Opinião e Análise

José David

O crescimento da população mundial, somado ao desenvolvimento socioeconômico dos países emergentes e às alterações climáticas e seus eventos cada vez mais extremos, tem aquecido a demanda por fontes limpas de geração de energia, colocando o Brasil no centro da arena global de produção e fornecimento do principal insumo para crescimento dos países e suas economias.
A matriz energética mundial é, ainda, largamente de origem fóssil não renovável. Dados recentes da Fundação Getulio Vargas<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a> indicam que, em 2019, somente o carvão, o petróleo e o gás natural representavam aproximadamente 84% da fonte energética do planeta. No mesmo ano, essas fontes representavam 53% da matriz energética brasileira — um número ainda longe do ideal, que, contudo, indica uma matriz substancialmente mais limpa do que a média mundial em relação ao tema.
No contexto da matriz energética brasileira, nota-se uma proeminência da fonte hidrelétrica (com aproximadamente 13% de participação) e, principalmente, das derivadas da cana-de-açúcar (19% do total), de acordo com dados da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) do Ministério de Minas e Energia (MME) do Brasil<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a>. Importante destacar que os dados mencionados se referem à matriz energética  como um todo – que engloba desde a energia elétrica necessária para acender uma lâmpada até o combustível usado para o funcionamento dos veículos automotores –, e não apenas à matriz elétrica, na qual a fonte hidráulica, no Brasil, ultrapassa 65%.
Nesse sentido, a matriz energética é formada por múltiplas fontes de geração de energia, e no que diz respeito especificamente aos combustíveis, o Brasil é exemplo mundial na pesquisa, desenvolvimento, produção, utilização e, aos poucos, exportação de fontes limpas de geração de combustão em motores. O exemplo mais evidente e que hoje está presente na vida de quase todos os brasileiros é o etanol obtido da cana-de-açúcar e disponibilizado nos postos de combustíveis a preços competitivos em relação à gasolina e ao diesel resultantes do processo de transformação do petróleo.
O etanol produzido pela cadeia sucroalcooleira brasileira é um exemplo de como a pesquisa e o investimento no campo geram benefícios para toda a sociedade. Hoje, tanto o etanol hidratado, com até 7,5% de água em sua composição e comercializado na rede de abastecimento do país, quanto o etanol anidro, que possui no máximo 0,7% de água em sua formação e é misturado à proporção de 27% da gasolina tipo C, representam 48% da matriz de transportes no Brasil, impedindo que 600 milhões de toneladas de CO2 tenham sido despejadas no meio ambiente desde 2003, de acordo com projeções e dados da União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia (Unica)<a href="#_ftn3" name="_ftnref3">[3]</a>.
Complementarmente ao etanol obtido da cana-de-açúcar, um recente e tão interessante quanto modelo de produção de combustível renovável vem ganhando força na matriz energética nacional: trata-se do etanol de milho, obtido da moagem do grão. A União Nacional do Etanol de Milho (Unem) estima uma produção aproximada de 4,5 bilhões de litros desse combustível renovável na safra 2022/2023, um incremento de 31% em relação à safra anterior, e a <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/anp">Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP)</a> prevê que ao menos 11 novas plantas produtoras e sete ampliações de estruturas já existentes serão colocadas em funcionamento nos próximos anos. Há vários argumentos e iniciativas legislativas que sustentam essa euforia no setor.
Relativamente ao etanol de setor sucroalcooleiro, o etanol obtido do milho apresenta rendimento superior: uma tonelada de cana-de-açúcar produz entre 70 e 85 litros de etanol hidratado, ao passo que uma tonelada de milho gera até 460 litros de etanol, a depender do teor do amido. Ademais, todo o milho é aproveitado no processo de obtenção do etanol, gerando como subproduto, além da vinhaça, ração animal de alto valor proteico e óleo para produção de biodiesel. Outra vantagem diz respeito ao processo produtivo, mais simplificado do que o de obtenção do etanol da cana-de-açúcar, de modo que as plantas já existentes de produção de etanol da cadeia sucroalcooleira podem perfeitamente trabalhar a produção do etanol do milho, gerando atividade e lucros tanto na safra quanto na entressafra da cana-de-açúcar.
