Charles Lenzi

Neste último mês, as Pequenas Centrais Hidrelétricas foram postas em evidência em função de duas leis, uma estadual (Mato Grosso) e outra municipal (Cuiabá), que visavam proibir a construção de PCHs ao longo do rio Cuiabá. Essas ações motivaram a Associação Brasileira de Geração de Energia Limpa (Abragel) a recorrer à Justiça para explicitar que é competência privativa da União legislar sobre energia elétrica. 
Em ambos os casos e por maioria de votos (8 a 2), o Supremo Tribunal Federal (STF) acatou os pedidos da Abragel declarando a inconstitucionalidade das leis, deixando claro que estes dispositivos ferem a Constituição Federal de 1988. Estes entendimentos do STF não são novidades, porque em outras situações já havia o entendimento de que estados e municípios que editam leis atinentes à energia elétrica e águas invadem a competência privativa da União. Mas até os recentes julgamentos, que ocorreram em maio, não havia deliberação específica sobre a inconstitucionalidade de eventual lei estadual ou municipal que expressamente proibisse empreendimentos hidrelétricas sob pretexto da competência concorrente para proteção ao meio ambiente. 
Com o propósito de trazer maiores esclarecimentos à sociedade brasileira cabe destacar que um dos principais motivos é a própria característica do setor elétrico brasileiro. No Brasil, o Sistema Interligado Nacional (SIN), como o próprio nome indica, "é responsável pela interconexão dos sistemas elétricos, através da malha de transmissão, propiciando a transferência de energia entre os subsistemas, permitindo a obtenção de ganhos sinérgicos e explorando a diversidade dos regimes hidrológicos das bacias”, de acordo com o Operador Nacional Elétrico (ONS). Isto deixa claro que a geração de energia elétrica produzida em Mato Grosso, por exemplo, pode abastecer a população do Nordeste devido ao fato de que o sistema é interconectado. Esta lógica está intrinsecamente ligada ao pacto federativo selado em nossa Constituição Federal. 
Além da inconstitucionalidade apontada, é fundamental esclarecer, com base em elementos técnicos, que ocorreram distorções quanto ao uso desta fonte de energia, que é utilizada mundo afora e vista como uma das melhores alternativas para a importante transição energética.
A própria Agência Nacional de Energia Elétrica (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/aneel">Aneel</a>) diz que as “fontes hídricas são essenciais para garantir o suprimento de energia firme e a confiabilidade do sistema elétrico brasileiro, sendo um importante diferencial do nosso país. Trata-se de um potencial energético renovável, cujo custo marginal de produção é nulo. Em realidade, no contexto brasileiro, a geração hidrelétrica é a fonte de energia que, no âmbito da operação em tempo real, modula o balanço energético do sistema em face das incertezas que invariavelmente permanecem entre o processo de programação e a operação em tempo real (desvios de carga, de afluências hidrológicas, de geração eólica e solar, de disponibilidade de equipamentos), provendo-lhe os principais serviços de confiabilidade”. 
Em outras palavras, o Brasil, graças ao seu potencial hidrelétrico, tem uma das matrizes energéticas mais limpas do mundo. Essa característica de capacidade de armazenamento que faz o papel de "baterias naturais" do sistema elétrico propicia a expansão das demais fontes renováveis que são intermitentes. A outra alternativa para compensar a intermitência das outras renováveis seria o uso das usinas térmicas, muito mais poluentes. 
Para o equilíbrio econômico, social e ambiental é importante ter a segurança energética do país e também a segurança jurídica, afinal, é um setor que atrai investimentos de empresas nacionais e internacionais, principalmente neste momento em que o mundo está voltado à transição energética. E o Brasil pode assumir este protagonismo de forma positiva e responsável.

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JOTA

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