Vinicius Silva Nascimento

A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça se encarrega dos julgamentos relativos às matérias de servidores públicos civis e militares, nos termos do artigo 9º, §1º, inciso XI do <a href="https://www.stj.jus.br/publicacaoinstitucional/index.php/Regimento/article/view/3115/3839">Regimento Interno do STJ</a>, in verbis:
Art. 9º A competência das Seções e das respectivas Turmas é fixada em função da natureza da relação jurídica litigiosa.
§1º À Primeira Seção cabe processar e julgar os feitos relativos a:
[..] XI - servidores públicos civis e militares.
Em Sessão Ordinária realizada em 22 de setembro de 2021, a Primeira Seção aprovou o entendimento <a href="https://processo.stj.jus.br/processo/dj/documento/?seq_documento=30276445&amp;data_pesquisa=28/09/2021&amp;seq_publicacao=16377&amp;versao=impressao">sumular n.º 650</a>, enunciando a jurisprudência cristalina do Tribunal da Cidadania, ao fixar que "a autoridade administrativa não dispõe de discricionariedade para aplicar ao servidor pena diversa de demissão quando caraterizadas as hipóteses previstas no art. 132 da Lei n.º 8.112/1990." (<a href="https://scon.stj.jus.br/SCON/SearchBRS?b=SUMU&amp;livre=@NUM=650">DJe 27/09/2021</a>).
A princípio, o mandamento constitucional estabelece à União, aos Estados, Distrito Federal e aos Municípios instituir, no âmbito de sua competência, por meio da legislação infraconstitucional, o respectivo Regime Jurídico Único (RJU) dos servidores integrantes dos quadros das pessoas jurídicas de direito público, conforme redação do <a href="https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm#:~:text=A%20Uni%C3%A3o%2C%20os%20Estados%2C%20o%20Distrito%20Federal%20e%20os%20Munic%C3%ADpios%20instituir%C3%A3o%2C%20no%20%C3%A2mbito%20de%20sua%20compet%C3%AAncia%2C%20regime%20jur%C3%ADdico%20%C3%BAnico">art. 39 da Constituição Federal</a>:
Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão, no âmbito de sua competência, regime jurídico único e planos de carreira para os servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas. (Vide <a href="http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=11299">ADIN nº 2.135/STF</a>).
Nesse sentido, visando efetivar a ordem constitucional, a Lei Federal n.º <a href="http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8112cons.htm">8.112/1990</a>, de 11 de dezembro de 1990, também conhecida como Estatuto do Servidor Público Federal, regulamentou o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais, disciplinando temas essenciais da relação funcional existente entre a Administração Pública Federal e seus respectivos Servidores Públicos, como: os direitos, os deveres e as responsabilidades particulares aos servidores que executam atividades típicas de estado.
Em decorrência do pacto federativo, cada ente detém competência para regular o vínculo jurídico administrativo existente entre o Poder Público e seus servidores. Contudo, em casos de omissão ou ausência da previsão normativo no diploma estadual ou municipal, poderá ser aplicado “de modo supletivo o Estatuto dos Servidores Públicos Federais, desde que haja compatibilidade normativa” (AIRMS 54617, DJe 12/03/2018).
Ao se tratar da atividade punitiva no âmbito do Direito Administrativo Disciplinar, verifica-se que as sanções disciplinares não se aplicam de forma “discricionária nem automática, senão vinculadas às regras e princípios que norteiam o  Direito Administrativo Sancionador brasileiro” (MS 13791/DF, DJ 25/04/2011).
Com efeito, a Lei Federal n.º 8.112/1990, ao tratar do regime disciplinar e do processo administrativo de servidores públicos da Administração Pública Federal, disciplinou em seus Títulos IV (do Regime Disciplinar) e V (do processo administrativo disciplinar) uma série de penalidades para cada infração disciplinar, sem conceder à autoridade julgadora discricionariedade para decidir de forma diversa das hipóteses previstas no texto normativo.
Em decorrência da natureza vinculada das espécies de penalidades disciplinares aplicáveis, tem-se que a hipótese de demissão do servidor público ocorre pela inobservância aos preceitos legais, que geram repercussão negativa ao Serviço Público. Nesse sentido, constata-se que o art. 132 da Lei n.º 8.112/90 prevê condutas que resultam na efetiva demissão do servidor público, vejamos:
Art. 132.  A demissão será aplicada nos seguintes casos:
I - crime contra a administração pública;
II - abandono de cargo;
III - inassiduidade habitual;
IV - improbidade administrativa;
V - incontinência pública e conduta escandalosa, na repartição;
