Maís Moreno

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu posse no início de maio aos 245 integrantes do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social Sustentável (CDESS). Parte das atenções da mídia se concentrou na amplitude da composição. Ganhou destaque o número de conselheiros nomeados, avaliou-se a dimensão da diversidade de sua composição. Foram comuns as radiografias dos nomes convidados para o Conselho.
Um ponto fundamental, no entanto, foi pouco percebido: a retomada desta iniciativa do primeiro mandato de Lula, agora com um novo nome que incorpora e atualiza a questão da sustentabilidade, pode significar o fortalecimento de uma instância de pensamento de longo prazo para o Brasil. Isto mesmo. O chamado Conselhão pode constituir um locus institucional com relevância, diversidade, representatividade e consistência suficientes para sedimentar uma visão de país de longo prazo, fora do ciclo de um ou dois mandatos. Um desafio e um mérito nada triviais para algo do qual carecemos há bastante tempo.
Instâncias de participação social não são algo novo na democracia brasileira.  Ganharam relevância por permitir o partilhamento de deliberações, pela capacidade de facilitar a negociação entre interesses divergentes e por aumentar a transparência e a capacidade de prestação de contas (accountability). Um exemplo foi o Orçamento Participativo no Brasil dos anos 1990. Outro exemplo foram as Câmaras Setoriais surgidas em 1988 no contexto da reorganização do Conselho de Desenvolvimento Industrial (CDI). O terceiro caminho foram as experiências de diversos tipos de conselho, tendo como origem a Constituição de 1988.
Os desafios hoje requerem muito mais do Conselho reinaugurado em 4 de maio. Estamos sem instrumentos de navegação, sem referências, sem uma bússola que nos permita olhar para o futuro, consolidar um projeto de nação, construir grandes consensos e planejá-los no longo prazo. Falta uma visão de país como um todo, assim como faltam projetos de longo prazo em setores específicos da economia. Lacunas que cobrarão um preço alto demais para as atuais e futuras gerações.
Se em algum momento a necessidade de um projeto de futuro da nação pareceu em desuso, hoje ela se torna uma questão urgente, como bem pontuou o cientista político Fernando Abrucio, em artigo recente no qual destacou várias funções a que o CDESS pode se prestar. Como Abrucio escreveu, o mundo passa por enormes transformações, e as nações que não tiverem projeto de futuro ficarão para trás. 
O mundo mudou e com essa mudança os elos de interlocução entre Estado, mercado e sociedade também se transformaram. A complexidade e a multiplicidade requerem ainda uma abrangência de representatividade muito maior do que as experiências de concertação que o Brasil viveu nas últimas décadas. Somente um grande número de membros, especialidades, setores e origens pode dar conta desse caráter multifacetado da sociedade brasileira de hoje e seus desafios.
Em sua atual versão, o Conselhão se constitui num espaço que vai muito além da tríade empresários-trabalhadores-ONGs. As clivagens são outras, com os mundos financeiro, tecnológico e do trabalho fragmentários, cindidos, plurais. Se o mercado financeiro não pode mais ser visto como um corpo uniforme, com os mesmos interesses e as mesmas ideias, também há uma multiplicidade de características e desafios na <a href="https://www.jota.info/executivo/governo-vai-criar-mesas-de-dialogo-para-reforma-trabalhista-02012023">esfera do trabalho</a> – não há, por exemplo, como tratar igualmente os trabalhadores da indústria, os autônomos, os profissionais empregados na cadeia de serviço e os entregadores de aplicativo.
O Conselhão tem tudo para ser um fórum amplo, diverso e plural. Não um anel burocrático pensado como legitimação de propostas que o governo deseja implementar, mas uma efetiva arena ESG, uma vez que a visão de longo prazo e nossos desafios do presente e do futuro – no trabalho, na tecnologia, nos negócios, no enfrentamento das desigualdades – em todos os campos requerem atenção às dimensões socioambientais e de governança. Respeitando o papel do Congresso e do próprio Executivo e funcionando como um espaço de construção de consensos nacionais que as instituições representativas hoje, sozinhas, já não dão mais conta.

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JOTA

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