde com reconhecimento internacional e aprovada naquele país.
Lira condicionou a apreciação do texto no plenário da Câmara ao compromisso de que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), também levaria o PL 2033/22 para votação na próxima semana. E a ideia é que não haja mudanças.
Na tarde desta quarta, deputados, senadores e representantes de associações de pacientes ouviram de Pacheco que ele colocará o texto em votação na próxima semana. A expectativa é que isso ocorra na quarta-feira (10). O relator ainda não foi definido. Dois nomes estão em análise: Nelsinho Trad (PSD-MS) e Romário (PL-RJ).
“Essa nova versão não é uma conquista de direito. Ela apenas repõe aquilo que o STJ havia retirado”, afirmou depois da reunião Carla Borges Bertin, fundadora do Autismo Legal. O presidente da Agência Nacional de Saúde Suplementar, Paulo Rebello, participou dessa reunião. E acompanhou de perto ao longo do último mês os encontros realizados pelos deputados do grupo de trabalho.
“Não é o texto que gostaríamos”, afirmou Rebello ao JOTA. “Mas é o que foi possível.” O presidente da ANS diz que o ideal seria amarrar dois critérios para aprovação: “Não ser apenas o critério da aprovação científica ou aprovação por um órgão de avaliação de tecnologia, mas ambos. Caso fossem necessários dois critérios, haveria maior segurança.” O argumento de Rebello é que o critério de comprovação de eficácia é muito vago. “A publicação de um artigo científico numa revista de reputação questionável seria comprovação?”, indaga. E justamente por ser vago, pode acabar provocando questionamentos na Justiça.
O compromisso é que seja votado na semana que vem. Mas nada garante que o texto do Senado seja idêntico ao da Câmara. A palavra “e” pode parecer um detalhe. Mas provoca na prática uma enorme diferença.