Levi Custódio Santos

O recente anúncio da saída de Wilson Ferreira Jr. do cargo de Diretor Presidente da Eletrobrás deve se efetivar no mês de março. Apesar das alegadas razões pessoais, a saída pode também estar ligada às dificuldades do governo federal de implementar sua agenda de privatizações. A saída pode precipitar essa discussão nas estatais.
A situação aponta os holofotes para a independência da administração estatais e a sucessão dos principais executivos das estatais federais sob o governo Bolsonaro. No primeiro ano do atual governo, as saídas conturbadas de Joaquim Levy do BNDES e Juarez Aparecido de Paula Cunha dos Correios lançaram as primeiras dúvidas sobre ingerências do governo federal na gestão das companhias estatais. Mais recentemente, também acendeu o sinal de alerta sobre a questão, a controvérsia sobre a demissão do presidente do Banco do Brasil. A demissão teria sido cogitada depois que o banco estatal anunciou seu plano de fechamento de agências e demissão voluntária.
<a href="https://conteudo.jota.info/poder-contato"><img class="size-medium wp-image-292717 aligncenter" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/01/jota-pro-poder.jpg" alt="" width="688" height="688" /></a> 
As preocupações sobre assunto se dão pelo fato de que a sucessão de CEOs e executivos-chave tem especial importância nas companhias, sejam estatais ou não. Como destaca o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), sucessões feitas de forma não planejada destroem valor nas organizações e podem afetar sua credibilidade perante o mercado e stakeholders. Por isso, a sucessão do principal executivo de uma organização deve ser realizada de forma planejada e de acordo com o perfil e estratégias de negócio de cada instituição, de forma a assegurar sua sustentabilidade e longevidade [1].
<blockquote class="jota-article__eye">No entanto, no caso da Eletrobrás, há a apreensão que o sucessor de Wilson Jr. seja pessoa ligada a grupos de apoio de Bolsonaro no Congresso Nacional, em detrimento de uma indicação técnica.</blockquote>
Por isso, as especulações sobre quem Bolsonaro indicaria como próximo presidente levaram o Conselho de Administração da estatal a publicar nota reafirmando que, na verdade, competência na indicação de seu novo CEO é do Conselho e não do Presidente da República. Além disso, o Conselho anunciou a contratação de consultoria de recrutamento e seleção de executivos para apoiar o processo de sucessão.
A posição externada pelo Conselho da Eletrobrás tem como fundamento as atribuições legais previstas no artigo 142, inciso II da Lei 6.404/76 (Lei das S/A) e no artigo 18 da Lei 13.303/16, bem como no artigo 36, inciso XVI do Estatuto Social e políticas corporativas da companhia.
Além disso, está em linha com as recomendações feitas pela Secretaria de Coordenação e Governança das Empresas Estatais (Sest) no estatuto modelo publicado junho de 2020 que recomenda que o presidente do Conselho de Administração das estatais coordene a elaboração de plano de sucessão não-vinculante aos membros do Conselho e da Diretoria Executiva[2], bem com as recomendações do IBGC e da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
No caso do IBGC, o instituto sublinha que há “amplo consenso de que a responsabilidade pelo processo sucessório do principal executivo (CEO) e das demais posições-chave da organização é do Conselho de Administração, sendo essa uma de suas maiores e mais importantes contribuições”[3]. A OCDE destaca, por sua vez, a “efetiva elaboração de planos de sucessão para executivos-chave” como um papel que o Conselho de Administração de empresas estatais deve desempenhar ativamente[4].
Todavia, apesar do alinhamento do Conselho de Administração da Eletrobrás com as recomendações nacionais e internacionais e as melhores práticas de mercado, a sucessão de seu presidente poderá ser um teste da independência das estatais federais.
Caso o Conselho da Eletrobrás ceda às pressões do governo e realize a indicação de um nome não validado pelos seus comitês internos e pela consultoria externa contratada, será mais um exemplo de ingerências do Governo Federal na gestão de suas empresas controladas, colocando os interesses políticos do momento à frente dos interesses sociais, econômicos e de eficiência que deveriam guiar a gestão das companhias.
Isto não importa em ingenuamente acreditar que a indicação do novo CEO de uma das maiores estatais brasileiras não passará por entendimentos com seu acionista controlador. Mas significa dizer que o Conselho de Administração deve atuar ativa e altivamente, desempenhando papel central e decisivo no processo de sucessão da Eletrobrás.
No entanto, ainda que o Conselho da Eletrobrás permaneça fiel aos seus deveres fiduciários e não ceda às pressões externas, a indicação de um novo presidente não fica livre de riscos de interferência.
A União, na qualidade de acionista controladora da estatal, pode convocar o órgão máximo da administração das companhias brasileiras, a Assembleia Geral de Acionistas, na qual tem a maioria dos votos, para determinar que o Conselho de Administração indique o nome escolhido pelo presidente da república ou escolha dentre uma lista de nomes indicada por ele. Ou, ainda, pode convocar a Assembleia Geral de Acionistas para destituir o atual Conselho de Administração da Eletrobrás e eleger novos membros mais alinhados ao governo, garantindo a nomeação de seu indicado como presidente executivo.
Tais hipóteses, apesar de existirem, são pouco prováveis pelo grande custo reputacional que podem gerar. Entretanto, caso ocorram, os acionistas minoritários da estatal teriam como recurso buscar a anulação de tais deliberações, com base no artigo 115, §4º da Lei das S/A, perante a Comissão de Valores Mobiliários, bem como a responsabilização da União por abuso de poder de controle caso haja evidências de que o CEO eleito por tais meio é inapto, moral ou tecnicamente.
Por isso, a reflexão sobre novos mecanismos de garantia da independência da sucessão dos principais executivos das estatais se torna indispensável para que elas se mantenham firmes na consecução de seus interesses sociais, que abarca inclusive o interesse público que motivou sua criação, e não dos interesses políticos momentâneos.
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O episódio 48 do podcast Sem Precedentes faz uma análise sobre a atuação do Supremo Tribunal Federal (STF) em 2020 e mostra o que esperar em 2021. Ouça:
https://youtu.be/-hMj5lwWXEE
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[1] Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC). Guia de Orientação para Planejamento de Sucessão, Avaliação e Remuneração de Conselho de Administração e Diretor-Presidente. São Paulo: IBGC, 2011. Páginas 9 e 10.
[2] O estatuto-modelo elaborado pela Sest pode ser acessado em &lt;<a href="https://www.gov.br/economia/pt-br/assuntos/noticias/2020/junho/economia-divulga-novo-estatuto-modelo-de-governanca-das-estatais">https://www.gov.br/economia/pt-br/assuntos/noticias/2020/junho/economia-divulga-novo-estatuto-modelo-de-governanca-das-estatais</a>&gt;.
[3] IBGC, Ibidem, p. 12.
[4] OCDE. Recommendation of the Council on Guidelines on Corporate Governance of State-Owned Enterprises. 2015. Página 32.

desestatização da Eletrobras

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JOTA

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