Leonardo Varella Giannetti

Alessandro Mendes Cardoso

A dinâmica do contencioso tributário nos mostra como diversas questões, ainda que decididas pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), não estão completamente resolvidas. E por trás de toda a discussão envolvendo a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e COFINS, questões de cunho processual também sempre cercaram esse tema.
Uma dessas matérias é justamente a forma de o contribuinte concretizar, econômica e financeiramente, a vitória conseguida no Judiciário. Há muitos anos, o STJ firmou entendimento de que “a opção entre a compensação e o recebimento do crédito por precatório ou requisição de pequeno valor cabe ao contribuinte credor pelo indébito tributário, haja vista que constituem, todas as modalidades, formas de execução do julgado colocadas à disposição da parte quando procedente a ação que teve a eficácia de declarar o indébito.”<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a> Essa posição, aliás, está expressa na Súmula 461 do STJ.<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a>
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Por diversos motivos, o autor da demanda possui dificuldade de definir qual a melhor forma de promover, de modo estratégico e eficaz, a execução do julgado. Às vezes, a empresa possui um valor de crédito que ultrapassa, bastante, o prognóstico de débitos vincendos, de modo que a perspectiva é que a empresa utilize tal crédito por anos a fio.
Às vezes mudanças no regime tributário do setor afetam a dinâmica de uso do crédito. Outras situações decorrem das incertezas não solucionadas a tempo e modo pelo Judiciário e/ou por posturas ou interpretações conferidas pela Procuradoria da Fazenda Nacional, de modo que a empresa possa optar por querer segregar parte do seu crédito para ser usado em compensação e outra parte ser objeto de cumprimento de sentença judicial, com o intuito de receber, em espécie (precatório), parte desse crédito cujo direito foi reconhecido judicialmente.
<blockquote class="jota-article__eye">O contribuinte, em razão do trânsito em julgado que lhe reconheça o direito de recuperar valores de indébito tributário deve avaliar, em face da sua realidade específica, qual a melhor forma de operacionalizar esse direito, tendo em vista a alternativas da compensação administrativa ou do recebimento pela via do precatório.</blockquote>
Por outro lado, tendo em vista a dinâmica da vida empresarial, o contexto que levou a definição por determinada forma de recebimento pode posteriormente se apresentar inviável, seja por ato da administração ou por mudança da realidade do contribuinte.
Nesse cenário, surge relevante o enfrentamento de uma questão que vem se apresentando para diversas empresas: a contribuinte, ao optar pela compensação, pode, posteriormente, desistir e propor o cumprimento de sentença? Ou, ainda, caso a compensação não seja aceita, a empresa poderá propor o cumprimento de sentença (desde que observado o prazo prescricional) ou terá de insistir na pretensão de compensação?
Essa é uma questão importante, especialmente em face dos desdobramentos do reconhecimento do direito dos contribuintes de excluírem o ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS.
Nesse contexto, é pertinente o destaque de acertada decisão proferida pelo Ministro Mauro Campbell, não impugnada pela União, reconhecendo que não se opera a preclusão nessa hipótese (REsp 1.778.234, julgado em 1º de agosto de 2019). No caso, tratava-se de contribuinte que havia sido vitorioso em ação ordinária e, após o trânsito em julgado, optou pela compensação do indébito.
No curso da demanda, o Juiz Federal de 1º grau recebeu “o pedido de compensação como pedido de desistência parcial da execução em relação ao crédito principal, homologando tal pedido.” Contudo, o requerimento de compensação não foi homologado por questões administrativas<a href="#_ftn3" name="_ftnref3">[3]</a>, o que levou a empresa a requerer o recebimento do referido crédito pela via judicial, por meio de precatório.
A pretensão da empresa foi indeferida pelo Juiz de 1º grau, decisão mantida pela 1ª Turma do TRF da 3ª Região sob o argumento de preclusão<a href="#_ftn4" name="_ftnref4">[4]</a>. Aquela Corte entendeu que “mantida integralmente a decisão que homologou a opção pela compensação do crédito tributário, com a consequente desistência da execução do crédito principal via judicial, restou preclusa a opção pela repetição do indébito, sendo inviável a execução requerida pela parte agravante.”
Acertadamente, tal decisão foi reformada pela Segunda Turma do STJ tendo em vista o decidido no REsp 1.114.404/MG e na Súmula 461, para “reconhecer a possibilidade de a parte credora – a despeito ter optado inicialmente, na fase de execução do julgado, pela compensação do indébito tributário –, pleitear o recebimento do crédito por precatório ou requisição de pequeno valor, porquanto faculdade sua, afastando-se, assim, a preclusão.”
Essa decisão do STJ é muito relevante<a href="#_ftn5" name="_ftnref5">[5]</a>, pois o contribuinte não pode ser prejudicado nem ser inviabilizada sua pretensão de executar o julgado da forma que lhe for mais conveniente. Seu direito não pode ser recusado caso opte, inicialmente, por um meio de executar o julgado e, depois, resolva alterar e utilizar outra via que lhe é mais eficiente ou economicamente mais interessante. Esse direito se torna ainda mais evidente se o cenário a respeito do valor do crédito for totalmente indefinido e conflituoso, como vimos ocorrer nos últimos quatro anos em razão da disputa entre qual o ICMS deveria ser excluído: o “ICMS” recolhido” ou “ICMS destacado”.
O importante é que o direito reconhecido judicialmente seja concretizado, de modo que obstáculos processuais não podem ser utilizados pela Fazenda Pública com o intuito de dificultar a satisfação da pretensão do credor. Afinal, o juiz deve assegurar a efetiva tutela jurisdicional e a pacificação dos conflitos, de modo que o processo não seja um fim em si mesmo.<a href="#_ftn6" name="_ftnref6">[6]</a>
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<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> STJ, REsp 1.114.404/MG, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/02/2010, DJe 01/03/2010.
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> O contribuinte pode optar por receber, por meio de precatório ou por compensação, o indébito tributário certificado por sentença declaratória transitada em julgado.
<a href="#_ftnref3" name="_ftn3">[3]</a> Segundo consta na decisão, não houve análise do crédito da empresa pela Receita Federal do Brasil. O indeferimento se deu por questões formais do procedimento.
<a href="#_ftnref4" name="_ftn4">[4]</a> Agravo de Instrumento Nº 0000119-14.2015.4.03.0000/SP, rel. Desembargador Federal Valdeci dos Santos, j. 06 de junho de 2017.
<a href="#_ftnref5" name="_ftn5">[5]</a> Vide também decisão em sentido similar proferida pela 1ª Turma do TRF 4ª Região no Agravo Interno em Agravo de Instrumento nº 5014946-10.2018.4.04.0000/SC, rel. Juiz Federal Alexandre Rossato da Silva Ávila, j. 19/06/2019.
<a href="#_ftnref6" name="_ftn6">[6]</a>  Art. 4º, CPC: As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa. Art. 8º, CPC. Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência.

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JOTA

Contribuinte, ao optar pela compensação, pode, posteriormente, desistir e propor o cumprimento de sentença?

A Súmula 461 do STJ e seus desdobramentos na dinâmica processual tributária

O autor da demanda possui dificuldade de definir qual a melhor forma de promover, de modo estratégico e eficaz, a execução do julgado