Francisco Defanti

Mateus Dias

A decisão da <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/aneel">Aneel</a> por encerrar, sem resolução de mérito, o processo em que se discutia a normatização do <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/compartilhamento-de-postes">compartilhamento de postes</a> entre os setores de energia elétrica e telecomunicações deu mais um capítulo a uma longa novela. 
Outro recente capítulo foi inaugurado com o Decreto Federal 12.068, de 20 de junho de 2024, cujo art. 16 prevê a obrigação de compartilhamento dessa infraestrutura, a título oneroso e orientado a custos (§ 1º). Tal ato normativo foi editado em linha com a Portaria Interministerial MCOM/MME 10.563/2023, que, ao instituir a Política Nacional de Compartilhamento de Postes, autorizou a cobrança, em favor das empresas de energia elétrica, pela ocupação de seus postes e demais estruturas.
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A discussão não é nova. A Resolução Conjunta 1/1999, editada pela Aneel, pela Anatel e pela ANP, já dispunha que o “agente que explora serviços públicos de energia elétrica, serviços de telecomunicações de interesse coletivo ou serviços de transporte dutoviário de petróleo, seus derivados e gás natural, tem direito a compartilhar infra-estrutura de outro agente de qualquer destes setores, de forma não discriminatória e a preços e condições justos e razoáveis, na forma deste Regulamento” (art. 4º; grifou-se).
O compartilhamento de infraestrutura é natural e fundamental nas atividades de interesse público. Os bens são finitos e podem ser destinados a mais de uma utilidade pública. Logo, compartilhar pode ser essencial para a prestação dos vários serviços.
Só que as distribuidoras de energia elétrica parecem não compactuar com essa lógica. Se, de um lado, não querem renunciar à gestão do compartilhamento dos postes (sempre de forma onerosa), de outro, não abrem mão da gratuidade na instalação desses mesmos postes.
Existe acesa disputa no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a cobrança pelo uso da faixa de domínio de rodovias administradas por concessionárias privadas, em face de distribuidoras de energia elétrica. As últimas, com base em Decreto de 1980, que regulamentou o Código de Águas de 1934, sustentam ter direito à utilização gratuita desses bens afetos às concessões de rodovias.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem entendimento consolidado no sentido de que o referido Decreto não prevalece sobre a Lei de Concessões, cujo art. 11 permite o auferimento de receitas acessórias. No caso das concessões de rodovia, a cobrança pela faixa de domínio (verba relevante dentro da equação financeira desses contratos) é inegável espécie desse gênero.
A exploração de receitas acessórias é prática rotineira em contratos de concessão de serviços públicos e fundamental para sua viabilidade econômica. A razão para tanto decorre de um dilema inerente a tais contratos: se, de um lado, a principal fonte de receita das concessões decorre, em regra, das tarifas cobradas diretamente dos usuários; de outro, as tarifas precisam atender ao comando da modicidade (art. 6º, § 1º da Lei 8.987/1995), de modo a promover o acesso dos cidadãos ao serviço público prestado. Nas palavras do professor Carlos Ari Sundfeld, “quanto maior for a arrecadação alternativa, menor poderá ser a tarifa cobrada dos usuários”[1]. Daí sua importância para o acesso ao serviço público.
O STF, entretanto, tem estendido a ratio de julgamentos que envolvem cobranças pelo Poder Público em face das empresas elétricas para obstar a cobrança, entre particulares, pela instalação de postes na faixa de domínio. O leading case da matéria são os Embargos de Divergência no RE 889.095, em que o relator, ministro André Mendonça, votou pela gratuidade; e o ministro Luís Roberto Barroso divergiu para manter a interpretação do STJ, dado que o conflito é entre normas infraconstitucionais. O ministro Gilmar Mendes pediu destaque e o caso aguarda inclusão em pauta para julgamento presencial no plenário.
O objeto deste artigo não é mostrar as razões pelas quais esse salto interpretativo não procede, mas apenas evidenciar a incongruência que dele decorre, com o potencial de minar toda a discussão sobre o compartilhamento de infraestrutura entre serviços essenciais.
A essencialidade dos serviços nunca foi motivo para obstar a cobrança entre particulares – e nem a Constituição hierarquiza serviços públicos. O argumento da essencialidade justifica tornar obrigatório o compartilhamento, mas não gratuito. Afinal, existe benefício mútuo para ambas as concessionárias: as distribuidoras de energia elétrica se beneficiam da utilização de área segura e mantida por outra concessionária, em lugar de terem que negociar com cada proprietário de terra a passagem de sua fiação ou instituir servidões administrativas, cujo preço seria fixado em Juízo. A lógica, em rigor, é a mesma aplicada ao compartilhamento entre distribuidoras de energia elétrica e operadoras de telecomunicações.
Embora existam atos recentes que reafirmem o caráter oneroso do compartilhamento dos postes, as distribuidoras de energia elétrica insistem em que sua instalação na infraestrutura de outra concessionária de serviço público seria gratuita. O risco que essa contradição representa para a lógica de compartilhamento de infraestrutura como um todo deve ser levado a sério. Não parece haver sentido em se tratar situações similares de forma distinta.
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Os subscritores deste artigo são advogados das concessionárias de rodovia no âmbito do RE 889.095 e de outros casos em curso no STF sobre o tema.
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[1] SUNDFELD, Carlos Ari. “O Compartilhamento de Infra-Estrutura entre Prestadoras de Serviço Público”. Fórum Administrativo – FA, Belo Horizonte, ano 1, n. 8, out. 2001, versão digital, p. 5.

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JOTA

O compartilhamento de infraestrutura é natural e fundamental nas atividades de interesse público

STF e gratuidade no compartilhamento de postes

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