Rubinho Nunes

A Prefeitura de São Paulo, por meio do prefeito Ricardo Nunes, tem estudado a possibilidade de implementação da gratuidade do transporte público coletivo na capital paulista. Foram encomendados estudos técnicos para as áreas que atuam nesse setor e, como esperado, o debate quanto à viabilidade da medida aflorou nos meios de comunicação, no mundo acadêmico e, obviamente, nos corredores e pontos de ônibus da cidade.
A população tende a ser favorável, uma vez que a gratuidade proposta significará mais economia ao já bastante combalido orçamento familiar de milhões de pessoas que se utilizam do transporte público municipal diariamente.
No entanto, como salientado em dois recentes artigos publicados neste espaço<a href="#_edn1" name="_ednref1">[i]</a> <a href="#_edn2" name="_ednref2">[ii]</a> e em outros veículos de comunicação, a chamada “tarifa-zero” dos ônibus de São Paulo terá que ser paga por alguém. Num primeiro momento, imagina-se que os cofres públicos ficariam como únicos responsáveis pela medida, aumentando ainda mais a fatia do orçamento que vai para subsidiar a tarifa, contudo, não é o que se infere das entrevistas concedidas pelo prefeito Ricardo Nunes.
Segundo o chefe do Executivo municipal, a tarifa zero do transporte público continuaria a ser custeada em parte pelo Município - atualmente, a prefeitura já subsidia pouco mais da metade do valor da passagem –, sendo que a cota que cabe atualmente aos usuários seria paga pelos empregadores a partir do repasse direto do vale-transporte aos cofres públicos<a href="#_edn3" name="_ednref3">[iii]</a> <a href="#_edn4" name="_ednref4">[iv]</a>.
Aparentemente, estaríamos diante de dois problemas: uma medida populista e irresponsável que acarretaria ainda mais custos para o orçamento municipal – caso se optasse pelo subsídio de 100% do transporte público pelo Município – ou uma medida custosa para o empreendedor paulistano – caso se admita que ele bancaria a gratuidade do transporte municipal de forma solitária.
Ocorre que, diferentemente do que se tem visto na maioria dos artigos, reportagens e comentários sobre o tema, poucos desses estudiosos se propuseram a se aprofundar na análise dos dados e das consequências verificadas noutras localidades em que se adotou a tarifa zero dos ônibus. É por esse motivo que nos dispusemos a escrever o presente texto.
Internacionalmente, muitas cidades já têm experiência com a tarifa zero no transporte público. Nesses lugares é comum que essa política pública seja defendida a fim de beneficiar a população carente, de diminuir o uso de carros – e, consequentemente, reduzir a emissão de gases poluentes – além de beneficiar a mobilidade urbana.
Em Dunquerque, na França, houve um aumento de 60% no número de passageiros durante a semana e de 100% aos finais de semana após a tarifa zero ser implantada. Dos novos usuários, 48% afirmaram usar regularmente a rede de transporte público em vez de carros<a href="#_edn5" name="_ednref5">[v]</a>.
Naquela cidade, com o aumento do fluxo de pessoas por meio do transporte público gratuito, as ruas comerciais foram revitalizadas. Semelhantemente, a tarifa zero em São Paulo poderia contribuir de forma indireta com a revitalização do centro e de áreas comerciais subutilizadas atualmente – aliás, a Câmara Municipal de São Paulo aprovou recentemente várias leis que visam modernizar, adensar e qualificar o centro da cidade –, o que vem ao encontro da tarifa zero que se pretende implantar.
Ainda na França, a cidade de Estrasburgo implementou a medida para possibilitar também a diminuição da emissão de gases nocivos ao meio ambiente. Naquela localidade os níveis de poluição são muito altos e isso está relacionado ao tráfego de automóveis, sendo que a Prefeitura de São Paulo prevê que, juntamente com a gratuidade da tarifa, 100% da frota de ônibus urbanos seja composta por veículos elétricos.
No Brasil também temos casos de sucesso. A cidade de Caucaia, no Ceará, com 360 mil habitantes, é um bom exemplo. A prefeitura municipal informou que os resultados têm sido surpreendentes. Até julho de 2021, quando o transporte público era cobrado, a quantidade de passagens pagas foi de 500 mil. Até janeiro de 2022, com o programa gratuito, atingiu-se a marca de 2 milhões de passageiros. Com o aumento da demanda, houve diminuição do custo per capita: a passagem que custava para o usuário R$ 3,80 hoje custa R$ 1,35 para os cofres daquele município.
Cabe ressaltar que a proposta da Tarifa Zero na cidade de São Paulo não prevê um aumento no subsídio pago pelo Município. Caso a proposta seja aprovada muitos custos também serão eliminados. A existência de catracas e cobradores nos ônibus, por exemplo, não serão mais necessárias. Os ganhos de eficiência poderão tirar das costas dos contribuintes, e do Município, esses custos.
Os empregadores também não podem ser mais onerados para que tenhamos transporte sem tarifa na cidade. As empresas já têm o custo de pagar o vale transporte a seus funcionários e esse valor não será aumentado! O que haveria seria um simples remanejamento deste valor. Parte dele iria ao funcionário e a outra parte já iria diretamente ao Município.
