Gabriel Calais

É incontroverso entre os especialistas que há uma grande defasagem no setor de infraestrutura do Brasil. Contudo, o país se encontra com uma dívida pública elevada. Em virtude disso, há um consenso de que é necessária a participação e o investimento da iniciativa privada para o desenvolvimento do país, ainda que se discuta qual o grau de protagonismo e quanto o Estado deveria investir diretamente.
Nesse sentido, ganha destaque o <a href="https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2252649">PL 2646/2020</a>, aprovado na Câmara dos Deputados e atualmente pendente de apreciação pelo Senado. O referido projeto cria um instrumento financeiro, denominado debêntures de infraestrutura, as quais poderão ser emitidas por “sociedades de propósito específico, concessionárias, permissionárias, autorizatárias ou arrendatárias, constituídas sob a forma de sociedade por ações” (art. 2º do PL 2646/20).
Ressalta-se que os recursos captados por meio da emissão das debêntures de infraestrutura serão destinados à implementação de projetos de investimento na área de infraestrutura ou de produção econômica intensiva em pesquisa, desenvolvimento e inovação considerados como prioritários pelo Poder Executivo Federal (art. 2º, § 1º, do PL 2.646/20).
Fato é que as debêntures de infraestrutura guardam semelhanças com as debêntures incentivadas, criadas pela Lei 12.431/11, que também são emitidas por companhias para captar recursos no mercado para investimentos no setor de infraestrutura. No entanto, algumas diferenças podem ser destacadas: (i) as debêntures de infraestrutura se destinam a investidores institucionais, como fundos de pensão, ao passo que as incentivadas focam outros investidores, incluindo pessoas físicas; (ii) a companhia emissora das novas debêntures receberá incentivo fiscal, enquanto nas debêntures incentivadas os benefícios são dados a quem compra os títulos emitidos<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a>.
Ainda sobre os incentivos fiscais, o PL aprovado na Câmara dos Deputados prevê que a pessoa jurídica emissora das debêntures de infraestrutura poderá excluir do lucro, na determinação do lucro real e da base de cálculo do <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/CSLL">CSLL</a>, o valor correspondente a 30% da soma dos juros pagos naquele ano (art. 6º, II, do PL 2.646/20).
Dadas essas especificidades, a Secretaria de Reformas Econômicas do Ministério da Fazenda trata a aprovação do PL 2646/20 como um tema urgente para ampliar os investimentos no setor de infraestrutura. Segundo Ana Patrizia Lira Ribeiro, subsecretária de Regulação e Concorrência da secretaria, em entrevista dada à Agência Infra, a avaliação inicial é que há linhas nos bancos adequadas para que as empresas possam se financiar para fazer investimentos no país. No entanto, as condições de crédito e o volume de crédito, em caso de expansão, podem ser fatores impeditivos para a tomada do empréstimo<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a>.
De fato, a criação das debêntures incentivadas poderá contribuir para a expansão dos investimentos em infraestrutura. Entretanto, esse instrumento não surtirá maiores efeitos se não for aprovado em conjunto com outras medidas. Mais do que a ausência de diferentes títulos de crédito, o grande entrave aos investimentos da iniciativa privada no Brasil é a ausência de segurança jurídica, sobretudo quanto aos investidores estrangeiros, não acostumados às particularidades do país.
A título exemplificativo, podem ser mencionados episódios como a destruição de praças de pedágio durante a madrugada pela Prefeitura do Rio de Janeiro<a href="#_ftn3" name="_ftnref3">[3]</a>. Embora esse episódio tenha ocorrido há pouco mais de três anos, as cenas daquele dia fatídico permanecem no imaginário como uma ilustração da forma como a inciativa privada é tratada no país.
Outro entrave para os investimentos é a ausência de confiança do mercado nas condições macroeconômicas do Brasil. Conquanto o teto de gastos, instituído pela Emenda Constitucional 95/2016, possa ser considerado demasiadamente rígido, é fato que ele trouxe benefícios inegáveis à situação fiscal do país ao colocar um freio no crescimento da dívida pública. Com isso, se releva de grande importância as discussões sobre o novo arcabouço fiscal apresentado pelo Ministério da Fazenda. Sem dúvidas, trata-se do tema mais aguardado pelo mercado, por interferir diretamente na trajetória para as contas públicas ao longo dos próximos anos.
Por fim, registra-se que, ainda no ano de 2020, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) elencou uma relação de dez projetos de lei que seriam fundamentais para o desenvolvimento da infraestrutura nacional<a href="#_ftn4" name="_ftnref4">[4]</a>. Dentre esses projetos, ainda carecem de aprovação, por exemplo, o PL 7063/2017, que institui um novo marco legal das concessões e parcerias público-privadas (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/PPPs">PPPs</a>). Trata-se de projeto importante para o desenvolvimento do país, na medida em que unifica diversas legislações esparsas que tratam sobre o tema, conferindo, assim, maior segurança jurídica a todos os interessados.
Portanto, a aprovação do PL 2646 trará benefícios inegáveis ao desenvolvimento do setor de infraestrutura, desde que venha acompanhada de outras medidas que sinalizem o respeito à segurança jurídica e à sustentabilidade fiscal por parte do governo, tal como a aprovação do PL 7063 e a instituição de um novo e unificado marco legal das concessões e parcerias público-privadas.
<hr />
<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> AGÊNCIA CÂMARA DE NOTÍCIAS. “Proposta cria novo tipo de debênture para investimento em infraestrutura”. 02.06.2020. Disponível em: <a href="https://www.camara.leg.br/noticias/666202-proposta-cria-novo-tipo-de-debenture-para-investimento-em-infraestrutura/">https://www.camara.leg.br/noticias/666202-proposta-cria-novo-tipo-de-debenture-para-investimento-em-infraestrutura/</a>.
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> AMORA, Dimmi. “Fazenda trabalho no PL de debêntures e em fundo de PPP para projetos de Infraestrutura. Agência iNFRA. iNFRANotícias - Transportes e Regulação. Brasília, 07 de março de 2023, edição 1.464.
<a href="#_ftnref3" name="_ftn3">[3]</a> JORNAL NACIONAL. “Prefeitura do Rio proíbe pedágio e destrói cancelas de concessionária de via expressa”. 28.10.2019. Disponível em: <a href="https://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2019/10/28/prefeitura-do-rio-proibe-pedagio-e-destroi-cancelas-de-concessionaria-de-via-expressa.ghtml">https://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2019/10/28/prefeitura-do-rio-proibe-pedagio-e-destroi-cancelas-de-concessionaria-de-via-expressa.ghtml</a>
<a href="#_ftnref4" name="_ftn4">[4]</a> PORTAL DA INDÚSTRIA. “CNI lista 10 projetos de lei para a infraestrutura avançar no país”. 29.07.2020. Disponível em: <a href="https://noticias.portaldaindustria.com.br/noticias/infraestrutura/cni-lista-10-projetos-de-lei-para-a-infraestrutura-avancar-no-pais/">https://noticias.portaldaindustria.com.br/noticias/infraestrutura/cni-lista-10-projetos-de-lei-para-a-infraestrutura-avancar-no-pais/</a>.

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Aprovação do projeto trará benefícios ao setor, mas não é a solução de todos os problemas

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