Paulo Dantas

Apesar da experiência ter demonstrado que nos mais de doze anos de vigência da Lei Federal das PPPs não se conseguiu, como se pretendia com a sua promulgação, promover o uso em grande escala das novas modalidades de concessão criadas - administrativa e patrocinada - nos projetos de infraestrutura, entendemos que o atual e desafiante momento do país pode apresentar uma boa oportunidade para este tipo de colaboração entre os setores público e privado.
A análise das experiências aponta que, talvez, parte da culpa pela falta de aceitação desta modalidade possa ser atribuída ao tamanho dos projetos. Deve ser levado em consideração que se tratava de uma prática nova no mercado brasileiro e que, portanto, nem as autoridades nem os patrocinadores estavam familiarizados com a “tropicalização” deste modelo. A maioria das PPPs foram concebidas para serem utilizadas em grandes projetos, que implicavam em uma grande complexidade e, consequentemente, também requeriam esforços proporcionais ao tamanho do investimento, tanto na obtenção dos grandes recursos como na gestão dos riscos envolvidos. Ainda mais quando se tratava de projetos totalmente novos (conhecidos como projetos greenfield), onde é preciso lidar com as dificuldades adicionais derivadas de uma implementação partindo do zero.
Agora podemos afirmar sem correr o risco de errarmos que a realidade das PPPs era muito mais complexa do que o mercado e as autoridades haviam se habituado desde o advento da lei de concessões. Os Projetos encontraram resistência em vários âmbitos: desde a forma de financiamento, garantias, contra garantias, até pontos críticos como impactos ambientais, autorizações prévias e processos de desapropriações. Tudo isso combinado com uma pobre alocação contratual dos riscos e o -infeliz- ativismo de juízes e tribunais não familiarizados com este tipo de estruturas.
Existem atualmente oportunidades que, por suas especificidades, se apresentam em um contexto que permitiria um enfoque diferente e mais ajustado às premissas que viabilizariam a estruturação das PPPs de uma maneira mais eficiente. Nos referimos concretamente aos projetos de saneamento e de iluminação pública. Ambos setores compartilham uma série de características em comum que os tornam interessantes para este tipo de colaboração público-privada: Em primeiro lugar pelo seu tamanho mais reduzido. Por serem de menor volume são mais acessíveis e menos complexos. Apresentam um menor desafio na hora de obter financiamento e implicam em um nível de risco menos crítico.
Outra das dificuldades históricas foi a de estruturar mecanismos de garantia de cobrança que mitiguem o risco do investidor privado. Mas estes dois setores - saneamento e iluminação pública -, dada as condições e características do próprio serviço prestado, são os que mais se aproximam hoje dos chamados projetos autofinanciáveis (ou project finance em inglês). Tanto no saneamento como na iluminação pública os recebíveis decorrem de uma receita segura e previsível, por estarem vinculados às contas de água/esgoto e luz que boa parte da população já paga, sendo já arrecadadas e que podem garantir fontes de financiamento para tais investimentos dando viabilidade econômico-financeira a este tipo de projetos.
Com uma estruturação realista e com prazos e investimentos mais concretos há espaço suficiente para que os próprios projetos se sustentem no médio e longo prazo. A realização de estudos prévios através dos procedimentos de manifestação de interesse (PMI) são um mecanismo válido para este objetivo. Se um determinado órgão público não possui a capacidade, seja técnica ou econômica, e não tem a expertise necessária para o desenvolvimento de um projeto da complexidade de uma PPP, ainda que seja de menor proporção, não deveria haver - como não há - nenhum óbice para que a iniciativa privada assuma esse dever. No entanto, para que as PMIs possam também tomar outro rumo neste caso, compromissos de transparência e eficiência devem ser celebrados por todas as partes envolvidas.
O eventual sucesso deste novo rumo nas PPPs em saneamento e iluminação pública terá um impacto social positivo e direto na melhora das condições e qualidade de vida de uma grande parte da população. No caso do saneamento a universalização dos serviços é um objetivo político já estabelecido em lei, muito embora ainda esteja longe de ser atingido. De qualquer forma, o acesso da população a água e esgoto tratados estão intrinsicamente ligados à sua dignidade, trazendo reflexos imediatos na saúde pública, gerando ganhos diretos e indiretos em todo o sistema de saúde.
O mesmo pode se dizer na questão de iluminação pública. Nesta área, as PPPs se apresentam como uma alternativa adequada para o Brasil evoluir na gestão associada de Prefeituras por intermédio de consórcios públicos, na otimização do uso de recursos públicos, no financiamento de projetos com ênfase na eficiência e eficácia no planejamento, coordenação e controle de dispêndios dos projetos, e na otimização da exploração de receitas acessórias, de maneira a contornar as conhecidas restrições econômicas-financeiras e operacionais que o setor público atravessa. Há indicativos de várias partes do mundo demonstrando que nas cidades melhor iluminadas o índice de segurança aumenta significativamente.
Por fim, é importante destacar que o apoio internacional ao desenvolvimento e financiamento deste tipo de infraestruturas urbanas é feito através de instituições multilaterais, como o Banco Mundial ou a Corporação Interamericana de Investimento (IIC). O Brasil pode ser um grande modelo para a região e para os países em desenvolvimento de que é possível cumprir objetivos sociais fundamentais com projetos atrativos à iniciativa privada.