Ao não onerarmos mais nem o Município e nem as empresas teremos o melhor dos dois mundos. Através de ganhos de eficiência nas operações de ônibus municipais e o remanejamento dos valores já pagos pelos empregadores a tarifa zero poderá ser possível.
É certo que a gratuidade do transporte público coletivo não se resume somente à questão de quem pagará a conta. Como toda política pública de grande envergadura, a pretendida tarifa zero nos ônibus de São Paulo deve ser pensada de forma ampla, avaliando-se todos os possíveis impactos (positivos e negativos) da proposta.
A gratuidade do transporte na capital paulista trará incontroversa economia ao usuário, sobretudo àquele que se vale dos ônibus para se deslocar diariamente ao trabalho. Além disso, a tarifa zero possibilitará que a população, especialmente os mais vulneráveis economicamente, frequente parques, espaços de lazer e cultura, bem como se locomova com mais economia para se encontrar com amigos e familiares. Dados da organização “Nossa São Paulo” confirmam que 50% da população de baixa renda não visita amigos e parentes nos fins de semana por não terem dinheiro para a passagem.
Da mesma forma, espera-se que o aumento do uso do transporte coletivo gratuito melhore as condições do trânsito da capital paulista. É notório que os automóveis individuais ocupam muito mais espaço do que os transportes coletivos para transportar um mesmo número de pessoas<a href="#_edn6" name="_ednref6">[vi]</a>.
Por fim, por mais que a proposta seja atraente, possa gerar impactos positivos nos aspectos ambientais, sociais e econômicos, a medida não deve ser arcada exclusivamente pelos cofres públicos – leia-se, nós contribuintes pagadores de impostos – ou unicamente pelos empregadores – empreendedores que já trabalham incansavelmente para gerar emprego e renda.
Portanto, entendemos que a medida econômico-orçamentária ora estudada pela Prefeitura de São Paulo – repasse dos valores de vale-transporte já pagos pelas empresas diretamente à municipalidade para subsidiar parte do sistema de transporte público – contemplaria melhor todos os atores envolvidos.
Com o aumento do número de usuários, o custo per capita da operação cairia, reduzindo o custo do sistema aos cofres públicos e aos empregadores. Se os estudos técnicos forem conclusivos nessa direção, se mostrará possível até mesmo a diminuição dos valores que já são pagos atualmente pelo Município (subsídio) e pelas empresas (vale-transporte).
Assim, para a política pública ser implementada com sucesso e trazer os benefícios esperados, se mostra imperioso analisar todos os aspectos da medida, distanciando-se da mera disputa político-eleitoreira<a href="#_edn7" name="_ednref7">[vii]</a> e estudando com atenção os detalhes da proposta.
Garanto que a Câmara Municipal de São Paulo está pronta para, enquanto representante da população paulistana, debater e aperfeiçoar a matéria, a fim de entregar ao povo de São Paulo a melhor política pública possível.
___________________________________________________________________________________
<a href="#_ednref1" name="_edn1">[i]</a> <a href="https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/publicistas/se-a-tarifa-e-zero-quem-paga-a-conta-06122022">https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/publicistas/se-a-tarifa-e-zero-quem-paga-a-conta-06122022</a>
<a href="#_ednref2" name="_edn2">[ii]</a> <a href="https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/se-a-tarifa-e-paga-quanto-fica-a-conta-quem-paga-ja-sabemos-09122022">https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/se-a-tarifa-e-paga-quanto-fica-a-conta-quem-paga-ja-sabemos-09122022</a>
<a href="#_ednref3" name="_edn3">[iii]</a> https://www.estadao.com.br/brasil/sp-estuda-adotar-tarifa-gratuita-de-onibus-veja-onde-isso-ja-foi-adotado-e-quais-os-desafios
<a href="#_ednref4" name="_edn4">[iv]</a> https://summitmobilidade.estadao.com.br/tarifa-zero-qual-sua-viabilidade
<a href="#_ednref5" name="_edn5">[v]</a> https://www.bbc.com/portuguese/vert-cap-57802696
<a href="#_ednref6" name="_edn6">[vi]</a> https://www.mobilize.org.br/estatisticas/59/espaco-ocupado-por-modos-de-transporte-ativos-e-motorizados.html
<a href="#_ednref7" name="_edn7">[vii]</a> https://veja.abril.com.br/politica/transicao-de-lula-discute-tarifa-zero-de-onibus-para-todo-o-brasil/
https://www.observatoriodasmetropoles.net.br/tarifa-zero-transicao-energetica-combate-as-desigualdades-e-ampliacao-da-democracia-nas-cidades/
https://www.mobilize.org.br/noticias/12567/voce-conhece-alguma-cidade-com-tarifa-zero.html
&nbsp;

Liberação do uso de máscara em São Paulo

https://images.jota.info/wp-content/uploads/2021/09/copy-of-jota-logo-high-cmyk.jpeg

JOTA

Política pública, se implementada, deve trazer diversos benefícios aos paulistanos e à cidade paulista

Transporte gratuito em São Paulo é viável e será benéfico ao município

O transporte público gratuito em São Paulo é uma política pública que, se implementada, deve trazer diversos benefícios aos paulistanos.