Caio Mário S. Pereira Neto
Professor de Direito Econômico da Fundação Getúlio Vargas (FGV Direito SP), Mestre (LL.M.). Doutor (JSD) em Direito pela Universidade de Yale (EUA) e Sócio de Pereira Neto Macedo Advogados.
Não é de hoje a afirmação de que, em regra, a transparência de informações disponíveis aos consumidores tende a favorecer o funcionamento dos mercados. De fato, a possibilidade de comparar preços e qualidade na oferta de produtos e serviços constitui elemento importante para que consumidores possam decidir onde comprar, direcionando suas escolhas para fornecedores mais eficientes. O próprio Código de Defesa do Consumidor determina que fornecedores devem divulgar informações claras, precisas e ostensivas sobre o preço de seus produtos e serviços. Assim, de um modo geral, iniciativas públicas e privadas que contribuam para a disponibilização de informações claras sobre preços e condições de contratação devem ser incentivadas, favorecendo o melhor desempenho da atividade econômica.
No setor de telecomunicações, por exemplo, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) passou, em 2012, a obrigar detentores de infraestruturas básicas a divulgarem, em uma plataforma específica (SNOA), o preço de seus produtos de atacado, o que vem produzindo resultados positivos. Recentemente, atestou-se que o preço médio do quilômetro de duto caiu de R$ 40 mil para R$ 4001. Ainda no mesmo setor, a Anatel anunciou, há pouco, a iniciativa de criar um aplicativo de comparação de planos das diversas operadoras2.
Lógica semelhante já foi incorporada pelo mercado financeiro. Contudo, a transparência dos custos ainda pode evoluir para incentivar a competição no mercado de pagamentos e favorecer a posição do lojista.
No âmbito dos mercados de crédito ao consumo, registram-se algumas experiências interessantes em matéria de transparência de preços. Uma delas diz respeito à divulgação, por bancos e outras instituições financeiras, do Custo Efetivo Total (CET) arcado por consumidores na contratação de operações de crédito. Por determinação do Banco Central, as instituições financeiras devem informar ao consumidor, antes da contratação, o valor e a representatividade de cada componente de custo (taxas de juros, tributos, tarifas, gravames, registros, seguros e demais despesas) embutido na operação de crédito ofertada. Implantado em 2007, o CET foi aprimorado aos poucos e trouxe transparência aos consumidores na identificação das melhores ofertas de crédito.
No exterior, um exemplo interessante é o da UK Card Association, que tomou iniciativa importante para incentivar a indústria a disponibilizar informações claras para que portadores de cartões de crédito possam comparar produtos e fazer escolhas3. Essa iniciativa acabou impulsionando a criação de um código de conduta para a indústria (The Standards of Lending Practice), que hoje é monitorado por uma entidade independente, o Lending Standards Board4. Como observou a Comissão Europeia em relatório divulgado em 2015, a falta de transparência e ausência de sinalização de preços na perspectiva dos lojistas é um traço marcante desse setor, reforçando a importância do modelo adotado no Reino Unido.5
Iniciativas semelhantes começam a se apresentar no Brasil. Nas últimas semanas, o mercado deu início a um movimento em prol da criação de um CET específico para o setor de meios eletrônicos de pagamentos. Segundo a proposta, o “CET das maquininhas” permitiria que lojistas comparem, de forma simples e clara, o custo total do serviço contratado junto às credenciadoras, composto pela compra ou aluguel das maquininhas, pelas taxas de desconto e, ainda, pelas taxas de adiantamento de recebíveis. A ideia não apenas se adequa ao estágio atual desse mercado, que está passando por mudanças profundas, como também cria condições para a redução de custos dos lojistas, alinhando-se a outros movimentos de maior transparência nas relações de consumo.
Quando aplicável, a transparência de preços possui, comprovadamente, o potencial de ampliar a concorrência e produzir benefícios ao consumidor e ao lojista (no caso do mercado de pagamentos), merecendo atenção mais detida e apoio de reguladores e demais atores sociais. A concorrência, os lojistas e a sociedade como um todo só têm a ganhar com isso.
Este texto é o terceiro artigo da série Tecnologia de Pagamentos, que está sendo publicada pelo JOTA a cada três semanas, às quintas-feiras.
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1 http://convergenciadigital.uol.com.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?UserActiveTemplate=site%2Cmobile&at_xt=4dade31fb3b5760e%252525252525252C0&infoid=50478&sid=8&sms_ss=blogger
2 http://www.telesintese.com.br/anatel-colocara-em-acao-aplicativo-para-comparar-precos-e-produtos/
3 http://www.theukcardsassociation.org.uk/transparency/index.asp