Opinião e Análise

Luciano Benetti Timm

Raphael Boechat Alves Machado

Recentemente, o <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/ministerio-da-agricultura">Ministério da Agricultura</a> e Pecuária (antigo MAPA, hoje MAP) enviou, aos agentes econômicos do setor por ele regulado, o Ofício Circular 2/2023/CGI/DIPOA/SDA/MAP – que determina o recolhimento das rotulagens que contenham os seguintes indicadores: "gourmet", "ouro", "premium", "reserva", entre outros.
Entendeu o órgão fiscalizador que estas expressões diferenciadas (ainda que protegidas pelo direito fundamental de propriedade intelectual) poderiam induzir o consumidor em erro, quando não trouxessem consigo reais ganhos de qualidade no produto, os quais também devem constar na rotulagem. Assim, uma mera marca “ouro” pode ser considerada “enganosa” pelo MAP, quando aquele produto não contém destaque ou método produtivo que o lastreie a ser assim considerado.
Sobre esse tema, algumas considerações merecem ser evidenciadas, já que as marcas acima estão registradas no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/inpi">INPI</a>), que é o órgão público com competência legal para escrutínio de propriedade intelectual; e, justamente por serem marcas renomadas, são reconhecidas e consagradas pelos consumidores.
E é esse o ponto de partida para se analisar o tema. A marca, quando da submissão ao seu pedido de registro no INPI já teve checada a sua veracidade, a sua novidade e a sua arte inventiva para designar aquele determinado produto, caso contrário não seria passível de registro. Prova maior disto é que a própria Lei de Marcas e Patentes já disciplina que:
“Art. 124. Não são registráveis como marca:
 X - sinal que induza a falsa indicação quanto à origem, procedência, natureza, qualidade ou utilidade do produto ou serviço a que a marca se destina;”
Logo, inicialmente, revelar-se-ia inócua e ilegal a mencionada pretensão fiscalizatória do MAP, já que essa autenticidade teria sido objeto de checagem pelo órgão competente, o INPI. Além de ser absolutamente ineficiente e trazer substancial insegurança jurídica.
Quanto a esta atuação “subsidiária”, parece haver inegável vício de competência, tema este inclusive já evidenciado na decisão judicial do processo Nº 5003282- 41.2022.4.04.7016/PR, no qual o em. juízo assim considera: “Por isso, como preceitua o caput do art. 495 do decreto em destaque, as medidas cautelares nele previstas serão aplicadas apenas se houver evidência ou suspeita de que um produto de origem animal represente risco à saúde pública ou tenha sido adulterado, o que, em análise prefacial, não é o caso dos autos.”
Mas, as ilegalidades parecem ir além do vício de competência, haja vista que a ausência de elementos concretos de motivação denota que a atuação do MAPA não tem lastro na realidade para dizer se a marca “A” ou “B” traz consigo o lastro de metodologia produtiva que deveria ter. Parece que estamos esquecendo que órgãos públicos deviam atuar com base em evidências científicas e não em critérios subjetivos e arbitrários do que é enganoso.
Mas, não se trata apenas de ineficiência ou ilegalidade; há também consequências nefastas por trazer riscos à inovação, já que a propriedade intelectual, como já escrevemos aqui, é um dos motores do processo inventivo.
Nesse sentido, sob o ponto de vista econômico e de mercado, naturalmente a danosidade se projeta como mais grave do que aquela detectada pela teoria do direito administrativo, já que as marcas, por representarem sinais distintivos de produto ou serviço, são vistas pelos consumidores com características próprias de preferência ou mesmo de competição.
Ao se intervir no mercado dessa forma, impondo um verdadeiro anonimato entre os produtos, já que tudo passa a ser “presunto” ou “mortadela”, o MAP acaba por desconsiderar anos de investimento e posicionamento de mercado das empresas, que permitiram ao público consumidor identificar e adquirir o produto de sua preferência ou mesmo a indústria direcionar produtos para determinados nichos.
Trata-se de uma atuação que não parece preocupada com seus efeitos ou mesmo com os consumidores que diz tutelar, já que não são apresentadas justificativas sólidas para se retirar do mercado produtos, muitas vezes consagrados, pelo grande público.
Volta-se ao dito pelo em. Juízo no processo mencionado:
“Há, enfim, aparente invasão de atribuição que, a rigor, pertence ao Ministério da Justiça e Segurança Pública para promoção da defesa da ordem econômica nacional e dos direitos do consumidor (v. art. 14, inciso XI, "f", da Lei nº 9.649/98). Ainda, a corroborar a conclusão de que as medidas cautelares aplicadas exorbitaram das finalidades para as quais estão dispostas, de defesa da saúde pública, a autora discorre possuir o registro das marcas contestadas há mais de 20 anos, explorando-as comercialmente, sem que se tenha conhecimento que o consumo desses produtos, o que ocorre desde longa data, tenha dado causa a algum dano ou colocado em risco à saúde dos consumidores.”
A própria dúvida criada pelas autoridades já, por si só, desprovida de embasamento científico econômico e neurocientífico, caracteriza indevida atuação do Estado, ainda mais desprovida de Análise de Impacto Regulatório.
A <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/lei-liberdade-economica">Lei de Liberdade Econômica</a> e a LINDB devem ser evocadas, a fim de impor que a regulação dos órgãos de fiscalização do agronegócio como o MAP respeite a livre iniciativa, evite a discricionaridade, que ocorra de maneira proporcional, levando em conta os efeitos que geram à concorrência e à inovação no mercado. Afinal, o agronegócio é um dos poucos setores econômicos em que o Brasil tem competitividade internacional.

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JOTA

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