Opinião e Análise

José David

Finalizadas as <a href="https://www.jota.info/eleicoes/lula-vence-segundo-turno-e-e-eleito-presidente-do-brasil-pela-terceira-vez-30102022">eleições gerais de 2022</a>, foram eleitos novos representantes do povo. Deputados estaduais, federais, senadores, governadores e presidente da República foram definidos em um ambiente de polarização exacerbada e incertezas quanto à condução de políticas econômicas, sociais e setoriais para o Brasil. Com o agronegócio não seria diferente.
No âmbito das Assembleias estaduais, nota-se uma acentuação da polarização política com o crescimento dos representantes eleitos pertencentes a agremiações políticas identificadas mais à direita e à esquerda do que ao centro, espectro esse que perdeu espaço nos fóruns estaduais legislativos.
<a href="https://www1.folha.uol.com.br/poder/2022/10/centro-perde-espaco-para-direita-nas-assembleias-legislativas.shtml">Levantamento realizado pela Folha de S. Paulo</a> indica que estados da federação onde a cadeia do agronegócio é relevante na economia, na geração de empregos e na sociedade como um todo guinaram, majoritariamente, à direita, com destaque para bastiões tradicionais do setor, como Goiás; novas fronteiras, como Tocantins; e novíssimas fronteiras, como Roraima. Maranhão e Piauí, contudo, estados que compõem a nova fronteira do Matopiba e que mostram forte crescimento no setor, apresentaram manutenção da vertente predominantemente mais à esquerda nas respectivas Assembleias.
Nesse contexto, observa-se, em síntese, que em determinadas regiões do país os assuntos de interesse do setor agropecuário e de competência dos estados da federação poderão enfrentar menor resistência política, tais como as deliberações acerca do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) (desde que haja respaldo por Convênio do Conselho Nacional de Política Fazendária, o Confaz), de patrulha rural e segurança no campo e as deliberações sobre pulverização aérea, dentre muitos outros temas que afetam e interessam diretamente ao setor.
Na esfera nacional, os deputados federais e os senadores da República eleitos, os quais comporão a Câmara dos Deputados na legislatura 2023-2026 e o Senado na legislatura 2023-2030, formaram um bloco com maior tendência conservadora e ligação direta com o segmento do agronegócio. Os números oficiais apontam predominância de partidos políticos mais ao centro e à direita no rol dos deputados federais eleitos, com destaque para PL (99 cadeiras), União Brasil (59), PP (47), MDB (42) e Republicanos (41), histórica e pragmaticamente alinhados às pautas do setor, havendo também, em menor escala, representantes do PT (68) e PSD (42) nas maiores bancadas. No Senado, o cenário é bastante semelhante: há predominância de representantes do PL (13 cadeiras), União Brasil (12), MDB (10) e PP (7), com PSD (10), mais ao centro, e PT (9), à esquerda, como contrapartida.
Esse alinhamento do Parlamento, ao menos no papel, em relação às pautas mais conservadoras e, por consequência, aos temas mais caros ao agronegócio pode gerar um fortalecimento da já robusta Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), bancada de enorme influência e poder dentro dos corredores das Casas Legislativas do Brasil. Alguns assuntos sensíveis ao setor, tais como manutenção de incentivos fiscais em eventual reforma tributária, questões relacionadas à defensivos agrícolas e até a natimorta, mas sempre presente, ideia de tributação das exportações do setor podem ser objeto de forte resistência por parte dos representantes do povo e das unidades federativas.
É importante destacar, contudo, que a história e o perfil do Parlamento brasileiro indicam que os ventos podem soprar em diversas direções. A mera filiação a determinada agremiação política não significa, por si só, uma previsibilidade de manifestação e voto em nossa jovem democracia. No mesmo sentido, o fato de um partido político ter estado, ao longo dos últimos tempos, alinhado às pautas do agronegócio não significa que os ventos continuarão a soprar nessa direção em um novo governo, com viés de centro-esquerda e possíveis conflitos com as pautas do campo, dos fornecedores de insumos e da indústria agropecuária. As costuras políticas e a ocupação dos espaços de poder ditarão os próximos capítulos.
