Daniel Gomide

Novas tecnologias estão surgindo em um ritmo cada vez mais rápido e com impacto imediato na execução de diversas atividades empresariais, independentemente de setor ou indústria, afetando, principalmente, as rotinas das chamadas áreas de suporte, ou back-office do negócio.
Na área jurídica, as soluções de tecnologia vão desde sistemas integrados que permitem a análise inteligente de dados cruzados da empresa, de seus clientes e de fornecedores (Big Data &amp; analysis) a plataformas de serviços oferecidos pelas Lawtechs, ou Legaltechs, as quais se somam a outras ferramentas de TI que já vem sendo utilizadas, pelos advogados das organizações empresariais, na identificação e atuação preventiva sobre potenciais contingências, na gestão e controle de processos administrativos e judiciais, na contratação de serviços de escritórios de advocacia através de pregões virtuais, no monitoramento das obrigações trabalhistas e previdenciárias de terceiros, na análise de contratos de baixa complexidade, assim como na secretaria de assembleias e reuniões de órgãos societários.
O surgimento de novas soluções tecnológicas aplicáveis à área jurídica tende a se intensificar com a regulação do equity-crowdfunding pela CVM, através da Instrução nº 588 de 13.07.2017 (tema da nossa CMT News em julho/17), o que deve reduzir os custos de transação para o financiamento de startups.
Há quem apregoe que toda essa evolução tecnológica levará à substituição do advogado pela inteligência artificial. Embora esse pensamento pareça moderno, discordamos dele, pois revela uma visão antiquada do papel do jurídico empresarial, ao reduzir o advogado a um burocrata reativo, seguidor de processos e rotinas, o que não condiz mais com o perfil atual desse profissional, na maioria das organizações.
Por vezes, aqueles que celebram as vantagens da inteligência artificial, pensam somente na redução de custos operacionais, subestimando a interação humana como elemento de criação de valor para o negócio. Assim, ao deixar o piloto automático conduzir o avião, o gestor da empresa corre o risco de se acomodar, perdendo insights importantes que uma equipe jurídica integrada ao negócio pode trazer.
De fato, há nas empresas, e em alguns escritórios de advocacia, uma parcela cada vez mais significativa de advogados com formação multidisciplinar, que conhecem o negócio e participam ativamente do processo decisório das organizações, combinando conhecimento jurídico e de administração, o que contribui com as demais áreas para a definição da melhor estratégia e o uso eficiente dos recursos limitados. O novo advogado deixou, assim, de ser um mero consultor de normas e procedimentos, para assumir um papel ativo de gestor de conhecimentos.
Nesse contexto de inovação, incumbe a esse gestor orientar a liderança da organização em relação à implantação de soluções tecnológicas adequadas ao ambiente de negócios, dentre as várias opções que estão disponíveis no mercado, empregando, sempre que possível, técnicas de administração de empresas, tais como a gestão baseada em evidências e a gestão de projetos.
A gestão baseada em evidências é uma técnica de administração, originária da Medicina, que apregoa que as decisões do gestor devem resultar da combinação do pensamento crítico e da melhor evidência disponível na organização e no mercado, considerando, como evidência, informações, fatos e dados obtidos através de um processo de investigação e questionamento, que suportem ou contestem uma determinada hipótese ou afirmação.
Assim, por exemplo, a tomada de decisão na organização sobre a substituição de um recurso da equipe jurídica por uma solução oferecida por uma plataforma virtual de análise de contratos, assim vendida como meio mais ágil e eficiente de atender a demanda interna das áreas de negócios, merece ser precedida de uma investigação de fatos e dados, obtidos no ambiente interno, sobre as áreas da organização que têm interface com o jurídico, assim como de uma autoavaliação sobre a gestão e o treinamento das pessoas que atuam nesses processos, a fim de identificar possíveis falhas que não serão eliminadas simplesmente com a adoção de uma nova tecnologia.
Também é prudente que se questione outros aspectos do ambiente externo, como a qualidade da entrega e a eficácia da segurança da informação garantidas pela ferramenta de TI, dados que podem ser obtidos através de entrevistas com gestores de outras empresas que já utilizam a solução proposta, e podem falar sobre a experiência que a tecnologia efetivamente proporciona.
Uma vez decidida a implantação da solução tecnológica, a metodologia de gestão de projetos é uma outra técnica administrativa fundamental para o advogado da organização, cabendo-lhe mapear previamente as pessoas e os processos da área que serão afetados pela nova tecnologia, avaliar quais ajustes devem ser feitos, elaborar um cronograma de implantação, negociar um acordo de nível de serviços com o fornecedor e preparar um plano de contingência para evitar que falhas ou interrupções da tecnologia comprometam a continuidade dos negócios da empresa.
Em resumo, a solução tecnológica não substitui o papel do advogado como gestor do conhecimento, que interage estrategicamente com as áreas de negócio da organização, nem elimina a diligência ao se escolher tecnologias ainda não suficientemente testadas pelo mercado, que podem se revelar inadequadas ao ecossistema da organização.
Vale ressaltar que a escolha da tecnologia é apenas um dos elementos que formam a base de uma boa gestão, pois, para funcionar de forma eficiente, a organização também depende de pessoas capacitadas e de processos estruturados.
É recomendável, assim, que o gestor jurídico avalie criticamente o benefício real e empregue técnicas de administração de negócios, ao considerar a implantação de uma solução tecnológica jurídica, evitando que a decisão seja baseada apenas em estórias de sucesso de outras organizações.

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JOTA

Tecnologia não substitui o papel do advogado como gestor do conhecimento

Soluções de tecnologia e gestão baseada em evidências

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