No campo das normas, destaca-se a promulgação da PEC 15/2022, que deu origem à <a href="https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc123.htm">Emenda Constitucional 123</a>, de 14 de julho de 2022, a qual alterou o artigo 225 da Constituição Federal. Esta alteração estabeleceu a preservação de regime fiscal favorecido, especialmente em relação ao Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), sobre o preço do etanol hidratado, quando comparado ao preço da gasolina. Assim, foi estabelecido mandamento de natureza constitucional no sentido de reduzir a tributação dos biocombustíveis, especialmente o etanol de cana-de-açúcar e de milho, comparativamente à tributação incidente sobre os combustíveis de matriz fóssil, tais como a gasolina, o diesel e o gás natural.
Neste contexto, observa-se uma política clara do Brasil em relação ao fomento à produção de etanol, ainda, notadamente, para consumo interno. Essa política não apenas estimula os setores sucroalcooleiro e da cadeia do milho como, também, oferece alternativas mais baratas e ecologicamente sustentáveis ao consumidor de combustíveis brasileiro. Sob o ponto de vista da dinâmica de produção, o crescimento e fomento da cadeia do etanol de milho fornece destinação adicional ao grão, ao passo que gera novas frentes de produção de energia renovável e barata e oferece às usinas de cana-de-açúcar a possibilidade de produzirem mais açúcar em tempos de maior rentabilidade sem que seja prejudicada a demanda doméstica por etanol.
Ademais, o aumento e as boas perspectivas para produção de etanol de milho no Brasil colocam o país ainda mais em evidência e em condições para fornecer combustíveis renováveis ao mundo, se assim quiserem as demais nações e se os acordos e tratativas comerciais em trâmite continuarem a abrir mercados e oportunidades para o agronegócio brasileiro no mundo. A demanda <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/esg">ESG</a> em todo o planeta, aliada às quebras de fornecimento de gás natural e à elevação de preços do barril de petróleo em tempos de incertezas geopolíticas, pode fornecer ao Brasil novas oportunidades de suprimento, especialmente no médio e longo prazo, das demandas internacionais por combustíveis de matriz energética limpa e renovável.
Vale destacar que a cadeia produtiva de etanol a partir da cana-de-açúcar ainda é extremamente relevante e dominante no que diz respeito à produção de combustíveis não fósseis no país. O investimento na cadeia do etanol de milho, bastante promissora, é uma realidade e tende a aumentar ao longo do tempo, havendo oportunidades e espaço para o crescimento e o desenvolvimento de ambas as cadeias no contexto de um Brasil ambientalmente sustentável e de um mundo cada vez mais sedento e necessitado de alternativas energéticas limpas, baratas, seguras e perenes.
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<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> Conforme conclusão do Centro de Estudos de Energia (FGV Energia), disponível em <a href="https://fgvenergia.fgv.br/dados-matriz-energetica">https://fgvenergia.fgv.br/dados-matriz-energetica</a>. Consulta em 1º/8/2022.
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> Conforme dados disponíveis em <a href="https://www.epe.gov.br/pt/abcdenergia/matriz-energetica-e-eletrica">https://www.epe.gov.br/pt/abcdenergia/matriz-energetica-e-eletrica</a>. Consulta em 1º/8/2022.
<a href="#_ftnref3" name="_ftn3">[3]</a> Conforme informações disponibilizadas em <a href="https://unica.com.br/setor-sucroenergetico/etanol/">https://unica.com.br/setor-sucroenergetico/etanol/</a>. Consulta em 1º/8/2022.

milho

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JOTA

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