Ivan Candido da Silva de Franco

Jonas Coelho Marchezan

Natalia Langenegger

A Lei de Acesso à Informação (LAI ­ Lei 12.527/2011) é um marco nas políticas de transparência do Brasil. Promulgada em 2011, alterou a forma como os cidadãos e o Poder Público lidam com as informações públicas, vez que regulamentou, em detalhes, a previsão constitucional do dever estatal de informar (CF, art. 5o, XXXIII). Não é pouco haver norma expressa que garanta a publicidade como regra e o sigilo como exceção: o Estado deve publicizar seus atos e, não o fazendo, justificar o porquê.
Embora também exista alguma atenção aos Poderes Legislativo e Judiciário, a LAI foi pensada e moldada tendo em vista o Poder Executivo, especialmente no que diz respeito à classificação de documentos sigilosos e aos recursos interpostos contra decisões denegatórias de acesso à informação. Ainda sobre os Poderes da República, pode-­se dizer que a disponibilização e a regulamentação de políticas de acesso à informação possuem perceptível importância no Executivo e no Legislativo, porque há cargos ocupados por intermédio de eleições diretas e periódicas. Mas e no Poder Judiciário? Como são pensadas as políticas para este Poder Estatal historicamente mais fechado à cidadania e no qual a escolha dos membros não passa por consulta à população?
Como afirmado, não foi grande o esforço legislativo em determinar uma política de transparência relativa ao Poder Judiciário, ficando a cargo do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e dos Tribunais a regulamentação do tema. Mencionado apenas três vezes na Lei de Acesso à Informação, regras específicas a este Poder Estatal ainda são necessárias para dar efetividade ao disposto em Lei. Dado tal cenário, perguntamos: o Judiciário entende ser importante a divulgação de suas informações públicas?
É dever do Poder Público, ao menos desde a Constituição de 1988, divulgar informações: de matérias administrativas e, notadamente, de suas atividades­fim. Em se tratando do Legislativo, é de fundamental importância a divulgação ampla não apenas de suas leis aprovadas, como também do processo de tramitação dos projetos em suas Casas. No caso do Executivo, é necessária a disponibilização dos atos normativos de execução de políticas públicas a seu cargo.
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No que diz respeito ao Judiciário, de forma não menos intuitiva, poderíamos afirmar que há necessidade de transparência, com especial atenção à disponibilização de todas as decisões proferidas e em seu inteiro teor, salvo em casos de segredo de justiça. Tal dever poderia ser interpretado como fundamental para o escrutínio público e importante fonte de legitimidade diante do caráter não­representativo desse ramo do poder estatal. O acesso à integralidade das decisões judiciais proferidas permite ao cidadão, por exemplo, identificar a argumentação apresentada por magistrados na aplicação de legislação democraticamente formulada e cobrar que a atividade judicante seja coerente com a jurisprudência existente.
Porém, do que temos observado, a divulgação de decisões por órgãos do Poder Judiciário não é realizada integralmente. Ou, ao menos, não fica claro qual o universo de documentos disponibilizados em seus bancos de dados digitais. Se tomarmos como exemplo seu órgão de cúpula, o Supremo Tribunal Federal (STF), poderíamos nos perguntar: quantas são as decisões proferidas pelo tribunal nos últimos anos? As decisões disponibilizadas em seu site correspondem à totalidade de julgados proferidos por seus Ministros? Em caso de resposta negativa, por que não são disponibilizadas em sua integralidade? Quais seriam os critérios para excluir decisões do banco de dados digital do Tribunal?
Em pesquisa recente da Artigo 19, constatou­se que os órgãos de justiça são os que menos satisfazem as exigências de transparência ativa e passiva descritas na legislação. Segundo apontou o estudo, ainda são muitos os pedidos de informação não recebidos e recursos ignorados pelo órgãos de justiça, além de ser insatisfatória a disponibilização de decisões judicias e de dados sobre planejamento e execução de suas atividades.
Isso ocorre em um contexto em que a tecnologia favorece os Tribunais, que possuem sistemas digitais e estão implementando processo integralmente digital e, por isso, poderiam com certa facilidade disponibilizar informações processuais e decisões judiciais em repositórios eletrônicos. Mais do que isso, os sites dos órgãos de justiça facilitam que qualquer cidadão acesse os respectivos Serviços de Informação ao Cidadão (SICs) ou Ouvidorias para demandar informações e potencialmente gerar aprimoramentos nos sistemas de divulgação. Porém, o estado da arte generalizado da disponibilização (ativa e passiva) de informações não é satisfatório. Como consequência, não há uma aproximação entre o cidadão e os Tribunais.
Diante desse cenário, retomamos nossa indagação sobre a importância da transparência, hoje, para o Poder Judiciário. Entendemos que há uma maior preocupação dos Tribunais no sentido de se mostrar para a sociedade, que podem ser ilustradas pela edição de resoluções pelo CNJ (de número 79, 102 e 151), que determinam que todos os Tribunais nacionais divulguem na Internet as suas informações orçamentárias e financeiras, com especial atenção à remuneração recebida por seus funcionários. Também temos notícias de iniciativas pontuais, como o acordo firmado entre o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) e o Instituto de Pesquisa InternetLab ­ ao qual somos vinculados ­ com vistas à produção de diagnóstico sobre o cumprimento da LAI pelo Tribunal e à proposição de ações capazes de aprimorar as práticas de disponibilização ativa e passiva de informações por parte do órgão. Mesmo assim, tratam­se de iniciativas pontuais e que ainda não atacam o cerne do problema: a inexistência de normas para o Judiciário nacional sobre acesso à informação e a insegurança quanto à disponibilização das decisões aos cidadãos.
A transparência é (ou deveria ser) parte da busca por legitimidade de um Poder que exerce papel cada vez mais relevante na vida das pessoas. Não se aceita mais um Poder Judiciário distante e totalmente hermético, razão pela qual é essencial a divulgação de informações públicas completas principalmente sobre suas atividades­fim, e também de informações administrativas relevantes, como os rendimentos dos magistrados e demais funcionários. Longe de ser um favor que os órgãos do Judiciário prestam à comunidade, a transparência é uma obrigação constitucional e legal que apenas agora passa a ser sistematicamente cobrada para que entre em prática.
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* Pesquisadores do InternetLab, centro independente de pesquisa em direito e tecnologia

Lupe liegt auf Schreibtisch im Büro

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JOTA

Há necessidade de disponibilização de todas as decisões proferidas e em seu inteiro teor, salvo em casos de segredo de justiça. 

Transparência pode aproximar o cidadão do Judiciário

Há necessidade de disponibilização de todas as decisões proferidas e em seu inteiro teor, salvo em casos de segredo de justiça.