Felipe Recondo

O resultado – “<a href="https://www.jota.info/justica/rena-fica-decide-stf-07122016">Renan fica, decide Supremo</a>”- revelou força política do presidente do Senado, Renan Calheiros,  ou demonstrou as fragilidades institucionais do STF? Um coisa, claro, pode não excluir a outra. Mas qual fator preponderou? A resposta não é simples e demanda uma digressão.
Voltemos ao dia 3 de novembro, quando o tribunal iniciou o julgamento da ADPF 402, movida pela Rede, que pedia ao Supremo que julgasse inconstitucional a possibilidade de réus ocuparem cargos que estivessem na linha sucessória da Presidência da República. Se não fosse esse o entendimento do Supremo, a Rede pedia que ao menos a Corte impedisse réus de substituírem o presidente Michel Temer quando este estivesse em viagem ao exterior.
O relator do processo, ministro Marco Aurélio Mello, concluiu seu voto de forma clara: "Ante o alcance do texto constitucional, julgo procedente o pedido formalizado na inicial desta arguição de descumprimento de preceito fundamental para assentar o entendimento segundo o qual aqueles que figurem como réus em processo-crime no Supremo não podem ocupar cargo cujas atribuições constitucionais incluam a substituição do Presidente da República."
Na íntegra, o voto foi acompanhado sem aprofundados debates pelos ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Teori Zavascki e Luiz Fux. Em seguida, o ministro Dias Toffoli pediu vista. O ministro Celso de Mello, decano da Corte, antecipou seu voto. O Supremo naquele momento queria dar uma resposta a Renan Calheiros, presidente do Senado que havia chamado de “juizeco” o magistrado que autorizou a Polícia Federal a fazer busca e apreensão no Senado.
Com o voto de Celso de Mello, acompanhando naquela ocasião os argumentos do ministro Marco Aurélio, formou-se a maioria.  Como se julgasse uma questão simplória e sem maiores consequências, o Supremo gastou 45 minutos com esta questão constitucional de efeitos graves. O processo julgado em seguida, em que se discutiu a inclusão as certidões de dívida ativa no rol dos títulos sujeitos a protesto, arrastou-se por duas sessões em 2 horas e 17 minutos de intensas discussões.
Esta maioria apressada deu ao ministro Marco Aurélio o argumento numérico: a maioria em favor do entendimento de que réus em ações penais no Supremo não poderiam ocupar os cargos que figuram na linha de sucessão da Presidência da República (presidências da Câmara e do Senado).
Mesmo com o julgamento suspenso pelo pedido de vista do ministro Dias Toffoli, a Rede pediu para que o ministro Marco Aurélio, monocraticamente, afastasse por meio de liminar o presidente de outro Poder sob o argumento de que já havia maioria no STF em favor desta tese. O pedido foi atendido, e a crise se instalou.
Renan Calheiros resistiu e negou-se a receber a notificação da decisão. A Mesa do Senado avisou que só cumpriria a liminar se referendada pelo plenário. Ministros do Supremo atuaram no campo da política para buscar soluções. A presidente Cármen Lúcia hospedou em seu gabinete uma reunião incomum entre integrantes do tribunal e o vice-presidente do Senado, Jorge Viana, para discutir o caso. O ministro Gilmar Mendes sugeriu o impeachment de Marco Aurélio.
Disso tudo saiu-se, já na segunda-feira, com a percepção de que os ministros não avalizariam a liminar pelo afastamento de Renan. As articulações internas, comandadas pela ministra Cármen Lúcia, fecharam a terça com uma alternativa a ser levada ao pleno.
Iniciada a sessão de quarta-feira, Marco Aurélio foi enfático, cobrando responsabilidade dos colegas, criticando uma suposta blindagem ao presidente do Senado e misturando os distintos casos de Eduardo Cunha e de Renan Calheiros.
Logo, aquela maioria do julgamento da ADPF 402 de novembro desmontava-se. Revelava-se apressada e artificial. O ministro Celso de Mello, a quem competiu levar para plenário a saída para a crise, retificou seu voto. Mantinha o entendimento de que réus não podem assumir a Presidência da República, mas poderiam ocupar cargos na linha sucessória.
Em seguida, o ministro Luiz Fux chegou à mesma conclusão. E assim, um julgamento que se desenhava acachapante (da ADPF 402) mudou sensivelmente. Se havia maioria, era apenas para que réus não assumissem a Presidência da República quando Michel Temer viajasse para o exterior. Ninguém precisaria sair do cargo que ocupa.
Com esse novo entendimento, o resultado do julgamento dessa quarta-feira não poderia ser diferente. Afinal, a premissa de que havia maioria segura pelo entendimento de que réus não podem ocupar as Presidências da Câmara e do Senado já não se sustentava.
Voltamos então à pergunta inicial: o que vem antes, a força política de Renan ou a falha institucional do Supremo? Renan Calheiros virou réu neste mesmo STF há algumas semanas por uma denúncia que os ministros, em sua maioria, admitiram ser fraca. Não teve força para segurá-la. Mas foi também o mesmo tribunal que deu um passo em falso ao tentar julgar de forma açodada a ADPF 402 e que agora, pela liminar de um de seus integrantes, avançou indevidamente (ao menos é o que indica o placar de 6 a 3 contra decisão do ministro Marco Aurélio).
Noves fora: Renan pode legitimamente dizer que ganhou; o Supremo, de fato, desgastou-se e precisará repensar procedimentos, como a cada vez mais evidente monocratização de suas decisões. Apesar de tudo isso, mantém intacto seu poder, mesmo que, na opinião pública, aprofunda-se a percepção de que a Justiça não é tão cega assim.
Antes do ponto final, é preciso lembrar um fato. Diante de todo este quadro, o que dizer agora do pedido de vista do ministro Dias Toffoli no julgamento de novembro e que impediu o Supremo de concluir o julgamento da ADPF 402? Alguns, incluindo ministros do Supremo, interpretaram a interrupção como tentativa de proteger Renan Calheiros. Outros – poucos, admita-se – viram o pedido como legítima forma de pausar o processo decisório em razão de dúvidas ponderáveis sobre as consequências do caso ou como sobre a adequação do julgamento ao momento político.
Lendo-se a íntegra de seu voto na sessão de quarta, percebe-se que vários pontos controversos foram ignorados pelo Supremo ao longo da discussão. Quando aberta ação penal contra o presidente, ele fica afastado por no máximo 180 dias do mandato. Se não for condenado neste prazo, volta ao cargo. Valeria o mesmo para Renan? O presidente da República só pode ser processado por crimes cometido no exercício de suas atribuições? Valeria o mesmo para Renan?
Interpretando-se como quiser e olhando-se agora pelo retrovisor, seria razoável dizer que o pedido de vista de Toffoli pouparia o Supremo dos prejuízos que sofreu nesta quarta-feira?

Presidência do Senado

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JOTA

Um coisa, claro, pode não excluir a outra. Mas qual fator preponderou? A resposta não é simples

Renan forte, Supremo fraco?

Um coisa, claro, pode não excluir a outra. Mas qual fator preponderou? A resposta não é simples