Um medicamento essencial para indução do parto e tratamento de hemorragias em mulheres que acabaram de dar à luz, a ocitocina, está em risco de desabastecimento no país. Laboratórios decidiram interromper a produção e, atualmente, apenas um fabricante abastece a demanda nacional. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), já foi comunicada sobre a situação e a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) emitiu uma nota, semana passada, sugerindo a adoção de planos de contingência.
Em entrevista ao Jota concedida em fevereiro, a diretora da Anvisa, Meiruze Freitas, afirmou que o problema está associado à falta de interesse comercial. Embora estratégico, o medicamento é vendido a preços considerados pouco atrativos pela indústria. Nesses casos, são poucas as alternativas para atender à demanda. Pela regra atual, empresas devem comunicar previamente a decisão à Anvisa, para que ela possa identificar outros potenciais fabricantes. São alternativas, mas que nem sempre funcionam na velocidade desejada.
Não é a primeira que a desistência na produção de medicamentos tira o sono de autoridades sanitárias. Entre 2016 e 2017, o Brasil enfrentou a falta de penicilina, antibiótico essencial para o tratamento de sífilis. Os reflexos foram trágicos. Um aumento da doença no país, inclusive de casos de infecção congênita – que são totalmente evitáveis quando gestantes fazem o tratamento correto, no tempo adequado.
Os dois casos são citados por analistas para mostrar a urgência na revisão da política de preços de medicamentos no país. O mercado é regido por regras criadas há duas décadas e, avaliam, é necessário fazer reparos para tornar o mercado menos engessado.
Ano passado, a discussão sobre a precificação ganhou fôlego, com a abertura de consulta pública de uma proposta do Ministério da Economia. As contribuições encerraram-se e a equipe da pasta trabalha agora numa proposta de texto, que será apresentada para a Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos.
Como o Jota Pro Saúde mostrou a seus assinantes semana passada, entre as discussões está a de possibilitar a revisão dos preços – para cima ou para baixo – depois do registro do medicamento, o que não acontece regularmente nos dias de hoje. Pela regra atual, a praxe é que, uma vez registrado o medicamento e definido o preço, ele seja apenas reajustado anualmente, de acordo com as regras previstas pela CMED.
Além da revisão periódica, a equipe estuda também vincular preços de medicamentos inovadores a desempenho, com regras claras para preços provisórios.
A proposta do ministério sobre o tema somente será apresentada à CMED para debate quando for concluído um estudo de impacto regulatório. Essa etapa já está em curso.
A abertura da consulta pública veio acompanhada de muitas críticas. A Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), por exemplo, emitiu em setembro uma nota solicitando a suspensão do processo. Entre os argumentos estava o de que uma proposta com tamanha repercussão na vida dos brasileiros deveria vir acompanhada da apresentação pública dos dados, da realização de estudos de impacto regulatório e de audiências públicas.
Foram várias as ponderações apresentadas pela Abrasco. Entre elas, a de que as regras de precificação devam ser norteadas por razões sanitárias. É preciso, diz a associação, ter regras para impedir o aumento desproporcional de preços e a consequente diminuição de acesso.
Uma das sugestões da associação é ampliar a cesta de países usados como referência para a fixação de preço. A crítica comum é de que hoje são levados em consideração poucos países para a análise do preço quando da entrada do produto no país. E mais: muitos destes produtos poderiam, com o passar do tempo, ter seu preço reduzido.