Miriele Vidotti

No último mês de outubro, cirurgiões dos EUA testaram com êxito um transplante de rim de um porco em um paciente humano. O procedimento é um feito para a ciência, tendo em vista que foi a primeira vez que um rim de origem suína foi transplantado para o corpo humano sem a rejeição imediata pelo sistema imunológico humano <a href="#_edn1" name="_ednref1">[1]</a>.
Aos leitores, em geral, a notícia pode causar momentânea estranheza. No entanto, o uso de órgãos, células e tecidos animais em humanos, conhecido como xenotransplante ou transplante interespécie, é uma técnica medicamente em experimento desde a década de 1960, quando começaram a surgir os primeiros estudos sobre o transplante interespécie com a utilização de material biológico de macacos, porcos e ovelhas em outros animais <a href="#_edn2" name="_ednref2">[2]</a>.
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Para que seja possível o xenotransplante com receptor humano, é necessária a clonagem e modificação genética do animal para que o organismo humano não rejeite o material biológico da espécie distinta.
No procedimento realizado na Universidade de Nova York, nos EUA, o receptor era um paciente com morte cerebral e disfunção renal. Após o transplante experimental, os pesquisadores observaram o funcionamento satisfatório do novo rim por três dias.
O experimento obedeceu a todos os critérios éticos e legais para a sua realização e, diante do resultado satisfatório, foi recebido com aplauso pela comunidade científica local e internacional.
Quando em vida e plenamente capaz, o receptor havia se registrado como doador de órgãos post mortem e após a constatação da morte encefálica, a família do paciente autorizou a realização da pesquisa.
O experimento realizado pelos cirurgiões de Nova York fomenta pesquisas com xenotransplante feitas por pesquisadores ao redor do mundo.
No âmbito das pesquisas nacionais em biotecnologia, a técnica do xenotransplante vem sendo estudada há anos pelo Centro de Estudos do Genoma Humano e Células-Tronco da Universidade de São Paulo (USP), de modo que o experimento realizado nos EUA pode representar um referencial importante para a autorização da investigação pré-clínica aqui no Brasil.
A carta constitucional brasileira estabelece a promoção e incentivo ao desenvolvimento científico nacional como dever do Estado, competindo ao sistema único de saúde o fomento ao progresso científico, tecnológico e à inovação em saúde.
Desde que em máxima conformidade com as normas sobre pesquisas científicas com seres humanos — regulamentada pela Resolução n.º 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde —, a liberdade de expressão científica deve ser impulsionada e aclamada enquanto garantia constitucional, nos termos do artigo 5º, IX, da Constituição Federal.
A escassez de órgãos humanos é um desafio da saúde pública brasileira. Neste ano de 2021 o Brasil ultrapassou a marca de 50 mil pessoas que aguardam na angustiante fila de espera por uma doação de órgão <a href="#_edn3" name="_ednref3">[3]</a>.
O transplante interespécie surge como alternativa com potencial para diminuir a carência de órgãos humanos.
O desenvolvimento médico, científico e tecnológico exitoso, em harmonia com o objetivo primordial de destinação sócio-humanitária da pesquisa deve ter seus benefícios compartilhados com toda a comunidade, nacional e internacionalmente.
É o que determina o princípio da cooperação internacional na Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos, aprovada e assinada em 2005 por países membros da Organização das Nações Unidas, entre eles o Brasil e os Estados Unidos.
Os avanços da ciência e da tecnologia alinhados às melhores diretrizes da ética biomédica exercem um papel imperioso no empenho por soluções que buscam não só o restabelecimento da saúde de indivíduos, grupos e populações, mas também que viabilizem um melhoramento da qualidade da vida e existência humanas.
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<a href="#_ednref1" name="_edn1">[1]</a> U.S. surgeons successfully test pig kidney transplant in human patient. Disponível em: &lt; <a href="https://www.reuters.com/business/healthcare-pharmaceuticals/us-surgeons-successfully-test-pig-kidney-transplant-human-patient-2021-10-19/">https://www.reuters.com/business/healthcare-pharmaceuticals/us-surgeons-successfully-test-pig-kidney-transplant-human-patient-2021-10-19/</a>&gt;.
<a href="#_ednref2" name="_edn2">[2]</a> Galvão, F. H. F.; D’Alburquerque, L. A. C. Xenotransplante. Rev. Med (São Paulo). 2020 jan.-fev.;99(1):v-ix. Disponível em: &lt;<a href="https://www.revistas.usp.br/revistadc/article/view/167177/159647">https://www.revistas.usp.br/revistadc/article/view/167177/159647</a>&gt;.
<a href="#_ednref3" name="_edn3">[3]</a> Mais de 50 mil pessoas esperam na fila para serem transplantadas no Brasil. Disponível em: &lt;<a href="https://www.cnnbrasil.com.br/saude/mais-de-50-mil-pessoas-esperam-na-fila-para-serem-transplantadas-no-brasil/"> https://www.cnnbrasil.com.br/saude/mais-de-50-mil-pessoas-esperam-na-fila-para-serem-transplantadas-no-brasil/</a>&gt;.

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JOTA

Transplante interespécie surge como alternativa com potencial para diminuir a carência de órgãos humanos

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