Felipe Recondo

O ministro Gilmar Mendes e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso nada falaram sobre os vazamentos de delações premiadas na Operação Lava Jato que motivaram especificamente as investigações contra o ex-presidente Lula. Do mesmo modo, Lula e seus apoiadores estão silentes diante da divulgação incompleta da lista de citados na delação da Odebrecht, que atinge agora especialmente o PMDB e o PSDB.
Gilmar Mendes deu uma liminar para impedir a posse do ex-presidente Lula na Casa Civil com base numa gravação já no primeiro momento de legalidade duvidosa entre a presidente Dilma e seu antecessor. Apesar de ser o mais notório crítico de certos procedimentos da Polícia Federal e do Ministério Público, não consta que tenha censurado recentemente a divulgação dos áudios pelo juiz federal Sérgio Moro, como o fez o ministro Teori Zavascki ao expor ao classificar a decisão de Moro como "precoce e, pelo menos parcialmente, equivocada".
Os apoiadores de Lula e Dilma podem agora alegar que, quando atacados, seus adversários políticos não saíram em sua defesa. Por que fariam diferente?, questionariam eles. Seria bom que provassem do próprio veneno, diriam. Ao menos, diminuiriam a imagem de que a corrupção era apenas coisa de petista.
[formulario_fulllist]
De duas uma.
 Ou a seletividade e o interesse político por trás das críticas de lado a lado revelam que a preocupação central não é com o devido processo legal, com o resguardo do direito de defesa e a não criminalização antecipada de investigados. É tudo briga pelo resultado, e pelo seu impacto na política. Quem perde ao final é a justiça.
Ou a soma de fatos e decisões do juiz federal Sérgio Moro, que durante o governo Dilma não suscitava críticas generalizadas no Supremo, começa a trazer alguns integrantes do tribunal ao cenário pré-Lava Jato e pré-Mensalão. Era neste Supremo que a súmula das algemas era aprovada, num processo liderado pelo ministro Gilmar Mendes, que ministros notadamente garantistas - como Celso de Mello - dificilmente votavam contra a concessão de habeas corpus em casos de prisão preventiva que superava um ano, em que o discurso de combate à corrupção não se sobrepunha - com tranquilidade - às críticas a eventuais abusos da PF e do MPF.
Por sua vez, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, nada falou sobre o vazamento de informações sigilosas das delações da Odebrecht que, por sinal, vem de há muito tempo. Nem bem estava homologado o acordo, jornalistas competentes já informavam os leitores sobre seu conteúdo. Quem eram os vazadores? Os procuradores? Os advogados? Os próprios delatores? 
O procurador-geral havia, no caso da OAS, suspendido o acordo de delação em razão dos vazamentos de informação. No caso da Odebrecht, entretanto, os vazamentos somam numerosas páginas de jornais, mas as negociações continuaram e foram homologadas mesmo assim.
Janot veio a público, em contundente resposta a Gilmar Mendes, para repelir a acusação de que tenha, a PGR, vazado informações seletivamente. A resposta não ficou restrita à acusação feita por Gilmar Mendes de que a PGR teria cometido crime de violação de sigilo funcional. O que circundava as críticas de Janot era o comportamento do ministro do Supremo e suas relações - criticadas no próprio STF e na PGR - com o governo Michel Temer e com integrantes do PSDB, inclusive investigados no Tribunal.
O que Janot verdadeiramente mirava eram as visitas de Mendes ao Palácio do Jaburu, mesmo sendo presidente do TSE e tendo de julgar a cassação da chapa Dilma-Temer, o jantar oferecido pelo ministro do Supremo ao amigo José Serra, citado de forma expressa na delação da Odebrecht, e as relações abertas do magistrado com o mundo da política. 
No curto prazo, o cidadão comum se beneficia de ver todas as críticas e acusações sobre a mesa. Sabem o que cada agente público defende. São informados do que consta do pacote ainda fechado da delação da Odebrecht, mesmo que isso vá ao encontro da estratégia de comunicação de um ou outro agente. E percebem que seus dirigentes, juízes e investigadores atuam, nalgumas oportunidades, de forma errática, ou num tom abaixo, ou num tom acima.
No longo prazo, o clima de altercações e troca de acusações pode fragilizar o interesse da sociedade. Tudo leva a crer que políticos aguardavam apenas uma brecha para avançar sobre as investigações. E a encontraram na Operação Carne Fraca, deflagrada na semana passada. As falhas nos procedimentos, vazamentos de informações sigilosas, espetacularização de ações policiais ou eventuais decisões judiciais controversas nas mais diversas operações e investigações seriam apenas um meio para chegar ao fim que une todos os políticos investigados: confundir o eleitor, buscar a impunidade e, logo mais, a reeleição.

gilmarjanot

https://images.jota.info/wp-content/uploads/2021/09/copy-of-jota-logo-high-cmyk.jpeg

JOTA

É tudo briga pelo resultado, e pelo seu impacto na política. Quem perde ao final é a justiça

Vazamentos seletivos; críticas interessadas?

É tudo briga pelo resultado, e pelo seu impacto na política. Quem perde ao final é a justiça