VI - insubordinação grave em serviço;
VII - ofensa física, em serviço, a servidor ou a particular, salvo em legítima defesa própria ou de outrem;
VIII - aplicação irregular de dinheiros públicos;
IX - revelação de segredo do qual se apropriou em razão do cargo;
X - lesão aos cofres públicos e dilapidação do patrimônio nacional;
XI - corrupção;
XII - acumulação ilegal de cargos, empregos ou funções públicas;
XIII - transgressão dos incisos IX a XVI do art. 117.
À vista disso, devidamente caracterizada conduta desviante praticada pelo servidor que se enquadra na hipótese legal de demissão, a imposição desta sanção representa ato vinculado, dado que o comando do art. 132 da Lei n.º 8.112/1990 se apresenta como norma vinculante, ocasião em que “não será possível ao administrador deixar de aplicá-la ou fazer incidir sanção mais branda amparando-se em juízos de proporcionalidade e de razoabilidade” (MS 21.197/RJ, DJe 10.2.2016). Confira-se os precedentes originários da Súmula 650/STJ:
"DEMISSÃO. ANALISTA-TRIBUTÁRIO DA RECEITA FEDERAL. [...] Caracterizada a prática de improbidade administrativa, não há discricionariedade para aplicação de penalidade diversa pela autoridade administrativa, tendo em vista o que dispõe o art. 132, IV, da Lei nº 8112/90. Precedentes da 1ª Seção." (MS 18761 DF, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 12/06/2019, DJe 01/07/2019)
"[...] SERVIDOR PÚBLICO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. MANDADO DE SEGURANÇA. DEMISSÃO. [...] Não obstante os procedimentos administrativos estarem sujeitos a controle judicial amplo quanto à legalidade, uma vez verificado que a conduta praticada pelo servidor se enquadra em hipótese legal de demissão (art. 132 da Lei 8.112/1990), a imposição dessa sanção é ato vinculado, não podendo o administrador ou o Poder Judiciário deixar de aplicá-la ou fazer incidir sanção mais branda amparando-se em juízos de proporcionalidade e de razoabilidade.[...]" (MS 19517 DF, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 24/04/2019, DJe 16/10/2019)
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Ao enunciar a súmula n.º 650, constata-se que o Superior Tribunal de Justiça teve como premissa consolidar o entendimento segundo o qual, verificado que a conduta imputada ao investigado configura hipótese em que a lei impõe a aplicação da pena de demissão, a Administração Pública não pode aplicar pena diversa, pois se trata de natureza vinculativa da sanção, decorrente do princípio da legalidade estrita, não havendo margem para a dosimetria da sanção pelo administrador, eis que “a gravidade atrai a incidência da legalidade e, assim, o ato demissional torna-se vinculado” (MS 17.811/DF).
Embora o entendimento dessa temática já estivesse densamente cristalizado na Jurisprudência do STJ, tem-se que essa interpretação foi de suma importância para a estabilidade jurisprudencial, eis que a aplicação de penalidade de demissão passa a constituir dever indeclinável, em decorrência do caráter de norma imperativa de que se revestem esses dispositivos, sem qualquer margem de discricionariedade por parte da autoridade administrativa, sob pena de “responsabilização criminal e administrativa do superior hierárquico desidioso” (MS 15.437/DF).
Assim sendo, ao apreciar a presente temática, por meio da interpretação normativa, o Superior Tribunal de Justiça fixou que nas hipóteses para as quais a lei prevê a penalidade de demissão, seja pelo cometimento de infrações funcionais, por ação ou omissão praticada no desempenho das atribuições do cargo ou função, ou que tenha relação com essas atribuições, haverá a incidência de responsabilidade civil-administrativa, resultando na efetiva demissão do servidor público, sem qualquer margem de discricionariedade, não sendo  permitido à autoridade administrativa o poder de perdoar, de compor ou de transigir, aplicando algum tipo de pena alternativa ou menos severa.
Do exposto, por meio da aprovação da Súmula n.º 650, garante-se o entendimento jurisprudencial de que o comando do art. 132 da Lei n.º 8.112/1990 se apresenta como norma vinculante para a autoridade administrativa julgadora, não havendo discricionariedade autorizada para aplicação de pena diversa da demissão, em razão da legalidade estrita, consolidando-se assim a segurança jurídica na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que deverá ser de aplicação obrigatória pelos juízes e tribunais, nos termos do art. 927, IV, do Código de Processo Civil.

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JOTA

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