No plano dos estados, os governadores eleitos devem manter a condução de políticas econômicas e sociais sem grandes sobressaltos. Destaque para o <a href="https://www.jota.info/eleicoes/tarcisio-de-freitas-e-eleito-governador-de-sao-paulo-30102022">fim da hegemonia de décadas do PSDB em São Paulo</a>, com forte guinada ao bolsonarismo, e a reviravolta na Bahia, onde o <a href="https://www.jota.info/eleicoes/jeronimo-rodrigues-do-pt-e-eleito-governador-da-bahia-30102022">PT se manteve no poder</a>, diferentemente do cenário apontado no início da corrida eleitoral. Relativamente ao agronegócio, os candidatos eleitos em estados onde o setor tem forte representatividade e penetração tendem a manter o status quo daquilo que já é conhecido.
Ponto de atenção, talvez, para (i) Piauí, Bahia e Maranhão, componentes do Matopiba, em que novos candidatos do PT e do PSB, partidos mais à esquerda do espectro político, foram eleitos e seus anúncios de nomes para o secretariado e de políticas de governo nos próximos dias e meses podem indicar facilidades ou dificuldades para o setor nos próximos anos; e (ii) Pará, onde o governador reeleito, apesar de filiado ao MDB, é aliado político do PT na esfera federal, havendo dúvidas quanto aos posicionamentos e condutas em relação às novíssimas fronteiras agrícolas no sul do estado, especialmente quanto a temas ambientais.
No que concerne à Presidência da República, a alternância de poder a partir de 1º de janeiro de 2023 pode representar uma alteração em políticas relacionadas à preservação ambiental (que tende a ser mais restritiva), à fiscalização das operações nos biomas amazônico e pantaneiro (que deve ser fortalecida), eventual alteração da legislação atinente ao Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR) e sobre a mitigação ou revogação de incentivos fiscais constitucionalmente previstos que possam aumentar, direta ou indiretamente, a carga tributária do setor.
Contudo, o maior receio do agronegócio nacional reside em eventual afrouxamento das políticas relacionadas à invasão de terras e financiamento de grupos que defendem bandeiras de reforma agrária baseadas em afrontamento à lei, à ordem e ao direto constitucional de propriedade. Nesse ponto, há certo tensionamento no segmento rural, especialmente entre os pequenos e médios produtores, acerca do que virá pela frente. Alcunhas e acusações levianas sobre a totalidade do setor ao longo da campanha eleitoral reforçam a desconfiança mútua – um erro estratégico enorme, já que o agronegócio representa substancial fatia da economia brasileira e simboliza aquilo que o Brasil é, de fato, competitivo no mundo.
Destaca-se, ainda, assuntos de natureza jurídica de providencial relevância para o agronegócio nacional e que, apesar de não estarem diretamente relacionados às decisões e manifestações dos representantes eleitos em outubro, podem tomar diferentes contornos a depender de como as forças políticas se comportarão nos próximos anos.
Exemplos disso são os julgamentos do marco temporal para demarcação de terras indígenas (Recurso Extraordinário 1.017.365), aquisição de terras por empresas nacionais com capital estrangeiro (Ação por Descumprimento de Preceito Fundamental 342) e constitucionalidade das desonerações fiscais do ICMS e do IPI para defensivos agrícolas (Ação Direta de Inconstitucionalidade 5.553), dentre outros, como a sub-rogação do Funrural e a constitucionalidade da Lei de Biosegurança, todos pendentes de julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF).
Com a pressão de franjas da sociedade e eventual julgamento após alteração da configuração dos Tribunais Superiores mediante aposentadorias compulsórias e indicações (Poder Executivo) e aprovações (Poder Legislativo) de novos nomes, pode haver maior pendor favorável ou desfavorável para as pautas caras ao agronegócio conforme o perfil dos novos julgadores.
Nesse sentido, o jogo político afeta direta e indiretamente as matérias, pautas e decisões relevantes para o país e o agronegócio brasileiro. Assim, o acompanhamento das tendências e convergências é fundamental para a defesa dos interesses do setor e o planejamento estratégico de ações voltadas ao desenvolvimento não apenas deste segmento, mas do Brasil como um todo.

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JOTA

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