Opinião e Análise

Luciano Benetti Timm

Jacqueline Salmen Raffoul

Maria Carolina França

Órgãos de defesa do consumidor vêm condenando empresas fabricantes de celular pela venda de aparelhos sem os adaptadores de energia, com a aplicação de sanção de multa de R$ 12 milhões e proibição de venda de aparelhos sem os mesmos adaptadores. Os principais embasamentos da decisão consistiram nos seguintes argumentos: 1) houve venda casada pela suposta necessidade de aquisição de adaptadores de forma separada; e 2) não foi verificado o alegado benefício da sustentabilidade.  
A decisão foi polêmica e gerou debate sob diferentes pontos de vistas. Com o devido respeito à Senacon e ao Procon-SP, o presente artigo busca apresentar contra-argumentos, com questionamentos e reflexões baseados principalmente na: 1) livre iniciativa e liberdade econômica; 2) potencialidade de aumento de preços gerado pela venda casada imposta aos fabricantes que agora precisam vender os dois produtos, prejudicando a concorrência no mercado de adaptadores; 3) informação aos consumidores sobre a alteração da comercialização dos aparelhos. Sobre a discussão ambiental, deixaremos o debate para outra oportunidade, por limitação de escopo, remetendo-os a <a href="https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/coluna-da-abde/resolucao-cvm-59-divulgacoes-esg-15022022">outro artigo publicado sobre ESG nesta coluna</a>.
A atuação de órgãos de proteção dos consumidores preza pela observância dos direitos e princípios do Código de Defesa do Consumidor (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/cdc">CDC</a>). No entanto, o CDC não pode ser aplicado de forma isolada, nem de maneira dogmática e sem ponderar as consequências da decisão administrativa, que é exigência do artigo 20 da Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/lindb">LINDB</a>). E existem suficientes riscos não ponderados de aumento de preços aos consumidores e prejuízo à concorrência no mercado produtor de carregadores. Explica-se. Ao serem obrigados a fornecer o adaptador em conjunto com o aparelho celular, há potencial de reflexo no preço da mercadoria a ser adquirida. É verdade que alguns poderiam dizer que a venda separada desses produtos não reduziu o preço dos aparelhos celulares.  
Nesse caso, a discussão deve ser baseada em evidências científicas e não em ideologia ou intuição. Trata-se de um tema clássico em Ciência Econômica. Por que preços baixam ou aumentam? Na verdade, o simples não aumento de preços de aparelhos celulares vendidos separadamente dos adaptadores pode significar que a separação foi positiva para os consumidores, pois, se vendidos conjuntamente, como querem órgãos de defesa do consumidor, os preços desse “pacote” poderiam sim ter aumentado. Não podem os órgãos de defesa do consumidor simplesmente presumirem coisas, sem demonstrar, sem trazer provas assim como não podem ignorar evidências científicas trazidas pelas empresas. 
Essa ponderação também é uma exigência da Lei de Liberdade Econômica (LLE) na sua <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/analise-de-impacto-regulatorio">Análise de Impacto Regulatório</a> (AIR), obrigatória para o Ministério da Justiça. O Código do Empreendedor também vincula o Procon-SP ao mesmo caminho. Note-se, nesse mesmo sentido, que, recentemente, em tema de dupla visitação, o Procon-SP reconheceu a aplicabilidade da Lei de Liberdade Econômica e o Código do Empreendedor no âmbito das relações consumeristas. 
Além disso, ainda nesse campo do Direito Econômico, salienta-se que os princípios constitucionais relativos à ordem econômica devem ser considerados, especialmente a livre iniciativa e livre concorrência. Nesse sentido, a empresa é livre para negociar bens e serviços sem a interferência indevida do Estado. Essa intervenção do Estado, se não ponderados seus efeitos, pode até prejudicar os consumidores no final do dia, como em tema de preços (como anteriormente comentado), mas também para concorrência.
Vale dizer, há atualmente um mercado de fabricantes de adaptadores de energia que concorrem com as marcas de fabricantes de aparelhos. Naturalmente, que fabricantes de celulares tenderão (até por eficiência de escala e redução de custos de transação) a negociar seus próprios adaptadores, eliminando a concorrência nesse mercado “secundário” de adaptadores. Já foi uma preocupação do Cade que fabricantes de veículos dessem preferência às suas próprias peças de reposição. De modo que se pode dizer que a venda separada de celulares e adaptadores é pró concorrência. E, nesse sentido, por implicação, benéfica aos consumidores.  
Nesse contexto, os consumidores possuem plena liberdade na escolha dos produtos; quanto mais opções, melhor! Com a clareza sobre a oferta, é possível que optem por adquirir o produto do fabricante e o adaptador de outro fabricante; assim como possam optar pelas marcas que concorrem livremente no mercado. No entanto, caso os consumidores não estejam satisfeitos com a forma de comercialização das mercadorias, existem outras opções disponíveis no mercado, que podem atender as diferentes preferências.  
Portanto, decisões na seara do direito do consumidor devem observar os preceitos constitucionais da liberdade econômica, como meio de buscar o melhor interesse da sociedade e garantir ao consumidor o exercício de sua liberdade de escolha nas relações de consumo.

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JOTA

Medidas na seara do direito do consumidor devem observar os preceitos constitucionais da liberdade econômica

Ponderações sobre a decisão no caso dos adaptadores frente à ordem econômica

Decisões na seara do direito do consumidor devem observar os preceitos constitucionais da liberdade econômica