Reginaldo Angelo dos Santos

Não há dúvidas de que a <a href="https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/coluna-barbara-mengardo/refis-ou-transacao-tributaria-qual-a-melhor-saida-para-a-crise-22032022">transação tributária</a> trouxe mais justiça à aplicação de benefícios, em forma de descontos e parcelamentos, concedidos com recursos públicos a devedores tributários. Diferentemente do Refis, em que sujeitos passivos com evidente capacidade de pagamento também se utilizam do benefício, sem qualquer critério de escolha, a transação seleciona os contribuintes que podem ser sujeitos de utilização do regime, cujas condições são estabelecidas em edital.
Ocorre, entretanto, que uma das modalidades de transação, denominada de relevante e disseminada controvérsia jurídica, prevista no Capítulo II da <a href="https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/lei-n-13.988-de-14-de-abril-de-2020-252343978">Lei nº 13.988/2020</a> e regulamentada pela <a href="http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?visao=anotado&amp;idAto=110356">Portaria 247/2020</a>, do ministro da Economia, deixa uma margem de discricionariedade um tanto abrangente para que se defina quais temas serão objeto desta modalidade de transação.
Isso porque a lei dá à transação de relevante e disseminada controvérsia jurídica caráter bastante indefinido, ao se limitar a conceituá-la como aquela que trate de questões tributárias que ultrapassem os interesses subjetivos da causa (§ 3º do art. 16 da Lei 13.988/2020).
Esta definição, aberta, abriu a possibilidade de o <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/ministerio-da-economia">Ministério da Economia</a> ocupar este espaço deixado pela lei, com a edição da citada Portaria 247/2020, notadamente nos artigos 27 a 30, estabelecendo regras onde prevalecem o interesse da administração, a um instituto que deveria primar por concessões mútuas, como prescrevem os arts. 171 do <a href="http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172compilado.htm">Código Tributário Nacional</a> (CTN) e art. 840 do <a href="http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm">Código Civil</a>.
Em que pese a adesão à transação ser uma decisão de política tributária de cada contribuinte, é certo que os critérios quanto à escolha de temas a serem classificados como de relevante e disseminada controvérsia jurídica precisam ser mais transparentes. Neste sentido, o instituto da transação não deve ser utilizado pela administração a pretexto de compelir o contribuinte a liquidar débitos tributários ainda passíveis de definição pelos órgãos julgadores e administrativos, confundindo os administrados a ponto de mitigarem o requisito da autonomia da vontade.
Ao olharmos para o caso envolvendo o <a href="https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/edital-n-9/2022-397019463">edital nº 9/2022</a>, que dispõe sobre a transação por adesão no contencioso referente aos débitos de pessoas naturais ou jurídicas oriundos de amortização fiscal do ágio no regime jurídico anterior à Lei 12.973, de 2014, fica a impressão de que o instrumento tem o objetivo de levar o contribuinte a decidir pelo pagamento dos débitos, o que não deve ser o propósito da transação, especialmente quando não há elementos suficientes, sob o ponto de vista da solução da controvérsia pelos órgãos julgadores, a levar à decisão pelo pagamento.
Em alguns processos, julgados nos últimos meses de 2021, verificou-se a reversão do entendimento em casos de ágio, até então desfavoráveis aos contribuintes, ainda que o resultado tenha sido alcançado através do empate no julgamento, em razão da não aplicação do voto de qualidade. É o caso do acórdão nº 9101-005.773, em que houve a decisão pelo cancelamento da autuação, no que se refere à dedução do ágio para fins de CSLL. Houve ainda decisão favorável ao contribuinte no Acórdão nº Acórdão nº 9101-005.761, onde se decidiu, por 6 votos a 2, pela impossibilidade da qualificação da multa em um caso de utilização de empresa veículo .
Neste contexto, cabe ainda citar a recente decisão Supremo Tribunal Federal (STF) na <a href="https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=1930159">ADI nº 2.446/2001</a>, pela constitucionalidade do art. 1º da Lei Complementar 104/2001, na parte em que acrescenta o parágrafo único ao art. 116 do CTN.
Ocorre que a interpretação conferida ao citado dispositivo, pelo STF, é de que a norma, para além de depender de regulamentação, visa combater a evasão, não a elisão fiscal, destacando ainda que, nos termos do voto da relatora, Cármen Lúcia, que:
<blockquote class="jota-article__citation">“A norma não proíbe o contribuinte de buscar, pelas vias legítimas e comportamentos coerentes com a ordem jurídica, economia fiscal, realizando suas atividades de forma menos onerosa, e, assim, deixando de pagar tributos quando não configurado fato gerador cuja ocorrência tenha sido licitamente evitada".</blockquote>
No entendimento do STF, a norma não veda a elisão fiscal, sendo permitido ao contribuinte se utilizar de meios lícitos de forma a praticar suas operações de forma menos onerosa, o que poderá ser um alento aos contribuintes que decidam discutir no Judiciário questões ligadas ao ágio, antes da <a href="http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l12973.htm">Lei 12.973/2014</a>.
Sendo assim, incluir casos não pacificados no Poder Judiciário ou com sinais de reversão de entendimento pelos julgadores administrativos nas modalidades de transação de relevante e disseminada controvérsia jurídica poderá causar baixa adesão ao instituto, além de confundir os contribuintes, levando-os a tomar decisões que não se coadunam com o instituto da transação tributária.

responsabilidade tributária

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JOTA

Incluir nessa modalidade da transação casos não pacificados no Judiciário pode confundir contribuintes

Transação tributária e a transparência nos casos de controvérsia jurídica

Modalidades de transação tributária denominada de relevante e disseminada controvérsia jurídica deixa margem abrangente de discricionariedade