Nicolau Olivieri

A indústria do petróleo envolve um gigantesco arco de atividades econômicas, que vão desde as operadoras, parceiras e sócias dessas operadoras, fornecedoras de todo tipo de insumo, até prestadoras de serviço dos mais diversos serviços e de todos os portes, somando o trabalho direto e indireto de médicos, arquitetos, geólogos, técnicos, analistas, operários, biólogos, aquaviários, pilotos de helicóptero, engenheiros, mergulhadores – e até de advogados.
Toda essa fantástica atividade tem seu início operacional, uma vez ultrapassadas as fases de pesquisa e montagem da estrutura produtiva, na extração física do petróleo ou do gás, em terra ou no mar, a partir do que se segue toda a enorme e fantástica sequência de processos, processamentos, transformações, transporte, distribuição e comércio, chegando finalmente nos produtos acabados que todo o mundo consome: de chicletes a diesel. Assim, a indústria do petróleo se define a partir do trabalho de extração física propriamente dita daquilo que posteriormente será transformado nos mais diversos bens de consumo e bens de produção.
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No Brasil, o trabalho na atividade de extração de petróleo e gás é regulamentada por uma lei específica, a Lei 5.811, ainda de 11/10/72. Em seus poucos artigos, arquitetados para uma realidade de quase meio século atrás, e num contexto de monopólio da atividade de extração de petróleo, a Lei mostra-se claramente defasada, obrigando atualmente que as muitas empresas privadas envolvidas se dediquem a performances quase circenses de contorcionismo, de modo a evitar riscos trabalhistas ou administrativos, na tentativa de encaixar os modelos de atuação numa regulamentação que não dá conta dessa realidade.
Nada obstante o operoso trabalho da jurisprudência de buscar adequar uma norma ultrapassada à realidade atual, e aproveitando o atual fervor reformista na área do Direito do Trabalho, não seria má ideia se os técnicos do Governo, ou deputados federais interessados, buscassem atualizar o marco regulatório trabalhista na atividade de extração de petróleo e gás, por meio de um novo Projeto de Lei, também para tornar o país mais atrativo para a indústria e investimentos privados estrangeiros, equiparando as leis daqui às práticas de lá e uniformizando rotinas que muitas vezes tem um perfil internacional.
A atividade jurídica deve ser também propositiva. Nesse sentido, destacamos alguns pontos que, a nosso ver, podem ser objeto de reflexão numa tentativa de modernização desse relevante marco regulatório.
O primeiro deles seria quanto ao próprio campo de aplicação objetivo e subjetivo da regulamentação. A atual Lei 5.811/72 se pretende aplicável a todos os empregados da indústria, mas não somente daqueles que participam diretamente da extração propriamente dita, como também na indústria do refino, na indústria petroquímica e até no transporte.
Porém, apesar de ambiciosa em relação à quantidade de setores econômicos em que ela é aplicada, no seu conteúdo, a Lei resume-se a prever dois regime de trabalho, o regime de turnos de revezamento, quando for “imprescindível à continuidade operacional” (arts 2º, 3º e 4º), e o regime de sobreaviso, quando se tratar de empregado com responsabilidade de supervisão naquelas atividades em que é imprescindível a continuidade operacional (arts 5º, 6º). Em ambos os casos, de acordo com o art 8º, o empregado não poderá permanecer trabalhando mais do que 15 dias consecutivos.
<blockquote class="jota-article__eye">Esses dois regimes, com a limitação dos 15 dias de trabalho consecutivos, contudo, fazem sentido na situação de confinamento em plataformas, FPSOs, ou locais isolados em terra. São inadequados, ou desnecessários, na indústria petroquímica ou no transporte quando não há essa situação de confinamento.</blockquote>
Assim, seria mais razoável, a nosso ver, uma regulamentação que se destinasse exclusivamente à atividade de extração direta de óleo e gás, em situação de confinamento, em mar ou em terra, e aproveitando para definir o que é essa situação de confinamento - por exemplo para o caso de explorações em terra relativamente próximas a centros urbanos.
Por outro lado, existe uma enormidade de funções, no ambiente operacional da extração de óleo e gás, que não se adequam nem ao regime de turnos, nem ao regime de sobreaviso, por não se tratarem de atividades diretamente imprescindíveis à continuidade operacional: médicos, gerentes, coordenadores, consultores, especialistas de vários níveis realizam atividades de apoio relevantes, importantes, mas que não são, a rigor, imprescindíveis à continuidade operacional.
Dessa forma, seria muito útil se um novo marco legal pudesse ampliar o rol de regimes possíveis no âmbito da atividade confinada de extração de óleo e gás, à luz dessa multiplicidade de atividades, prevendo por exemplo módulos de horas de trabalho e repouso mais adequadas à natureza dessas atividades, bem como benefícios próprios para novos regimes.
O critério de imprescindibilidade operacional é muito estreito para a realidade atual. Um técnico de informática numa plataforma eventualmente pode trabalhar tranquilamente 8 horas, sem turno de revezamento, e sem necessidade de indenização da hora de repouso e descanso.
<blockquote class="jota-article__eye">Outro ponto que poderia ser objeto de atenção, numa eventual alteração legal nesse âmbito, seria o próprio período de embarque. A Lei 5.811/72 em seu art 8º prevê o período de rotação de 15 dias para os empregados em regime de revezamento e sobreaviso<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a>.</blockquote>
Nada obstante, muitos outros países utilizam o período de rotação de 28 dias embarcado seguidos de 28 dias de folga. Assim, poderia ser interessante, se uma nova lei previsse a rotação de 15 dias, mas possibilitando a extensão da rotação por um total de 28 dias, considerando os dias de embarque e desembarque como dias de trabalho, por meio de acordo ou convenção coletiva, ou por meio de acordo individual, no caso dos empregados enquadrados na hipótese do art 444 parágrafo único da CLT.
Uma nova lei poderia ainda especificar a natureza dos benefícios em face dos regimes próprios que ela vier a adotar, bem como a natureza do próprio período de repouso que se segue à rotação offshore, incorporando o entendimento da jurisprudência no sentido de que não se trata de repouso semanal, mas de folgas, não se aplicando os princípios da Lei 605/49.
Por fim, seria conveniente que uma nova regulamentação previsse as penalidades para o caso de infração, tanto em favor do empregado, quanto, se for o caso, em favor da Administração Pública, no que a atual lei é omissa.
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<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> Deixando de lado aqui a indagação acadêmica sobre se seria possível estipular um período de embarque maior para os empregados que não estão em nenhum dos dois regimes.

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JOTA

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